O Cão Geek – Filtragem a Frio

“Eu não poderia usar minhocas no hambúrguer, elas são mais caras do que carne bovina” foi a respota do executivo Ray Kroc ao New York TImes, sobre os boatos de que o McDonald’s recheava seus burguers com anelídeos. A história surgiu em 1978, quando um ex-funcionário do méqui foi entrevistado em um talk-show, e supostamente revelou o segredo da companhia – vermes. O boato ganhou tanta força que, no ano seguinte, a rede de fast-foods teve sua receita (financeira, não de hambúrguer de minhoca) reduzida a dois terços, e teve que dispensar boa parte da força de trabalho. O restaurante se viu na obrigação de dar explicações. Encomendou laudos ao FDA e lançou uma campanha explicando de onde vinham seus burguers – gado, no caso. Até hoje, para evitar quaisquer dúvidas, anunciam ativamente que seus patties são feitos 100% de carne bovina. Vai que um dia muda. O argumento mais convincente, entretanto, foi o de Ray Kroc. Se não for pra reduzir o custo, pra que usar vermes? O mais engraçado é a razão da eficácia da declaração. Ninguém espera que um megaconglomerado de alimentação tenha princípios – se for mais barato, tá liberado comer minhoca, porque o consumidor não […]

New York Sour Clarificado

Plantar feijão no algodão e prender gelo no barbante usando sal são dois experimentos que quase toda criança já fez. Mas, a preferida, sem dúvidas, é o chafariz de Coca e Mentos. O experimento é tão famoso que há até composições artísticas, com fotos elaboradíssimas. A Coca-Cola com Mentos não é só um experimento científico infantil. É quase uma lenda. E como quase todas as lendas, ela pode ser moldada ao prazer do interlocutor. A vovó diria que olha só, esse negócio explode porque é tudo porcaria, feito de borracha e produto químico. Meu filho, inquisitivo, indagaria o que aconteceria com o estômago dele se bebesse o refrigerante e engolisse uma balinha logo em seguida. Será que eu ia explodir também, papai? O mais curioso é que até pouco tempo, não havia consenso sobre a razão do curioso fenômeno. Atualmente, a teoria mais aceita envolve tensão superficial e carbonatação. O mentos não é perfeitamente liso. Suas reentrâncias fazem que as ligações entre o líquido e o dióxido de carbono (o gás) se desestabilizem, causando o aparecimento de bolhas. Essas bolhas provocam mais bolhas, em uma reação em cadeia que culmina numa erupção curiosamente fascinante e ao mesmo tempo meio nojenta. […]

Tobermory Gin – Diversificação

Há trinta e cinco anos, um jovem empresário, proprietário de uma gravadora, teve seu voo cancelado. Ele estava em Porto Rico, e queria chegar às Ilhas Virgens Britânicas o mais rápido possível, para encontrar sua namorada. Se fosse eu, teria simplesmente me resignado. Abriria uma garrafa de whisky da mala, daria um gole, e aceitaria meu destino. Passaria uma noite mal dormida em qualquer hotel com paredes gordurentas e carpete manchado próximo ao aeroporto, para, finalmente, embarcar no dia seguinte. Mas o jovem empresário não era eu. Era Richard Branson. Ao invés de se alcoolizar e dormir, Richard tomou uma atitude. Calculou quanto custaria para fretar uma aeronave e dividiu os custos com os demais passageiros do voo cancelado. Chamou aquilo de “Virgin Atlantic First Flight”. Fast-foward, Branson compraria um Boeing 747 e fundaria sua companhia aérea. E depois, uma aeroespacial. Isso sem abrir mão de seu antigo negócio, no ramo musical. Diversificar de uma forma selvagem, assim, é raro. Na verdade, é como dizem. É raro, mas acontece muito. O que é realmente inusitado, é dar certo. E foi o que aconteceu com Branson e suas Virgins (perdão pela digressão aqui, mas que nome horrível este, que faz tudo […]

Johnnie Walker Black Label Sherry Finish – Cover

Abro meu Spotify. Toda semana, uma seleção de músicas diferentes que o aplicativo acha que vou gostar. Ele acerta pouco, mas já fiz grandes descobertas assim. Não é lá muito romântico. É muito menos romântico, por exemplo, do que era há umas duas décadas atrás, quando comprava na loja certo CD, e ouvia insistentemente, até gostar de todas as músicas. Alguns exigiam bastante esforço. Outros, bem pouco. Como um tal MTV Unplugged do Nirvana, circa 1993. Aliás, essa é uma história engraçada. Quando comprei o CD, minhas preferidas eram Lake of Fire e The Man Who Sold The World. Devido à falta de informação e minha ignorância aos dez e poucos anos, nem imaginava que eram dois covers: Meat Puppets e Bowie. Só fui descobrir uns cinco anos depois, ao ouvir a original. Covers bons são assim. Eles não apenas reformam algo familiar. Mas reinventam o material original, transformando completamente o som, mas mantendo sua alma intacta. A ponto de às vezes você nem saber que é um cover. Há covers péssimos também. I can Get no Satisfaction da Britney, Smells Like Teen Spirit da Miley e Faith do Limp Bizkit, todos doem em lugares bem especiais. Sabe o que […]

Por que colocar água no whisky (ou não)

Quando eu era moleque, não tinha muitos critérios alimentares. Quer dizer, na verdade, tinha sim. Gostava de tudo com ketchup. Como toda compulsão, essa começou inocentemente. Molhando batatinha frita no molho de tomate da lanchonete. O movimento de levar o ketchup da batata para o hambúrguer foi completamente natural. Assim como de aplicar ketchup no misto quente – afinal, é um sanduíche, como o hambúrguer. Mas, quando menos percebi, minha alma juvenil já estava corrompida. Era um usuário contumaz do molho, sem menor chance de regresso. No frango frito, até parecisa razoável, e quem me via, não suspeitava que era dependente. Em casa, secretamente, colocava ketchup no mexidão, no arroz, no bife e até no feijão. Quando passei a colocar ketchup no peixe, tive uma espécie de epifania, talvez por overdose. Tudo que eu comia não tinha gosto de comida. Mas de ketchup. Ketchup me fazia consumir até a coisa mais incomível do mudo. Mas, tirava toda parte boa da experiência – que é experimentar e descobrir coisas novas. Aí, de repente, lá pelos quatorze anos, resolvi que me tornaria temporariamente abstêmio de ketchup. Funcionou. Mais ou menos um ano depois, voltei a comer, mas com muito mais parcimônia. Mas, […]

Mark Twain – Muito de qualquer coisa

“Muito de qualquer coisa é ruim, mas muito de um bom whisky jamais é o suficiente”. A frase é de Samuel Langhorne Clemens, mais conhecido pelo seu pseudônimo, Mark Twain. Sob a alcunha, Clemens escreveu livros que se tornaram clássicos da literatura norte-americana, como As Aventuras de Tom Sawyer e Huckleberry Finn. Além de ser considerado um dos mais importantes romancistas dos Estados Unidos de todos os tempos, Twain era um inveterado apaixonado por Scotch Whisky. Pode parecer estranho, para um natural do Missouri, preferir whisky escocês ao americano. Mas era, justamente, o caso. Depois de uma temporada em Londres, Twain se apaixonou pela bebida. Além da frase que abre esta matéria, ele tem outra excelente máxima. “Eu sempre tomo whisky escocês a noite para prevenir dor de dente. Eu nunca tive dor de dente, e vou lhe dizer mais, eu não pretendo ter também” Naturalmente, tamanha paixão deveria ser consagrada com um coquetel. Ocorre, entretanto, que neste caso, foi o próprio Mark Twain que alçou seu homônimo líquido à fama. A receita – mais ou menos – aparece eum uma carta que ele escreveu à sua esposa, em 1874, enquanto visitava Londres. “Livy, minha querida, quero que se assegure […]

Union Pure Malt Wine Cask Finish – Karate

Conselhos valiosíssimos podem vir dos lugares mais improváveis. Como, por exemplo, do Senhor Miyagi. O sensei fictício tem frases ótimas, aplicáveis a uma miríade de situações na vida. Há ensinamentos sobre poder restaurador de uma refeição, em “melhor ser incomodado de barriga cheia do que de barriga vazia“. E também sobre a responsabilidade docente “não há maus alunos, apenas maus professores“. Alguns ensinamentos são difíceis de contestar. Como no singelo binômio existencialista, da morte e da vida, em “quem morre não vence“. Outros, porém, me parecem apenas alento “Para uma pessoa com ódio no coração, a vida é pior que a morte.”. Desculpe, Sr. Miyagi, mas já fiz muita coisa com ódio no coração, e ficou ótimo. Já cozinhei refeições ótimas com ódio. Escrevi contratos com ódio. O amor até é importante, mas o poder do ódio não deve ser subestimado. Aliás, isso nos leva a mais um ensinamento do Sr. Miyagi. Talvez, o maior deles, sobre o equilíbrio na vida. “Melhor aprender equilíbrio. Equilíbrio ser chave“. Alguns dias, corro por uma hora na esteira, como peixe, bebo quatro litros de água – quatro, só pra me sentir um overachiever. Em outros, quero inalar um litro de whisky, tomar Pepsi […]

Single Malts para Iniciantes – 2022

Ultrapassado o rio Aqueronte pela balsa de Caronte, chegaram Dante e Virgílio aos portões do inferno. Não tenhas medo, disse o poeta romano. Aqui encontramos as almas sofredoras que já perderam seu livre poder de arbítrio, mas não és uma delas. Tu ainda vives. Estendeu a mão a Dante, para dar-lhe coragem para adentrar o portal do submundo, cujo zênite do arco apresentava a dura conclusão “deixai toda esperança, vós que entrais“. Logo que cruzaram, ouviram o eco de gritos terríveis e lamentos eternos, envoltos pelo mais perfeito breu sem luz dos astros. Atordoado pelo tumulto de lamúrias, indagou Dante a Virgílio “mestre, quem são estas pessoas que tanto sofrem?“. Ao que respondeu Virgílio, em tom sereno e profundo “Este é o destino daquelas almas que se apaixonaram por whisky, e inadvertidamente, cruzaram os portais tártarios para jamais retornar“ Com esta pequena parábola, querido leitor, inicio aqui a edição de 2022 de nossa matéria sobre whiskies para iniciantes. Tenham em mente, nobres companheiros – este é um caminho sem volta e sem redenção. Como Virgílio, estenderei uma metafórica mão para lhes guiar entre as trevas desta paixão. Mas, não espere que lhes apresente a saída depois; ou lhes devolva o […]

South By Southwest – Negroni Week Special

Monção é uma pequena cidade no extremo norte de Portugal, com pouco mais de dezessete mil habitantes. Ela é dividida em diversas freguesias, dentre elas, Pias. Ao norte, está a cidade espanhola de Salvaterra de Minho, e ao sul, a portuguesa de Arcos de Valdevez. Ainda que seja uma região bonita, não há nada que difere Monção dos vilarejos vizinhos. Come-se cabrito e bebe-se bastante vinho, especialmente da uva Alvarinho. Recentemente, entretanto, a cidade tornou-se famosa nos noticiários por conta do cancelamento de uma feira tradicional da cidade. A Feira da Foda. A fama, como você deve presumir pela risadinha boba que deu ao finalizar o último parágrafo, não se deu pelo cancelamento da feira em si. Mas, pelo nome pouco ortodoxo do evento. De acordo com o website oficial, a Feira da Foda foi assim batizada por conta de uma prática um tanto desonesta de alguns comerciantes da região, explicada a seguir. Há muito tempo atrás, os habitantes das cidades próximas compravam caprinos nas feiras, para comer conforme a tradição de Monção – em alguidar de barro, levado no forno a lenha. “Na feira, havia de tudo, gado bom e menos bom. A verdade é que os criadores e […]

Royal Salute Richard Quinn – Colaboração

Em 2010, a Revista Time fez uma lista das cinquenta piores invenções de todos os tempos. Enre as mais as mais brilhantemente estúpidas criações de todos os tempos estavam o Segway, a Hawaii Chair e popups de internet – itens cuja extinção facilmente atingiria consenso mundial. Mas, também, alguns produtos bem populares, ainda que detestáveis. Como, por exemplo, Crocs – os famosos sapatos de borracha idolatrados por chefs de cozinha. Acontece que, com o tempo, os Crocs passaram de detestados para adorados. Em boa parte por conta de parcerias com grandes marcas e celebridades. Houve uma porção de associações bizarras, como Justin Bieber, KFC (sim, a lanchonete) e o filme Carros. Mas, também, algumas que colocaram o sapato no epicentro da moda. Christopher Kane, por exemplo, e os famosos Crocs com salto alto da Balenciaga – aquela lá, que recentemente lançou uns sapatos todos detonados. Essas colaborações, para falar a verdade, não são novidade no mundo corporativo. Uma grande empresa reconhece que sua marca é um de seus mais preciosos ativos. Assim, unir forças para aumentar a base de consumidores é algo quase tão genial quanto usar sapatos laváveis de borracha. Algumas parcerias são bizarras, tipo quando o McDonalds lançou […]