Por QUEM você bebe whisky?

A beleza do mundo é a diversidade. E a quantidade. Porque não importa o quão específico for seu interesse, você sempre encontrará alguém para compartilhá-lo. É o caso, por exemplo, do British Lawn Mower Racing Association – traduzido como Associação Britânica de Corridas de Cortadores de Grama, que promove competições automobilísticas utilizando cortadores de grama motorizados. O clube se espalhou como uma erva daninha ao redor do mundo, e hoje, conta com mais de mil membros.

Tem também o Extreme Ironing Bureau – Grupo dos Engomadores Extremos. Que incentiva a atividade de passar roupa em locais insólitos, como o monte Everest ou uma lancha em movimento. De acordo com seu fundador, Phil Shaw, o esporte “combina as emoções de uma atividade extrema ao ar livre com a satisfação de uma camisa bem passada“. Imagine, então, se os dois grupos se encontram.

Até embaixo d’agua

Um que eu adoraria fazer parte, por exemplo, é a Ordem da Mão Oculta (The Order of the Occult Hand). Era um clube aberto a qualquer jornalista ou escritor que conseguisse inserir a frase “Foi como se uma mão oculta tivesse…” em seus escritos e publicá-los. A frase apareceu em jornais como The New York Times, The Chicago Tribune, the Los Angeles Times. Mas em 2004 a ordem foi descoberta e exposta, e uma nova frase secreta teve que ser criada. Talvez seja “a Florida man

E há clubes talvez tão específicos quanto estes, mas de certa forma, menos excêntricos. Ou não. É o caso, por exemplo, dos grupos e confrarias de degustação de whisky. Eles estão por aí faz tempo. Mas, nos últimos anos, seus números explodiram – reflexo do crescente interesse do público pela melhor bebida alcoólica do mundo. Mas, por aqui, no Brasil, ainda são bem tímidos.

ENTÃO ABRE AÍ SEU BRORA E BRORA BEBER

Antes de qualquer coisa, devo fazer uma ressalva. Eu não sou do tipo que concorda com o aforismo de Alexander Supertramp, em que a felicidade somente é real quando compartilhada. Eu fui muito feliz bebendo sozinho. Assumo que, ainda hoje, alguns de meus maiores momentos de plenitude são em casa, quase no escuro, bebendo algum whisky especial. Nada de errado nisso. Contemplação é felicidade, e não precisa ser dividida.

Mas existe uma mecânica complicada, que envolve felicidade e descoberta. Esta sim, é muito mais real quando compartilhada. Descobrir um whisky extraordinário, sozinho no sofá, é mais ou menos como a proverbial árvore, que cai no meio da floresta sem ninguém ver. Uma opinião – ou uma descoberta – não compartilhada é tão ineficaz quanto uma não feita. Você já deve imaginar onde quero chegar.

Mas seria hipocrisia demais, vindo de um colecionador de whiskies, sugerir que alguém imediatamente abrisse todas suas garrafas e compartilhasse com geral. Não é isso. É dar uma chance de descobrir em conjunto. E é aí que confrarias e degustações desempenham seu papel chave. Elas são o caminho mais fácil em direção à descoberta. O risco é comparilhado e benefício, multiplicado. É aquela linda discussão que todo mundo adora ter hoje em dia, da diferença entre preço e valor – em que, caso você não se lembre, preço é um número, enquanto valor é um conceito relativo.

Compare

E você, querido leitor, deve estar aí, acenando afirmativamente com a cabeça ao ler esta matéria, porque, em boa parte, a forma tortuosa pela qual te conduzo em meio às palavras faz sentido. Mas, a prática, é bem mais complicada. Certo amigo, uma vez, fez um experimento: convidou diferentes pessoas para diversos eventos de degustação. Se a pessoa aceitasse, ele pagava, de surpresa, no dia, pra pessoa. Muitos a princípio toparam. Mas, no dia, deram diferentes desculpas, muitas delas envolvendo o custo elevado do evento.

Degustações cujo preço – mas não o valor – se assemelhavam àquele de um single malt médio, ou um blend de luxo, como um Chivas 18. Curiosamente, aquelas mesmas pessoas compraram, pouco tempo depois, garrafas em promoção de whiskies pelo mesmo preço. O que demonstra talvez, numa ótica otimista, que todo mundo sabe a diferença entre preço e valor, mas só precisam de um pouco de calibração.

VAMOS CALIBRAR O GPS DO WHISKY

Existem diversos estudos na indústria sobre a razão pela qual pessoas bebem whisky. Ou, na verdade, consomem qualquer coisa. Dentre as razões, estão se divertir, pertencer a um grupo, impressionar, se destacar, ou só ficar bêbado no escuro, mesmo. Marcas usam essas razões para posicionar suas marcas.

Mas seja qual for a razão, me parece um contrassenso que, ao realizar o tortuoso caminho da apreciação da melhor bebida do mundo, alguém se abstenha a explorá-lo em prol de permanecer na zona de conforto.

Imagino que você, tendo chegado até este ponto do texto, em um blog de whisky, seja um entusiasta – ou faça parte da indústria. Indague sua razão de beber essa maravilhosa bebida dourada. Se é para pertencer a um grupo, este provavelmente é também de entusiastas. E, nada melhor do que vários entusiastas juntos, compartilhando suas descobertas, para elevar o entusiasmo geral. Se é para impressionar ou se destacar, o caminho é o mesmo. Ninguém fica famoso por comprar a vigésima garrafa de Black Label – ou Glenfiddich – em promoção.

Seja rebelde, busque a insegurança. Ninguém faz parte de uma comunidade engomando camisa na área de serviço do apartamento.

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