Semana Internacional do Jerez (ou O Que é Jerez?)

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Qual o ponto em comum entre The Dalmore, a linha 1824 da The Macallan, Whyte and Mackay, a maioria dos Glenfarclas, o Glenmorangie Lasanta e uma região da Espanha conhecida como Andalucia?É que todos estes whiskies passam parte de sua maturação – ou toda – em barricas que antes continham vinho jerez. E este vinho é, justamente, produzido em Andalucia.

Aliás, talvez você já tenha se perguntado o que afinal é vinho jerez, ao ler este blog. Porque eu falo tanto sobre barricas de ex-jerez e nunca parei para explicar o que é, realmente, essa bebida. Bem, talvez essa seja a oportunidade perfeita para isso.

É que começou essa semana o Sherry Wine Week, por aqui conhecida também como a Semana Internacional do Jerez. O objetivo é mostrar – em eventos públicos em bares, restaurantes, hotéis  – a versatilidade deste vinho, tanto para coquetelaria quanto na harmonização com pratos.

E o Cão teve a sorte de ser convidado, justamente, para um workshop de coquetelaria com o ilustre bartender Laércio Zulu, que apresentou drinks que poderiam ser feitos com o vinho fortificado. Mais especificamente, o jerez fino Tio Pepe, produzido pela Gonzalez Byass – a mesma que fornece barricas para a destilaria The Dalmore. A degustação foi apresentada por Antonio Palacios, embaixador da vinícola.

Aurora Tio Pepe
Antonio Palacios e uma garrafa de Tio Pepe bem vestida.

VOCÊ DISSE COQUETÉIS?

Sim. Incrivelmente, o Tio Pepe funciona muito bem para coquetéis. Inclusive, coquetéis com whiskey. A prova disso foram os drinks produzidos por Laércio Zulu, e provados pelos convidados no recém-aberto Boteco São Conrado, na Vila Madalena. Cada um com uma proposta diferente, mas todos com jerez em evidência.

Foram feitos quatro coquetéis, todos eles com o jerez Tio Pepe como vedete. Um, chamado Penélope, com o vinho fortificado, vodka, licor de pitanga, mel e suco de limão. Outro – o God Save the Sherry – com gim, Tio Pepe, açúcar, cerveja e angostura. O terceiro como uma releitura do clássico Daikiri (Daiquipepe) com Kraken Rum, jerez, suco de grapefruit e açúcar. E, por fim, o preferido deste Cão (por motivos óbvios), um sour com bourbon whiskey, jerez, abacaxi, suco de limão e angostura, batizado de Frontera.

Laércio Zulu fazendo mágica
Laércio Zulu fazendo sua mágica

Além deles, Zulu presenteou os convidados com coquetéis improvisados com o jerez da Gonzales Byass, de acordo com o que cada um mais gostava. Meus brindes foram um bloody mary que levava também Glenfiddich 12 anos e uma espécie de boulevardier, com Amaro Lucano e Tio Pepe. Ambos fantásticos. Tudo isso combinado com ótimos tapas da cozinha do São Conrado, um dos mais bonitos bares da Vila Madalena.

E AFINAL, O QUE É JEREZ?

Vamos então ao papo técnico. Jerez é um vinho fortificado, produzido no conhecido triangulo do Jerez, na região de Andalucia, Espanha. O triângulo é formado por Jerez de la Frontera, Sanlúcar de Marrameda e El Puerto de Santa María. Essa região possui solo rico em calcário, e é excelente para o cultivo das uvas utilizadas na produção de jerez: Palomino, Pedro Ximenes e – com bem menos frequência – Moscatel. Um dos maiores produtores de vinho jerez do mundo é a Gonzalez Byass, que possui, entre outros, o jerez Tio Pepe.

Existe uma infinidade de tipos diferentes de jerez. Mas, de uma forma simplificada, podemos dividi-los nos seguintes tipos: Fino, Manzanilla, Amontillado, Palo Cortado, Oloroso, Pedro Ximénez, Moscatel e Dulce. A diferença entre eles – de uma forma porcamente simplista – está no tipo de uva usada, na técnica de fermentação, na maturação, na adição de álcool ou no fato de serem ou não adoçados posteriormente. Para evitar que isto se torne um enfadonho texto de seis páginas, deixarei de descrever cada um deles, e focarei na parte do whisky.

No universo do whisky – afinal, este não é um blog sobre vinho jerez – os tipos mais populares são Pedro Ximénez e Oloroso. Populares porque as barricas previamente utilizadas para armazenar estes vinhos é bastante usada pela indústria do whisky para maturação. Como disse acima, toda a Série 1824 da The Macallan é maturada em barricas de ex-oloroso e PX. O Glenmorangie Lasanta também é finalizado em barris dos dois tipos de sherry, e a maioria dos whiskies da Glenfarclas também. No entanto, há também whiskies com finalizações em outros tipos de jerez, como é o caso do Glenmorangie Dornoch, que usa barricas de ex-amontillado.

Ruby, maturado em barricas de jerez.
Ruby, maturado em barricas de jerez.

O Jerez Oloroso é produzido utilizando um mosto de uvas mais pesado do que outros tipos de Jerez – como o conhecido Fino. O vinho é então fortificado (ou seja, um destilado é adicionado) até atingir graduação alcoólica de aproximadamente dezoito por cento. O vinho resultante, porém, chega a atingir graduação de vinte e quatro por cento, graças à evaporação. Para um whisky-geek, isso é interessantíssimo. É uma espécie de Angel Share que aumenta a concentração de alcool!

Já o Jerez PX, ou Pedro Xímenez, Jimenez ou qualquer outra variação com “s”, “z”, “x” ou “j”, é um vinho de sobremesa, produzido com ao menos oitenta e cinco por cento das uvas homônimas. Este tipo de Jerez é muito mais adocicado do que Oloroso. Como a uva utilizada como matéria prima possui, naturalmente, mais açucares do que aquelas tradicionalmente usadas para Oloroso, pode-se chegar a uma graduação alcoólica alta sem a necessidade de adição de qualquer destilado.

O Tio Pepe, por sua vez, é um fino. Jerez Fino é produzido com a uva Palomino, e é biologicamente maturado sob uma camada de levedura. Essa camada protege o vinho do contato com o ar, e lhe empresta um certo sabor herbal e de amêndoas.

Se você quiser saber mais sobre – e claro, provar – essa bebida tão importante para o mundo do whisky, esta é a sua chance. Para ficar por dentro dos eventos que já foram registrados na página internacional do festival, clique aqui. E fique ligado, em breve divulgaremos a receita do coquetel preferido deste Cão, o Frontera.

 

15 thoughts on “Semana Internacional do Jerez (ou O Que é Jerez?)

  1. Texto interessantíssimo e muito explicativo!
    Como vc sabe, adoro finalizados em ex-jerez. Um próximo degrau poderia ser experimentar maturados em diferentes tipos de ex-jerez, talves?

    Grande abraço!

    1. Acho que, em nome do conhecimento completamente desinteressado, é uma experiência que vale a pena ser feita!

    2. Caro Felipe,

      No conjunto dos maturados em jerez, mas que apresente certa particularidade, tenho duas sugestões:

      Oban – Double Matured
      Auchentoshan – Three Wood

      O primeiro passa por uma finalização num vinho da região de Montilla (próxima a Córdoba) e que poderia ser considerado um Jerez Fino se não houvesse uma legislação disciplinando as Denominações de Origem.

      O segundo, após ser maturado num Jerez Oloroso, sofre uma finalização em Pedro Ximénez.

      Considero dois singles de elevado padrão, mas vamos aguardar a posição de Maurício para evitarmos que seu investimento não seja lá grande coisa.

      Abraços,

      Sócrates

      1. Cara, o legal sobre ter um blog de whisky é que você acaba aprendendo umas coisas malucas com os visitantes. Acho que eles que são os verdadeiros especialistas. Não sabia sobre essa história do Oban Double Matured, muito legal.

        Sobre os dois: não me lembro de ter provado o Oban. Aliás, afirmo que não provei, senão lembraria. Mas deve ser fantástico. Caráter salino com uma lembrança de sherry.

        O Auchentoshan é bem interessante, mas minha impressão é que a leveza do destilado acabou sendo eclipsada pela maturação. Mas veja bem, talvez esse desequilíbrio seja bom. Porque mostra a real influencia do jerez sobre a bebida, sem muita interferência de outros fatores. É uma excelente “escolha acadêmica”.

        recomendaria também o sempre clássico Aberlour A’Bunadh. Jerez de ponta a ponta e alta octanagem.

  2. Ah, dear Dog in a Bottle, eu já comprei vinhos Jerez, especialmente para conhecer o efeito que eles podem causar nos whiskys que nós tanto gostamos e um deles foi o Tio Pepe. É bom, gostei! Abraço, Cesar.

  3. Caro Maurício,

    Sou fã incondicional do Jerez e só eu sei o quanto lamento não participar do evento, mas não ficará em branco, acabei de receber numa compra on-line o Viña AB Gonzalez Byass Amontillado.

    Abraços,

    Sócrates

  4. Caro Maurício,

    Quando estiver sem assunto, que tal nos enviar proporções e preparo dos coquetéis Frontera e God Save the Sherry ?

    Será que já publicou e passei batido?

    Abraços,

    Sócrates

    1. Mestre Socrates, não passou batido. O Frontera sairá em breve. Já o God Save The Sherry… “you’ve got mail”.

  5. Estou muito interessado em me aventurar num sherry whisky, vi recomendação para o Naked Grouse (custo x benefício), alguma sugestão meu caro?
    Gostei muito do seu texto, meu avô é descendente de espanhóis desta região, Andaluzia.

    1. Opa, fala Fabio, tudo bem? Que demais!

      O Naked é bem bom. Eu recomendaria ir no Tamnavulin, que tem ótimo custo-benefício. E se estiver se sentindo um pouquinho mais inspirado, The Macallan (Double Cask) e Dalmore 15.

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