Abro meu Spotify. Toda semana, uma seleção de músicas diferentes que o aplicativo acha que vou gostar. Ele acerta pouco, mas já fiz grandes descobertas assim. Não é lá muito romântico. É muito menos romântico, por exemplo, do que era há umas duas décadas atrás, quando comprava na loja certo CD, e ouvia insistentemente, até gostar de todas as músicas. Alguns exigiam bastante esforço. Outros, bem pouco. Como um tal MTV Unplugged do Nirvana, circa 1993.
Aliás, essa é uma história engraçada. Quando comprei o CD, minhas preferidas eram Lake of Fire e The Man Who Sold The World. Devido à falta de informação e minha ignorância aos dez e poucos anos, nem imaginava que eram dois covers: Meat Puppets e Bowie. Só fui descobrir uns cinco anos depois, ao ouvir a original. Covers bons são assim. Eles não apenas reformam algo familiar. Mas reinventam o material original, transformando completamente o som, mas mantendo sua alma intacta. A ponto de às vezes você nem saber que é um cover.
Há covers péssimos também. I can Get no Satisfaction da Britney, Smells Like Teen Spirit da Miley e Faith do Limp Bizkit, todos doem em lugares bem especiais. Sabe o que não dói? Hurt, do Nine Inch, revisto pelo Johnnie Cash. Mas não é culpa deles. É da musica. Reinterpretar uma música já consagrada, clássica, conhecida, é um enorme risco. Todo mundo já tem o benchmark.
E isso acontece no mundo do whisky, também. Mexer numa receita clássica de um dos mais consagrados blended whiskies do mundo pode dar terrivelmente errado. Mas, não neste caso. É que acaba de chegar ao Brasil o Johnnie Walker Black Label Sherry Finish. O mais famoso blend do mundo, mas agora, numa edição limitada, finalizado em barris de carvalho que antes contiveram vinho jerez espanhol. Aliás, fato curioso que agora me ocorreu: o tema da prova original do Johnnie Walker Black Label foi, justamente, David Bowie.
Não há muita informação sobre o Johnnie Walker Black Label Sherry Finish. Exceto, talvez, o que já saibamos. Seu coração é o mesmo do Black clássico. Cardhu, Clynelish e Glenkinchie, com um pouco de Caol Ila para a fumaça. O whisky de grão é Cameronbrig. O blend é feito e depois colocado em barris de carvalho temperados com jerez – um jerez, aliás, especialmente criado sob encomenda da Diageo, para trazer sabor aos barris.
O processo de finalização é mais comum em single malts – foi protagonizado pela Balvenie e Glenmorangie na década de oitenta. Mas apenas recentemente passou a ser utilizada pela indústria de blended whiskies. A própria Johnnie Walker já lançou rótulos com esta técnica. É o caso do Johnnie Walker Red Rye Finish, um blend experimental, finalizado em barris de whiskey de centeio. A diferença é que, no caso do Red Rye, o blend era completamente novo. Agora, com o Sherry Finish, a base é o Johnnie Walker Black Label.
Sensorialmente, o Johnnie Walker Black Label Sherry Finish traz notas de fumaça, frutas vermelhas e pimenta do reino. É mais adocicado do que o Black tradicional, mas, também, mais intenso. A influência do barril de vinho jerez trouxe complexidade e força ao whisky. Ao prová-lo pela primeira vez, inclusive, tive a impressão que bebia um single malt. A finalização é longa, frutada e defumada.
O preço é também um ponto importante. O Johnnie Walker Black Label Sherry Finish custa, em média, 180 reais. Trinta dinheiros acima do tradicional Black Label. É um preço bom, especialmente para um estilo de whisky bem raro no Brasil – os defumados e vínicos. Ainda mais por ser uma edição limitada.
É curioso comparar o Johnnie Walker Black Label Sherry Finish com o Black tradicional. Apesar de alguns pontos de tangência, o whisky é bem distinto. Dizer o óbvio – que ele é um Black Label finalizado em barris de vinho – parece reduzí-lo. Ele é quase como um bom cover. A alma do original está lá, preservada. Mas todo o resto foi reinterpretado e reequilibrado, para trazer vida própria. Beba ouvindo I Can Get No Satisfaction. Versão dos Stones, por favor.
JOHNNIE WALKER BLACK LABEL SHERRY FINISH
Tipo: Blended Whisky com idade definida – 12 anos
Marca: Johnnie Walker
Região: N/A
ABV: 40%
Notas de prova:
Aroma: especiarias, frutas vermelhas, fumaça
Sabor: frutas em calda, amendoas, frutas vermelhas. Levemente defumado. Final adocicado e defumado.
Mais um excelente texto, muito bom! Essas músicas são muito boas e para sempre. Esse Black também é?
Bem bom!
Já reservei uma garrafa lá no Caledônia, para quando estiver disponível!
Em relação a cover, para mim nenhum supera With a little help from my friend, com Joe Crocker! Arrepiante!
Cara, total verdade. Essa música ficou MUITO melhor.
Ops! Joe Cocker…
Atualmente dá pra conseguir ele na faixa dos 140, vou comprar pra experimentar, o Black Label é um dos meus blends preferidos e quero ver como ele fica com essa finalização
Melhor whisky vinícolo de todos os tempos ,
Desculpem a ousadia, mas esse vinico é perfeito com Zakk Wylde cantando Sleeping Dogs