Affinity Cocktail – Semelhança

Você já reparou como às vezes dois filmes praticamente idênticos estreiam quase ao mesmo tempo? Às vezes, isso é maravilhoso, porque os dois são ótimos. Tipo Failsafe e Doctor Strangelove. Outras vezes, um é melhor que o outro, como Braveheart – que é um clássico – e Rob Roy. Que não é realmente ruim. Mas podia focar menos no Liam Neeson satisfazendo sua esposa na grama, e mais na história da Escócia. E em outras situações, todos são ruins mesmo. Muito provavelmente porque a ideia era péssima já no começo, e a turma entrou numa espécie de delírio e esforço coletivo para tornar a vida dos cinéfilos um pouco mais miserável. Como com O Inferno de Dante com Volcano. Ou Striptease e Showgirls (desculpa, Verhoeven, você é ótimo!). Ah, e aqueles quatro – sim, gente, quatro – filmes sobre meteoros que ameaçam acertar a Terra. Num deles todo mundo morre, no outro o Bruce Willis explode o asteroide por causa da Liv Tyler e nos outros eu nem lembro o que acontece. Só vem, meteoro. O fenômeno, aliás, tem nome. Twin Movies, ou, Filmes Gêmeos. E não é coincidência, transmissão de pensamento ou uma espécie de reiki aplicado ao cinema. […]

Jim Beam Rye Perfect Manhattan – Perfeição

É engraçado como, às vezes, uma pequena fração de algo se torna quase tão célebre quanto seu todo. Um bom exemplo é uma singela frase que Tolstoi, em certo ponto de sua obra prima Anna Karenina, coloca na boca de uma personagem. “Se você procurar por perfeição, nunca estará satisfeito“. A declaração, promovida a aforismo, é um trecho de um papo entre Lvov e sua esposa, lá pelo meio da obra. Mas hoje, pouca gente sabe de onde veio a simples mas significativa frase. É como se Tolstoi, em pessoa, a tivesse proferido, em algum momento marcante de sua vida. Descontextualizar a declaração da esposa de Lvov não a faz perder o sentido. Pelo contrário – eleva e expande seu significado. Talvez seja isso que torne Anna Karenina tão clássico. Apesar da barreira da linguagem – afinal, falar russo não é nada simples – e da época em que foi escrito. O livro é o ícone de uma era e de um estilo, e, mesmo assim, continua atual e significativo. Se pudesse traçar um paralelo entre a obra-prima de Tólstoi e um coquetel, escolheria o Manhattan. O Manhattan é um coquetel clássico, um dos maiores ícones de uma época que […]

Paris-Manhattan – Desconexão

Todos nós temos problemas. E falar sobre eles quase sempre traz alívio. A maioria de nós escolhe o companheiro, um amigo próximo ou um parente. Estes são nossos confidentes. Na literatura também. E lá, o papel do confidente é duplo. Além de muitas vezes auxiliar o herói, o confidente é uma forma de revelar os pensamentos e aflições do protagonista, sem criar artificialidade. Existem infinitos exemplos, da mais clássica à mais prosaica literatura. Horácio é o confidente de Hamlet, na conhecida obra de Shakespeare. Razumikhin é o de  Raskolnikov, em Crime e Castigo. Dumbledore é mentor e confidente de Harry Potter, assim como Galdalf para Frodo. E não, o mestre dos magos não é confidente de ninguém, porque ele é o Vingador e uma muleta de roteiro bem safada. Até objetos inanimados podem ser confidentes. E não estou falando do pessoal que fica contando segredos no Faceboook pra polemizar. Me refiro ao Wilson, do Náufrago, por exemplo. Ou a Alice. Não a do país das maravilhas. Mas a protagonista de uma comédia romântica chamada Paris-Manhattan. No filme ela tem uma estranha obsessão por Woody Allen, e conta seus segredos para um poster do diretor em seu quarto. Aliás, o filme é uma […]

Wild Turkey Rye Whiskey – Cognição

Hoje vou tratar de um assunto que anda em baixa. Ou, para falar a verdade, que talvez nunca esteve em alta. A Capacidade Cognitiva. A capacidade cognitiva é, de uma forma simplificada, nossa capacidade de receber estímulos do meio ambiente e responder a elas. Ela engloba habilidades cada vez mais subutilizadas por nós, como pensamento, raciocínio, linguagem e memória. Vou recorrer a exemplos, para não extenuar a capacidade cognitiva de ninguém aqui. Quando, por exemplo, temos fome e resolvemos fazer um misto quente, usamos a cognição. E ao substituirmos o presunto por peito de peru porque ficamos com preguiça de usar a cognição pra comprar mais, também. Quando bebemos, alteramos nossa capacidade cognitiva. Por isso que às vezes, quando saio, acho que sou o Elon Musk e pago a conta de todo mundo. Ou viro uma versão invertida de James Joyce, que fala coisas profundas que ninguém entende. Mas que, no meu caso, não fazem sentido mesmo e nem são profundas. A capacidade cognitiva dos bartenders brasileiros foi bem exercitada nos últimos anos. Não tínhamos ginger ale para o Moscow Mule, por exemplo – o que exigiu uma bela espuma de criatividade. E tampouco rye whiskey para o Manhattan. Algo […]

Johnnie Walker Blender’s Batch Red Rye Finish

Esses dias estava lendo sobre o AVE Mizar. Uma invenção ridícula, que entrou nos anais da história como como o famoso Pinto voador que matou seu inventor. O Mizar – assim como a rima cretina aliada ao trocadilho ridículo – era a prova de que a soma entre duas coisas ruins sempre resulta em algo muito pior. A ideia já era risível desde o começo. Um carro alado, resultado da fusão entre a estrutura de voo de um Cessna Skymaster e um Ford Pinto, um carro medíocre mesmo sem um par de asas. Seu inventor, Henry Smolinski, sonhava que quando o produto decolasse – figurativamente falando – todos pudessem ter seu automóvel voador. Tanto é que ele, ao se referir à invenção, dizia de uma forma indesculpavelmente misógina “até uma mulher vai poder combinar, ou separar, os dois sistemas sem qualquer ajuda”. Por sorte, o projeto morreu com seu inventor. Durante um voo de teste pilotado pelo próprio Smolinski, uma das asas se soltou do carro, que despencou dos céus e ainda explodiu sobre um caminhão. Mas mesmo se o voo tivesse dado certo, todo o resto estava completamente errado. O Mizar foi uma das experiências mais malsucedidas da aviação. […]

Da excelência e notoriedade – Manhattan

Há poucas coisas e pessoas no mundo que são tão distintas que realmente dispensam apresentações. São aqueles ícones, quase divindades em seus respectivos altares. O tempo, catalisador do oblívio, não os apagou. Pelo contrário, os alçou à categoria de lendas. Algumas delas são Bach, Ferrari, Dostoievski, Coca-Cola, Orson Welles, Cohiba e bacon – sim, caso você não tenha notado a letra minúscula, refiro-me a bacon. Isso. As costas do porco. No mundo da coquetelaria, talvez o coquetel mais emblemático do mundo seja o Manhattan. O Manhattan é a música clássica do mundo dos coquetéis. Atemporal, elegante e profundo. Três adjetivos que lhe garantiram a entrada no rol das mais distintas coisas do mundo, trazendo-lhe à imortalidade. Apesar de sua fama incontestável, não se sabe a origem do Manhattan. A história mais famosa é que ele tenha sido elaborado no Manhattan Club, em Nova Iorque, no ano de 1874, para a comemoração do aniversário de uma – também bastante distinta – senhora. Madame Jennie Jerome, mais conhecida por ser a mãe de Winston Churchill. Acontece que, como ensina David Wondrich, em seu – também icônico – livro Inbibe!, Madame Churchill não poderia estar em Nova Iorque naquele ano. Simplesmente porque estava […]

Drink do Cão – Rat Pack Manhattan

  Esses dias estava conversando com um amigo sobre o Rat Pack. Você sabe o que foi o Rat Pack? O Rat Pack foi um grupo de artistas americanos – cantores e atores – cujo líder era o lendário Humphrey Bogart. O nome Rat Pack foi criado durante a década de cinquenta, provavelmente por Lauren Bacall, esposa de Humphrey, que se referiu a ele e seus amigos como “um grupo de ratos” ao vê-los completamente transtornados e embriagados após uma das incontáveis noitadas em Nova Iorque. O grupo teve diversas formações ao longo do tempo. Alguns de seus membros mais proeminentes foram Frank Sinatra, Dean Martin, Sammy Davis Jr., Joey Bishop, Lauren Bacall, David Niven, Peter Lawford e, obviamente, Bogart. Os mais jovens incluíam Marilyn Monroe e Angie Dickinson. O Rat Pack foi, provavelmente, o grupo de amigos mais talentoso que já existiu na história moderna. Seus membros reuniam uma gama variadíssima de interesses e talentos. Mas havia uma habilidade comum a todos eles. O poder quase sobrehumano de entornar absolutamente qualquer coisa que continha álcool. E em quantidades leviatanescas. Naturalmente, tamanha habilidade não poderia passar sem o devido reconhecimento. Já no novo milênio, no ano de dois mil, quando […]