Compass Box Transistor – Drops

Vou começar esta matéria com uma dica que poderá salvar você, querido leitor, que gosta de tomar whisky ao lado de um copinho de cerveja. Este é um hábito bem comum. Tanto é que no Reino Unido tem até um nome. Boilermaker. Assim como o Pickleback (falaremos disso outro dia), o Boilermaker é quase uma tradição. A combinação de alguma cerveja em pint, normalmente vendida na temperatura ambiente em algum pub, com uma dose de algum whisky bem leve. Nos Estados Unidos, é a união entre uma cerveja suave com algum bourbon ou rye whiskey. Não é bem uma harmonização. Ou melhor, ao menos não é uma harmonização intencional. É um costume. E foi pegando este (nem tão) saudável hábito que a Compass Box Whisky Co., boutique de blended whiskies, criou o Transistor. Um blend especialmente desenvolvido para ser bebido junto – e dessa vez, intencionalmente harmonizado – com a Punk IPA, da BrewDog, e parte da Boilermaker Series da cervejaria. O Compass Box Transistor é um blended whisky, com graduação alcoólica de 43%. Seus principais componentes são Linkwood, Teaninich, Dailuaine e Clynelish, bem como grain whisky da Cameronbridge. A maturação ocorre principalmente em barris de carvalho americano, mas há […]

Macallan Triple Cask 15 anos – Dos Nomes

Uma vez, li uma matéria sobre como as montadoras escolhem os nomes de seus automóveis. É interessantíssimo. E complicado. O que parece natural é, na verdade, um complexo processo criativo. Primeiro, as companhias consultam seus departamentos de marketing para determinar palavras que refletem o perfil do veículo. Literalmente centenas de ideias são concebidas. Depois, especialistas de diversas áreas escolhem os nomes com base nos mais distintos critérios. Por exemplo, não pode ser uma marca registrada de alguma outra empresa. Não pode ser uma gíria, não pode ser um palavrão em outra língua e tem que soar bem. Isso tudo significa que por trás de todo Ford Pinto, Kia Besta, Mazda Laputa, Lancia Marica e Fiat Punto (experimentem arrancar o “n”) há uma equipe de dezenas de pessoas que falhou miseravelmente. Recentemente, uma das mais famosas marcas de single malt do mundo correu o mesmo risco. A The Macallan, ao lançar sua coleção Quest. A antiga linha 1824 foi substituída por uma de produtos com denominações, diremos assim, mais criativas – Quest, Lumina, Terra e Enigma. E tudo bem, porque os nomes soam bem e, de certa forma, transmitem a noção de sofisticação que a marca pretende passar. Porém – e […]

Caledonian 33 anos The Boutique-y Whisky Co. – Drops

Se você gosta de whiskies incomuns, talvez se interesse por esta pequena – porém notável – garrafa. O Caledonian 33 anos The Boutique-y Whisky Company. Há uma série de motivos que o torna um certo unicórnio no mundo do whisky escocês. O primeiro é a sua classificação. Ele é um single grain scotch whisky. O que, per si, já corresponde a uma fração quase irrisória dos whiskies escoceses. Single grains são produzidos em uma única destilaria, utilizando quaisquer grãos – e uma pequena fração de cevada maltada – e destilados, geralmente, em Coffey Stills (uma espécie de destilador contínuo). Ainda que a produção seja grande, a maioria dos grain whiskies são produzidos para integrar blends. É muito raro que haja um engarrafamento que leve exclusivamente um deles. Outro – e o principal – motivo é que sua destilaria não existe mais. A Caledonian fora, por um bom tempo, a maior destilaria de toda Escócia. Porém, por conta de uma série de fusões e aquisições, bem como uma superoferta de whiskies de grão no mercado, a destilaria fechou suas portas em 1988. Seu interior foi reformado e transformado em um conjunto habitacional. Sua chaminé, no entanto – uma das mais altas […]

Bruichladdich Octomore 8.2 Masterclass – Drops

Algumas memórias são mais perenes que outras. Para whiskies também. Há rótulos que nem lembro de ter bebido – o que, na verdade, é ótimo e não é. Porque, por um lado, é uma desculpa pra beber de novo. Por outro, se eu não lembro, então é porque não era nada demais. Então é só uma desculpa pra beber de novo algo medíocre. Mas enfim, há outros tão arraigados em nossa memória que se tornam quase marcos etílicos. Um deles, para mim, é o Octomore – conhecido como o whisky mais defumado do mundo. Experimentei o Octomore (a edição 3.1) quando fui para a Escócia há uns bons anos. Vou contar como foi. Como um apaixonado por whiskies defumados, quando estive por lá, procurei o Octomore por toda parte, mas sem sucesso. Comentei isso com um rapaz de uma loja de roupas – não me pergunte por que entrei no assunto de whiskies com um vendedor de uma loja de vestuário masculino, talvez por ser a Escócia – que se compadeceu com meu ébrio sofrimento e recomendou um bar que possuía uma garrafa – o The Abbotsford. Corri tanto que quase me teleportei para lá. Apontei para o Octomore na […]

Laphroaig Select – Dissonância

Sem nenhuma dúvida, um dos maiores compositores da virada do século 19 foi Igor Stravinsky. Mais do que um excelente músico, o maestro desafiou dogmas seculares da música clássica. Seu trabalho revolucionou a estrutura rítmica da música erudita, e foi largamente responsável pela consagração do dodecafonismo e serialismo como técnicas de composição. Mas fique tranquilo, isso não é um texto sobre música clássica. Além de gênio musical, Stravinsky era também um homem de bom gosto, e muito espirituoso. A prova disso é sua frase “Meu Deus, tanto gosto de beber whisky que as vezes penso que meu nome é Igor Stra-whisky”. Mas nem sempre as coisas foram fáceis para Stra-whisky. Durante sua vida, muitos de seus trabalhos geraram enorme polêmica. A história mais conhecida é da estreia do ballet “A Sagração da Primavera”, que ocorreu em 1913 no Théâtre des Champs-Élysées de Paris, e foi uma das primeiras obras dissonantes do mundo. Já no início do espetáculo, a plateia assoviava e vaiava. Até que, em uma escalada de fazer inveja a qualquer torcida organizada de futebol, os ouvintes começaram a chutar-se mutuamente, aos berros, arrancando poltronas e as arremessando nas cabeças uns dos outros. Enfim, um ballet tranquilo, com gente equilibrada. […]

Aberlour A’Bunadh Alba – Drops

Há uma analogia bem conhecida, utilizada para comparar single malts e blended whiskies. Diz-se que single malts são como um solista tocando uma música para um único instrumento. Como um violoncelo, executando a Suíte No. 1 de Bach. Há um único tema, um fio condutor, uma única nota maravilhosamente – ou não – tocada por vez. Já blends são uma orquestra. Há diversas notas de naturezas distintas ecoando ao mesmo tempo. O que compõe o som é a harmonia. Cada instrumento possui sua função, e contribui um pouquinho para o equilíbrio do arranjo. É difícil isolar uma única nota da orquestra – como é difícil separar um único malte de um blend – mas isso não importa. O que importa é o som do conjunto. Se pudesse estender a analogia, diria que o Aberlour A’Bunadh é como Mistlav Rostropovitch tocando um único – e maravilhoso – lá em seu violoncelo. Com vibrato e tudo. Pouquíssimos single malts tem um tema mais definido do que o Aberlour A’Bunadh. No caso, um tema vínico, profundo e alcoólico. O Aberlour A’Bunadh clássico é o epitome de um whisky maturado em carvalho europeu de ex-jerez – nenhum outro single malt define melhor o estilo. […]

Fettercairn 12 – Brilho do Sol

A vida moderna, também, é geralmente uma opressão mecânica, e o álcool é o único alívio mecânico” uma vez escrever o velho Ernst, em tom quase profético. Opressora e compressora, essa vida moderna. Ainda mais no último mês. Comprimido em casa, sem poder sair, realmente, uma dose de whisky é quase um abraço – hábito que, aliás, também está oprimido. Talvez seja por isso que tenha bebido tanto whisky ultimamente. Graças à quarentena, meu novo hábito etílico prescinde horários. Uma da tarde é um momento totalmente aceitável para começar. O sol a pino, escondido por trás da laje, exige algo floral e delicado. Algo com um certo frescor, sofisticado, porém com um perfil de sabor casual. Como, por exemplo, o single malt Fettercairn 12 anos, recém chegado ao Brasil. O Fettercairn 12 anos é um whisky perfeito para qualquer momento. Sensorialmente, traz frutas maduras e cítricas, e um toque de pimenta do reino. Não chega a ser um whisky delicado, mas está aquém da intensidade de um Dalmore, ou algum monstro defumado de Islay. De certa forma, faz sentido. A Fettercairn está posicionada como uma marca super-premium. Nada mais natural que, sensorialmente, seja acessível mesmo para o leigo, acostumado com […]

Balvenie Portwood 21 – Quarentena

Estou há nove dias de quarentena. Mas talvez sejam onze. Os dias da semana não importam mais. A quarentena deu todo um novo sentido para o carpe diem. Eu acordo quando acordar, durmo quando dormir e como quando tiver fome. Minha agenda é do mais cândido vazio. Não há mais horário para nada. É socialmente aceitável beber whisky às nove horas da manhã. Não tenho feito muito exercício, também. A única coisa que tenho exercitado ultimamente é meu ódio. Por exemplo, pelas pessoas que em breve morrerão de inanição mas com a bunda limpa, depois de terem saqueado todo papel higiênico do supermercado. Já tentei uma série de passatempos, dos mais sofisticados – xadrez com a Cã – até os mais triviais, como tentar engolir a própria língua e tentar não pensar em nada, mas continuar pensando em não pensar. Há, porém, algo positivo. Tenho aproveitado o tempo para provar whiskies que há tempos tinha em casa, mas jamais abrira. Talvez por falta de coragem. Talvez por aguardar um momento especial. Bem, não há momento mais especial do que agora, uma segunda-feira. São nove e trinta e dois da manhã, e todo mundo aqui em casa está dormindo. Para melhorar, […]

Teacher’s Highland Cream (Escocês)

Hanna Arendt uma vez escreveu que ” Das coisas tangíveis, as menos duráveis são as necessárias ao próprio processo da vida. O seu consumo mal sobrevive ao acto da sua produção “. Se não fosse por um hiato de poucas décadas – e talvez minhas dúvidas sobre as preferências alimentares da filosofa – poderia jurar que Hannah escrevera o excerto depois de pedir uma batata frita de delivery. Há poucos alimentos mais efêmeros do que a batata frita de delivery. Nem carne, nem massas, sofrem tanto. Nem mesmo o hambúrguer, companheiro inseparável da batata frita, apanha desse jeito. Vinte minutos em um espaço confinado, no baú do entregador, são suficientes para transformar a mais deliciosa e crocante fatia em um negócio frio, mole e murcho. Batatas fritas definitivamente não viajam bem. Outro produto que sempre ouvi que não era o mesmo depois da viagem – neste caso, uma transatlântica – é o whisky Teacher’s. Produzido na Escócia e transportado em tanques estanques, o Teacher’s era cortado (diluído) e engarrafado no Brasil. O processo tornava a logística mais barata, e permitia que o Teacher’s tivesse preço de combate por aqui sem sacrificar a qualidade. Porém, ouvira de mais de um bebedor […]

Robert Burns Single Malt – de ratos e flores

Se você acompanha o Cão há um tempo, já deve ter ouvido sobre Robert Burns. Ele foi o mais importante poeta escocês de todos os tempos, e um enorme expoente do movimento romântico. A envergadura de suas obras é enorme. Burns tratou de assuntos de enorme distinção. Da iniquidade social do século dezoito a sua paixão por embutidos de caprinos. Em uma de suas mais conhecidas obras, o poeta discorre por mais de três estrofes sobre o sabor inigualável de uma buchada de bode. Em outras duas, se martiriza por ter esmagado com seus pés uma margarida – a florzinha – e uma toca de ratos. O último inclusive, inspirou o escritor Sidney Sheldon ao batizar seu romance “The Best Laid Plans”. É capaz de ter também servido de inspiração para o James Blunt, mas vamos manter um nível administrável aqui. Mas não foi apenas nas artes que Robert Burns inspirou criações incríveis. Na área das bebidas, o poeta é uma influência importantíssima. Foi em sua homenagem que um dos mais importantes coquetéis de scotch whisky foi nomeado – o Bobby Burns. E também em sua referência que a Arran, destilaria localizada na ilha homônima na Escócia, batizou sua linha […]