Yamazaki Golden Promise – Gamma Ray

Invisível, traiçoeira e carcinogênica. Essa é a radiação gama. De forma – não muito – simplificada, são fotons que normalmente resultam de eventos cósmicos violentos como explosões estelares e desintegração nuclear. É a faixa mais curta do espectro eletromagnético, e capaz de atravessar a maioria da matéria. No mundo real, exposição a estes raios geralmente tem consequências pouco agradáveis. Como leucemia, malenoma, linfoma e retinoblastoma – que é um cancer que afeta as células retinianas e me dá um troço só de pensar, porque tenho uma aflição gigante de tudo que envolve olho. A ficção, porém, tem um talento peculiar para converter os mais sinistros agentes da realidade em bênçãos. Bruce Banner, por exemplo, do universo da Marvel. Antes um físico brilhante, recebeu uma dose cavalar de radiação durante um teste militar. Mas ao invés de ter seus órgãos liquefeitos, transformou-se num colosso esverdeado com força sobre-humana. E cujo temperamento se beneficiaria muito de uma receita irrestrita de fluvoxamina e alprazolam. Há um único caso que conheço na qual a realidade imitou a ficção. No fim da década de 1950, cientistas do Reino Unido submeteram sementes de cevada à exposição controlada de radiação gama para induzir mutações benéficas. O resultado […]

Visita à Yamazaki – Kaitenzushi

Eu sabia que existia. Mas, quando vi ao vivo, fiquei meio embasbacado. Pequenas porções de sushi em pratos nanicos, de todas as formas e cores, girando sobre uma esteira oval, como se fossem malas em um aeroporto. Ao redor da esteira, do lado de fora, clientes operando tablets e retirando os diminutos pratos de seu infinito looping. Do lado de dentro, um rapaz japonês, adicionando pedacinhos de peixe cuidadosamente cortados sobre montinhos de arroz. Era meu primeiro dia no Japão, e havia resolvido conhecer um Kaitenzushi. É esse o nome que dão por lá para um estilo bem famoso de sushi – que em inglês, chamam de “conveyor belt sushi”. Apesar de parecer uma cena de algum filme futurista, os famosos “sushi de esteira” – como seria nossa melhor tradução – são, na verdade, os restaurantes mais acessíveis da espécie. E isso tem uma razão. A interferência humana é quase inexistente. Os comensais fazem seus pedidos usando uma espécie de iPad – caso queiram algo específico – ou simplesmente retiram os pratos que vagarosamente desfilam às suas frentes. O arroz é feito e porcionado por máquinas. O chef só coloca o peixe em cima. Até para pedir a conta, não […]

Suntory Yamazaki 12 anos II – 2020

Essa é a segunda prova do Yamazaki 12 anos neste blog. A primeira foi escrita em 2015 (leia a original aqui). Porém, devido à volta deste desejado rótulo às nossas terras, resolvemos revisitá-lo e fazer uma prova completamente nova. Se você tem um iPhone, abra seu teclado e procure o emoji de onda. Observe com atenção e deixe-me explicar porque esta imagem lhe parece tão familiar. O desenho é baseado em uma obra de arte clássica japonesa do período Edo. A Grande Onda de Kanagawa, uma xilogravura do artista Katsushika Hokusai – parte de sua icônica série de trinta e seis vistas do monte Fuji. Ela é provavelmente a obra de arte mais reproduzida do mundo. Está em muros, sapatos, camisetas, carteiras e até mesmo emojis. Ao longo dos séculos, a obra de Hokusai influenciou grupos e movimentos inteiros da arte. Como a Ar Nouveau, o Simbolismo, os Nabis e os pós-impressionistas. Suas xilogravuras trouxeram a noção de que a pintura é algo bidimensional. A ilusão de profundidade – quando há – é dada somente pela cor. Uma técnica tão importante que foi usada tanto por artistas tradicionalistas, como os primitivos italianos, quanto por ícones da arte moderna, como David […]

Das Flores – Suntory Hibiki 12 anos

Se você é um fã de Gordon Gekko, o inescrupuloso investidor fictício de Wall Street, talvez saiba o que foi a Febre das Tulipas. Ou talvez não, porque, enfim, existem coisas melhores para se fazer do que decorar cada trecho de um filme. Então, por via das dúvidas, aí vai uma breve explicação. A Febre das Tulipas foi um período durante o século dezessete em que a elite holandesa tornou-se absolutamente obcecada por uma simples flor. A história toda começou quando um tal Suleiman, o Magnífico, encontrou tulipas em uma de suas viagens à Ásia. Embasbacado – não sei bem por o que – resolveu que enviaria um exemplar a um botânico, em Leiden. O resto da história é pura insanidade. Ou talvez haja alguma reação neurológica desconhecida pela ciência entre a mente dos holandeses e flores sem graça. Porque os abastados da Holanda ficaram tão mesmerizados com aquela espécie que, em pouquíssimo tempo, seu preço disparou. O pico da obsessão ocorreu entre dezembro e fevereiro de 1636. O preço de uma libra de tulipas passou de 125 florins para 1.500 – isso mesmo, mil e quinhentos, não tem um zero a mais aí. Uma inflação de mil e cem […]

Goodbye Mr. Hakushu – Hakushu 12 anos

Eu não sou bom com despedidas. Não que eu chore, fique sensível, comece a ouvir Coldplay e a devorar livros de autoajuda e tudo mais. Mas, de alguma forma, aquele abandono me atinge. Atinge quase como um vício. Uma vontade que não pode ser mais aplacada. Algo que estava ao meu alcance, mas que, por alguma razão, desapareceu. Talvez como aquela quase proverbial coceira no membro arrancado. Sinto isso com pessoas. Mas não só com elas. Para mim, ocorre também com músicas, comidas, bebidas. Um exemplo disso é um prato, que comia toda vez que ia a um restaurante próximo de minha casa. Era um restaurante bem caro e mais ou menos metido a besta, o que me irritava um pouco. Me irritava até aquele prato chegar. Porque depois, restava apenas aquele shiatsu de língua. E o engraçado é que o prato não tinha nada de muito difícil. Era uma espécie de talharim escuro, com shimeji, que levava um molho de parmesão batido. A consistência do molho era próxima de uma espuma, um chantilly, mas com bastante sabor de queijo. Essa era a parte genial dele. O molho. O molho era tão genial, mas tão genial, que eu abria mão […]

Inu Engarrafado – Suntory Hibiki 17 anos

Vou confessar a vocês algo difícil. Um desejo profundo, que tenho certeza que todo mundo tem, mas que quase ninguém admite ter. Talvez vocês me condenem depois de saber, ou julguem que seria melhor se eu visitasse um psicanalista. Mas não me importo. Preciso tirar isso do meu peito. Preparem-se, porque aí vai. Às vezes eu queria ser outra pessoa. Mas não qualquer outra pessoa. E não, eu não queria ser um cachorro, apesar do nome do blog. E nem um sheik árabe bilionário, tampouco um astronauta. Quem eu realmente, mas realmente queria ser, se pudesse escolher entre todas as pessoas do mundo inteiro, seria o Bill Murray. E aí você vai argumentar comigo que isso é realmente insano. Afinal, porque alguém quereria ser o Bill Murray, se você pudesse ser, sei lá, o Neymar? Ou o Donald Trump? E aí eu vou responder que é porque nem o Neymar, nem o Donald Trum possuem licença para serem completamente malucos – ainda que ultimamente o Donald Trump tenha tentado bastante – e todo mundo achar normal. Mas o Bill Murray tem. E ele faz isso sem precisar mexer nem um músculo da face. Quase como uma vaca hindu. Para você […]

Inu Engarrafado – Yamazaki 12 anos

A combinação entre ambição e excesso de autoconfiança é perigosa. A história está cheia de pessoas com grandes sonhos e ideias que mudariam o mundo. Só que não. Um grande exemplo é o cara que inventou o sutiã masculino. Mas o meu preferido é o Sr. Dean Kamen. Já ouviu falar dele? Pois é. Sr. Kamen foi o inventor de um produto que, segundo informações que teriam vazado antes de seu lançamento em 2001, revolucionaria a história do transporte de pessoas. Algo que mudaria para sempre a humanidade e a forma com que ela se locomove. Segundo Kamen, os dias do carro estavam contados. Aquela invenção seria para o automóvel, o que o automóvel fora para o cavalo. Para piorar, em um claro momento de insanidade corporativa coletiva, aqueles que tiveram acesso à invenção estavam maravilhados. Steve Jobs disse que seria maior do que o computador. John Doerr (venture capitalist por trás da Netscape e Amazon), por sua vez, disse que seria ainda mais importante do que a internet. E em 2002, o grande visionário Dean Kamen finalmente decepcionou o mundo com sua invenção: o Segway, um diciclo elétrico, capaz de transportar uma pessoa em pé, a mais ou menos treze […]