Drink do Cão – Vieux Carré – Revisto 05/20

New Orleans é uma cidade curiosa. Ela possui pouco menos de trezentos e noventa mil habitantes. Porém, é um verdadeiro caldeirão de influências e produção cultural. É um pólo da cultura Creole e Cajun. Foi o lar de Tennessee Williams, dramaturgo e autor de peças como Boneca de Carne e Gata em teto de Zinco. Além disso, a cidade foi um dos berços do Jazz.

Toda essa prolífica produção tem uma razão. A incrível conjunção das mais distintas culturas. Ao longo de sua história, New Orleans foi influenciada por franceses, espanhóis, ingleses e negros de diversas nações africanas. Foi a combinação de elementos destes povos que trouxe à cidade sua riqueza cultural – hoje um pólo turístico para amantes de música, literatura, cinema, arquitetura e culinária.

Aliás, a cidade é excelente em justamente isto. Misturar. Porque lá foi lá também que nasceram alguns dos mais incríveis coquetéis clássicos, como o Sazerac e o Vieux Carré. Este último, batizado justamente em homenagem ao quarteirão mais conhecido da cidade – o French Quarter, também conhecido como Vieux Carré (“praça velha”).

O Vieux Carré foi criado na década de trinta por Walter Bergeron, do Carousel Bar – que até hoje existe, dentro do Monteleone Hotel, em Nova Orleans. Assim como seu primo mais idoso, o Sazerac, um de seus ingredientes é um bitter criado na própria cidade, o Peychaud’s.

O quarteirão.

Essa, aliás, é uma história interessante. Antoine Amedie Peychaud, imigrante haitiano e proprietário de um apotecário em Nova Orleans – isso é uma farmácia antiga – o teria criado durante o século dezenove. Naquela época, os bitters eram usados para fins medicinais, como se fossem nossos (tão conhecidos) fitoterápicos de hoje. Antoine os misturava com destilado e açúcar, para que seus clientes o consumissem.

Os bitters de Antoine adquiriram notoriedade com o surgimento do Sazerac, outro coquetel criado em Nova Orleans. A fama foi tanta que, mais tarde, a Sazerac Company, responsável por produzir o rye whiskey homônimo, comprou sua receita. Isso sim que é concentração de mercado.

O Vieux Carré é Nova Orleans em estado líquido. Há ingredientes franceses – o conhaque e o Benedictine – e americanos – o Rye whiskey. Há elementos adocicados, secos e amargos. O coquetel é a coexistência equilibrada liquefeita.

A receita abaixo precisa de uma ressalva por conta de uma pequena inconveniência. Os bitters Peychaud’s não desembarcam oficialmente em nosso país. Assim, você tem duas opções. Não usar nada ou usar sua criatividade. Dentro da segunda alternativa, a recomendação seria utilizar algum bitter artesanal com perfil semelhante àquele de Peychaud’s – floral, com anis.  Mas, se você for um afortunado proprietário de uma garrafinha de Peychaud’s, basta ignorar minha substituição.

Então, caros leitores, aí vai a receita de um coquetel que é mais cosmopolita do que um Cosmopolitan. Uma verdadeira celebração liquefeita da pacífica convivência entre culturas. O Vieux Carré.

VIEUX CARRÉ

INGREDIENTES

  • 3/4 dose de Vermute doce
  • 3/4 dose de Conhaque (ou algum brandy semelhante)
  • 3/4 dose de Rye Whiskey como o Wild Turkey 101 Rye (outro ingrediente raro por aqui. Se não tiver, arrisque um Bulleit, por conta do alto grau de centeio em sua mashbill. Se preferir algo um pouco menos picante, vá de Jack Daniel’s Single Barrel ou um Evan Williams 1783 )
  • 1/4 dose de Benedictine
  • 2 dashes (isso é uma chacoalhada) de Angostura (não adianta nem tentar substituir)
  • 2 dashes de Peychaud’s Bitters.
  • gelo
  • cereja (opcional, para guarnição)

PREPARO

  1. Adicione todos os ingredientes em um mixing glass (ou um copo grande) com bastante gelo. Misture com uma colher bailarina (ou algo semelhante).
  2. Desça a mistura em um copo baixo com um gelo grande. Adicione a cereja (pode usar um palito, como na foto).

11 thoughts on “Drink do Cão – Vieux Carré – Revisto 05/20

  1. Como vai, mestre?
    Há tempos estou interessado em começar a arriscar alguns coquetéis.
    Este parece bastante equilibrado.
    Grande abraço!

  2. Sabe de algum licor ou bebida de outro tipo facilmente acessível na terra brasilis que poderia substituir satisfatoriamente o Benedictine? Campari, Martini Rosso, Jaegermeister… ?

    1. Gilmar, tudo bem? Difícil, sabia? A gente usou Drambuie e quase ficou bom, mas não é a mesma coisa. Em um coquetel spirit-foward como o La Louisiane funciona. Mas tem que tomar cuidado.

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