Chivas Regal Extra 13 anos – Alotrofagia

Vou contar um negócio meio desconcertante, que eu não sei bem como aconteceu. Meu cachorro comeu meu fone de ouvido. Eu demorei um tempo para perceber. Dei falta dele num domingo, mas achei que tinha deixado em algum lugar estranho, e que logo encontraria. Mas, nos dias subsequentes, comecei a encontrar pistas de seu real paradeiro – o sistema digestivo de meu cãozinho. Primeiro, uma daquelas bolinhas que entra no ouvido. Depois, um pedaço de fio preto. E a prova definitiva e incriminadora – um plugue P2, todo destruído na varanda de casa.

Sei lá o que deu no Sazerac para comer um fone de ouvido. Não me surpreendeu muito – ele já havia comido coisas esquisitas, como um chinelo e um pedaço da parede. Mas, o fone de ouvido me pareceu especialmente estranho. Por conta de seu cumprimento e textura, é preciso bastante empenho para comer um fone de ouvido. Resolvi pesquisar na internet. E descobri uma coisa ainda mais surpreendente: tem muita gente com uma compulsão parecida.

Aprendi que a síndrome tem o curioso nome de pica. Mas, para evitar qualquer piadinha, vou chamá-lo pelas denominações mais técnicas. Alotriofagia ou alotriogeusia. Definida, talvez numa singeleza maravilhosa, como “o hábito de comer substâncias sem valor nutricional”. Há casos inclusive bem célebres, como de uma mulher que se esbaldava em fraldas infantis sujas, uma senhora que comeu um quarto inteiro e um maluco que consumiu cinco mil lâmpadas de filamento ao longo de sua gastricamente dolorosa existência. Há até um filme sobre isso – Swallow, estrelado pela Haley Bennet.

Chico – muso da alotriofagia

Fiquei pensando, depois, se nós, entusiastas do whisky, não somos um pouco assim. Existe uma estranha compulsão em experimentar algo que jamais provamos. É antinatural, até, porque como animais, deveríamos preservar nossa saúde e há poucas coisas mais arriscadas do que ingerir algo que desconhecemos. E tem também o negócio de jogar seguro. Se algo já é gostoso e conhecido, é um tanto inexplicável essa força que nos faz sair da zona de conforto só pra ter uma experiência um tantinho (ou bastante) diferente.

Mas foi justamente nessa toada que experimentei o Chivas Extra 13 anos, recém-lançado pela marca no Brasil. Outrora um blended whisky sem idade declarada, o rótulo foi relançado nos mercados mundiais agora com uma declaração de idade e nova composição. Algo que, aou saber, me trouxe proverbiais calafrios. Sempre nutri um carinho todo especial pelo Chivas Extra – em parte por uma questão emocional, e, em parte, porque realmente gosto do whisky. Para mim, era injustificável qualquer mudança. No entanto, quando provei a nova versão, me senti novamente seguro.

Ainda mais porque a prova foi feita em uma degustação virtual, conduzida por ninguém senão Sandy Hyslop, master blender do grupo Chivas Regal, e pelos embaixadores Rhys Wilson e Ken Lindsay. Durante o evento, Hyslop explicou que o Chivas Extra 13 anos leva uma parcela generosa de single malts maturados em barris de carvalho europeu que antes contiveram vinho jerez oloroso – especialmente Longmorn. Isso traz a ele uma nota apimentada, de gengibre, e um certo frutado seco, que remetia ora a figos, ora a passas.

Ao ser indagado sobre a origem do vinho jerez, Hyslop declarou “não compramos barris de jerez vazios quaisquer e mandamos para a Escócia. Nós vamos muito além disso. Compramos carvalho espanhol, que é temperado por dezoito meses na Espanha. Os barris são então montados e especificamos o exato oloroso que irá para os barris por mais um ano. E então eles são esvaziados e enviados para a Escócia. Tudo tem que ser rapido – eles tem que chegar na Escócia em 7 dias e serem preenchidos por whisky em 10 dias. E tudo isso acontece no inverno. Não fazemos no verão para evitar que o jerez se estrague” e continua “estamos investido bem no começo do processo para garantir a qualidade de nossos barris de jerez“.

Hyslop explicou que o Chivas Extra 13 segue um processo bem incomum de produção. “A influência do jerez vem de treze anos de maturação em barris de carvalho espanhol de jerez. Nós criamos um blend especial de treze anos, então pegamos alguns barris de Longomorn Single Malt de carvalho europeu de primeiro uso (first-fill) e incorporamos no blend. A ideia é elevar o sabor deste treze anos“. De acordo com o master blender, criar o equilíbrio é um ajuste fino – o Extra deve manter as credenciais da casa Chivas.

Sucumbi a tentação de perguntar sobre o antigo Chivas Extra e suas mudanças de rótulo. Antes, oloroso, depois, sherry, e, por ultimo, oloroso novamente. “Todas as expressões usam jerez oloroso. A descrição na nova expressão vem da vontade dos consumidores de saber mais sobre o produto. A mudança no rótulo foi só nosso marketing brincando com as coisas. A fórmula permanece exatamente a mesma, posso te garantir do cara que produz o whisky

Extra antigo

Sensorialmente, o novo Chivas Rega Extra 13 anos guarda semelhanças importantes com seu predecessor. Mas é também notavelmente diferente. O antigo whisky era mais agressivo e intenso. O novo, com idade, parece mais adocicado e lapidado. A influência do vinho jerez oloroso também é mais evidente – deixe as duas doses descansarem no copo por alguns minutos e essa diferença ficará ainda mais clara. O Chivas Regal Extra 13 anos evolui para um whisky agradavelmente vínico e adocicado.

Talvez, realmente, tenhamos uma parcela de alotriofagia. Uma versão bem branda do hábito, em que nos privamos de beber aquilo que conhecemos só pela emoção de provar algo novo. Pode parecer um tanto inexplicável, mas, na verdade, é de uma clareza cristalina. São produtos como o novo Chivas Regal Extra 13 anos que justificam este impulso. Sinto que, cada vez mais, compreendo meu cãozinho.

CHIVAS REGAL EXTRA 13 ANOS

Tipo: Blended Whisky com idade declarada (13 anos)

Marca: Chivas Regal

Região: N/A

ABV: 40%

Notas de prova:

Aroma: aroma floral, de marzipã e frutas cristalizadas.

Sabor: de frutas cristalizadas e ameixa, com marzipã, gengibre e chocolate ao leite. Final longo e adocicado, mais vínico e suave do que a expressão sem idade declarada anterior.

9 thoughts on “Chivas Regal Extra 13 anos – Alotrofagia

  1. Legal que com esse lançamento a Chivas vai estar muito bem posicionada nessa faixa. Com um whisky clássico (o 12 anos) e um com um ar mais moderno (esse 13 anos).

  2. Como vai, mestre?
    Sabe que gosto bastante da linha dos defumados, o que me leva normalmente à Black e Double Black quando estou no campo dos blendeds.
    Porém, gosto bastante do Chivas, inclusive por uma questão familiar também. Era o “whisky do meu avô” rs. E o excepcional Chivas Extra, que inclusive foi indicado pelo senhor, me fez entrar de vez no mundo do whisky.
    Sempre gostei dessa força bruta encontrada nos whiskys NAS (de qualidade, óbvio), além da oleosidade excelente dele.
    Acho que será uma compra obrigatória para ver o que os 13 anos fizeram por sua lapidação e eu também nunca precise de desculpa para beber hahaha.

    Abraço, mestre! Agradeço o apoio e as vibrações positivas.
    Que venham tempos melhores!

    1. Fala mestre! Bom te ver por aqui! Como estão as coisas?

      É isso – NAS é intensidade muitas vezes. Como tudo, pode ser usado para coisas boas e ruins. Mas, no geral, é bom que existam 😀

  3. No final acabei não entendendo, é o blend que envelhece em barris de Jerez ou um ou mais singles que o compõe que passam por esse processo Maurício ?

  4. Grande Maurício.
    Concordo com você o Chivas Extra NAS era um Whisky excepcional, fiz muitas combinações de Chivas Extra com Charutos da Dona Flor e Cervejas IPA.
    Diria que o Chivas extra 13 anos foi um grande acerto da destilaria, mas sinto que ao se adicionar gelo acaba por matar o aroma e suavizar demais o Whisky.
    Ainda não arrisquei coquetelaria com o Extra 13, Alguma sugestão ?!
    Cordialmente, abç forte.
    Gabriel Saint Martin

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