Whiskies lançados em 2020 – Sui Generis

Sui Generis. Se pudesse escolher uma expressão – em latim, claro, para ser sofisticado – para definir dois mil e vinte, utilizaria, certamente sui generis. É o tipo de expressão que é capaz de englobar, com perfeito grau de ambiguidade, tanto algo terrível quanto algo maravilhoso. É como quando dizemos que certa pessoa é interessante, curiosa, distinta e tantas outras expressões que são não-elogios ou críticas veladas. E cabe a você, querido leitor, dependendo de seu grau de otimismo, interpretar como quiser o que quis dizer com isso. Mas posso garantir umas duas coisas sobre dois mil e vinte. A primeira, é que certamente não foi um ano de aprendizado. Eu não aprendi nada que eu precisasse em dois mil e vinte. Se dois mil e vinte não tivesse existido, e eu continuasse sendo a mesma pessoa que eu sempre fui (sem descobrir sobre a elasticidade da demanda de papel higiênico ou a fazer salada de atum e feijão enlatado, por exemplo), permaneceria igualmente feliz. A segunda, é que independente do ano que tivemos, retrospectivas são inevitáveis. Meu spotify e o show da virada estão aí para comprovar isso. Eu, entretanto, prefiro voltar meus olhos para outra recapitulação. A dos […]

Chivas Regal Extra 13 anos – Alotrofagia

Vou contar um negócio meio desconcertante, que eu não sei bem como aconteceu. Meu cachorro comeu meu fone de ouvido. Eu demorei um tempo para perceber. Dei falta dele num domingo, mas achei que tinha deixado em algum lugar estranho, e que logo encontraria. Mas, nos dias subsequentes, comecei a encontrar pistas de seu real paradeiro – o sistema digestivo de meu cãozinho. Primeiro, uma daquelas bolinhas que entra no ouvido. Depois, um pedaço de fio preto. E a prova definitiva e incriminadora – um plugue P2, todo destruído na varanda de casa. Sei lá o que deu no Sazerac para comer um fone de ouvido. Não me surpreendeu muito – ele já havia comido coisas esquisitas, como um chinelo e um pedaço da parede. Mas, o fone de ouvido me pareceu especialmente estranho. Por conta de seu cumprimento e textura, é preciso bastante empenho para comer um fone de ouvido. Resolvi pesquisar na internet. E descobri uma coisa ainda mais surpreendente: tem muita gente com uma compulsão parecida. Aprendi que a síndrome tem o curioso nome de pica. Mas, para evitar qualquer piadinha, vou chamá-lo pelas denominações mais técnicas. Alotriofagia ou alotriogeusia. Definida, talvez numa singeleza maravilhosa, como “o […]

Dewar’s 15 anos – Do Instinto

Sabe aquele momento que você tem quase certeza que vai morrer, mas luta vigorosamente pela vida? Aqueles derradeiros cinco segundos – quando a luta pela sobrevivência é mais vigorosa? O momento do tudo ou nada? Bem, descobri aos doze anos e pouco, durante um passeio a cavalo na chácara de um amigo, que não tenho nada disso. Vou contar, brevemente, para vocês. Passeávamos tranquilamente por uma estrada de terra quando meu cavalo, um belo pangaré branco que andava meio de lado, se assustou com algo. Jamais saberei o que foi. Mas, tão somente, que o animal tracionou as quatro pernas e, num pulo, foi direto da marcha ao galope. Assustado, puxei a rédea – inutilmente – e fiz força nos pés, tentando me manter reto na sela. O que sucedeu não levou mais do que cinco segundos. Ouvi um barulho metálico e perdi o equilíbrio. Me virei para trás – o estribo desprendera, e rodopiava e quicava no chão de areia batida como um ginasta olímpico. Olhei reto, à frente, onde a estrada descrevia um cotovelo fechado. O cavalo não fazia a menor menção de reduzir a velocidade, literalmente, galopante. E, naquele momento, naquele exato momento, um par de segundos […]

Presentes de Natal para quem ama whisky – 2020

Vou aqui declarar o óbvio. Dois mil e vinte tem sido um ano bem atípico. Descobri a importância do álcool setenta, das máscaras faciais e do distanciamento social – algo que, pra falar a verdade, eu já gostava de fazer mesmo em um mundo pré-pandemico. Aprendi também que em tempos de insegurança, as pessoas dão muita importância em deixar o bumbum limpo – o que explica o desabastecimento de papel higiênico lá pelo primeiro bimestre. Percebi que o mundo é muito mais digital do que parece. Fui apresentado ao Zoom, Google Meet e Microsoft Teams. E creio que as pessoas também se conscientizaram que aquela conhecida reunião que poderia ter sido um e-mail realmente, realmente, poderia ter sido só um e-mail. Ou um breve encontro digital, ou uma ligação. Notei também que automóveis e calças são supervalorizados – usei ambos muito pouco nos últimos dez meses. Em um ano em que tantas coisas mudaram, criar uma lista de presentes de natal me parece um preciosismo. Por outro lado, talvez não seja. Quiçá é bem o contrário. Presentear aquela pessoa que lhe é cara pode ser uma demonstração muito mais significativa do que antes era. É também a oportunidade de inovar […]