Macallan Double Cask 12 Anos – Genética

A genética é uma coisa linda. É incrível que, apesar de parecer tão intangível, seja ela a responsável por quase tudo que fazemos. Como reagimos a estímulos, alguns de nossos gostos, nossas fobias naturais e nossa compleição física. Tudo isso, de certa forma, é influenciado pela genética. Veja o exemplo de meu querido filho, o Cãozinho. O Cãozinho é, fisicamente, bem parecido comigo. Mas o mais surpreendente mesmo são as semelhanças imateriais. Ele tem uma aptidão natural para o desastre. Algo que só pode ser explicado pela carga cromossômica que lhe transferi. Ele tropeça no próprio pé e derruba coisas que segurava do nada. Ele também é um voraz devorador de absolutamente qualquer coisa – onivoridade compartilhada com o pai glutão. Além disso, não é a criança mais atenta que eu conheço. Toda vez que o vejo parado, mirando fixo para um horizonte imaginário, sei exatamente o que está se passando por sua cabeça. Tudo. Tudo menos o que está à sua volta. E, num repente, ele – digo, nós – voltamos à realidade com aquele semblante meio bobo, como se tivéssemos sido teleportados para a realidade. Somos parecidos demais para não ser isso. Eu só sou trinta e dois anos […]

Tamnavulin Double Cask – Derradeiro

Ano novo. Uma das poucas festas que realmente aprecio. O otimismo exacerbado e a hipocrisia de fazer planos para um ano inteiro, mas mergulhar na inconsequência de uma noite. Minha imagem mental do ano novo sempre trazia fogos de artifício – normalmente refletidos em um mar de sorrateiras ondas – e um burburinho animado de pessoas de branco, tomando espumante. Mas aqui estou, no silêncio de meu quarto, na frente do computador, escrevendo. Não há fogos, nem champagne, nem barulho. Apenas um copo de single malt à meia luz e o tlec tlec produzido pelos meus dedos. Meu traje – no singular – neste momento não apenas seria inapropriado para participar de uma festa de ano novo como, provavelmente, seria impróprio para ir a qualquer lugar sem correr o risco de ser preso ou gerar um escândalo. E apesar disso tudo, sinto que estou justamente onde deveria. Dois mil e dezenove foi um ano agitado. Foram mais de quarenta e dois whiskies revistos, dezessete coquetéis apresentados e dez matérias sobre todo tipo de abobrinha relacionada a whisky. Mas meu trabalho não estaria completo por aqui sem um último post. A prova de um single malt de Speyside que corajosamente entrou […]

Dalmore Cigar Malt Reserve – Forma e Função

Esta matéria foi originalmente escrita para o website charutando.com.br . Porém, com o lançamento oficial do Dalmore Cigar Malt Reserve no Brasil, reproduzimos aqui o conteúdo. Ferdinand Porsche uma vez disse “Se analisarmos a função de um objeto, seu formato geralmente se tornará óbvio”. Em outras palavras, a concepção, o desenho de certo objeto, deve ser escrava de seu propósito. Ferdinand Porsche realmente entendia muito sobre o design de automóveis, mas, provavelmente, nunca viu um talher de peixe na vida. Vou começar pelo garfo. O garfo de peixe é simplesmente um garfo comum, sensivelmente menor, mais gordo e com um dente a menos. E não há nada de especial nele além disso. Nada em seu projeto torna a tarefa de levar o animal marinho à boca mais fácil. Por essa razão, o garfo de peixe simplesmente não deveria existir. Mas o pior não é ele. O pior mesmo é a faca de peixe. A faca de peixe é um dos objetos da cutelaria que mais me intriga. Porque, para falar a verdade, ela não é boa para nada. Mas ela é especialmente ruim para se usar no peixe. Aquela reentrância – cujo propósito deveria ser auxiliar na separação das espinhas […]

Blue Label Ghost & Rare Glenury Royal

Sol alto no limpo céu de verão de 1809. Uma multidão tão vasta quanto eclética se reunia sobre a grama de Newmarket Heath. Havia homens, mulheres e crianças de tão distintas classes sociais que aquele mais parecia um experimento babélico da estratificação social inglesa do século dezenove. Fazendeiros locais dividiam espaço com fidalgos e burgueses. Em comum, semblantes que ora demonstravam curiosidade, ora antecipação. Do meio do burburinho – tão comum nestas grandes aglomerações – se podia distinguir uma frase “mil milhas em mil horas, por mil guineas“. Aquela era a aposta de um homem e a razão de tamanha reunião. Seis semanas antes, o Capitão Robert Barclay havia apostado contra seu conhecido, James Wedderburn-Webster, que ele conseguiria correr mil milhas em mil horas por mil guineas. Um desafio que, mesmo para os padrões atuais, seria um tanto arrojado. Não apenas fisicamente, ainda que correr vinte e quatro milhas por dia, ao longo de seis semanas, já esteja no limiar do impossível. Mas financeiramente também. Mil guineas, atualmente, corresponderiam a aproximadamente quatro milhões de libras – ou vinte e quatro milhões de reais. Aquele realmente não era um desafio para um homem qualquer. Mas o Capitão Barclay estava longe de […]

Glenlivet Code – Spoiler

Cã para mim, na farmácia. Você não vai comprar os Cotonetes? Claro que vou, olha aqui. Mas isso não são Cotonetes. Olhei intrigado, talvez por não ter notado o cê maiúsculo próprio da marca na frase falada. Não são Cotonetes, são hastes flexíveis genéricas, será que são tão boas quanto? Expirei de insatisfação. Olha, são palitinhos com algodão na ponta, acho que meu ouvido não é muito discriminatório em relação a marca das coisas que eu enfio nele. Pode parecer uma discussão boba, mas não é. A marca de um produto influencia diretamente em como o percebemos. Recentemente a Nielsen, empresa especializada em estudar o comportamento de consumidores, fez uma descoberta interessantíssima. Seis em aproximadamente dez consumidores preferem comprar novos produtos de marcas familiares, simplesmente porque inspiram confiança. Faz sentido – na maioria das vezes, nós, humanos, buscamos segurança. Segurança essa, representada por algo que já nos é familiar. Nós já sabemos o que esperar. Mas não são apenas marcas. Quando conhecemos algo, criamos um conceito ao redor daquilo. Conceito que usamos de base de comparação para outras coisas da mesma natureza. Antes de experimentarmos o novo, acessamos essa biblioteca de conceitos e criamos um, bem, pré-conceito sobre aquilo. Por […]

Kilchoman Port Cask Matured (2018)

Uma vez, contei a vocês como me apaixonei à segunda vista pela incrível Bowmore. O que não contei é que, na mesma viagem, me desiludi com uma destilaria que antes nutria altas expectativas. A Kilchoman – na data de minha viagem, a menor, mais jovem e mais promissora destilaria da ilha de Islay, famosa por seus whiskies enfumaçados. Não que tenha detestado o lugar. Longe disso. Considerando seu tamanho e juventude, a Kilchoman se saía muito bem. Mas a comparação, talvez injusta de certo ponto de vista, com algumas de suas vizinhas, como Bruichladdich e Bowmore, à deixava em desvantagem. Não havia nada de errado com os maltes da Kilchoman. Mas, minha impressão, é que não havia nada de extraordinário também. Porém, foi apenas bons dois anos depois, em outra viagem e do outro lado do Oceano Atlântico, que minha impressão se dissipou. Durante uma visita ao incrível Flatiron Room de Nova Iorque, pude provar o Kilchoman Port Cask Matured – single malt da destilaria com 50% de graduação alcoólica, e finalizado em barris de vinho do porto. E, como vocês sabem, tenho uma certa obsessão por whiskies e vinhos do porto. O Kilchoman Port Cask Matured 2018 é o […]

Johnnie Walker A Song of Ice and Fire

Foram oito anos. Oito anos de conspirações, assassinatos, incesto, dragões, garrafinhas de água e café roubando a cena, gente que não sabia de nada, e gente que bebia e sabia das coisas. Setenta e três episódios de expectativa e teorias malucas. Mais de sessenta horas de antecipação para descobrir quem sentaria na cadeira mais desconfortável do universo. Eu nem preciso dizer do que estou falando. Você já deduziu – Game of Thrones. E – pule este parágrafo se você não quiser um spoiler – quando finalmente descobrimos, veio a decepção. Eu sei que nas temporadas anteriores a Daenarys lentamente flertava com a loucura. Mas ficar mais doida que a Caipora e transformar King’s Landing em um enorme churrasco não é exatamente uma sutil descensão à insanidade. E nem vou falar do fato – completamente ignorado e pouco aproveitado – de seu laço de sangue com Jon. Ou a irrelevante relevância do cavalo branco da Arya. Mas, apesar do desastroso final, a série, como um todo, foi muito boa. E inspirou uma miríade de objetos. Potes de biscoito, bonecos temáticos, jogos de cartas e muito mais. Mas, provavelmente, a parceria com Game of Thrones mais bem sucedida foi com a Diageo […]

Chivas Regal Mizunara – Tentáculos

O Japão. Uma nação tão bizarramente fascinante quanto fascinantemente bizarra. Por muitos séculos, especialmente por se tratar de um país insular, o Japão desenvolveu sua cultura com pouquíssima influência exterior. E daí surgiram uma porção de coisas mesmerizantes, como palácios, culinária, samurais e trens que chegam a trezentos quilômetros por hora. E apareceram também algumas coisas bem esquisitas. O Japão, aliás, tem uma tolerância incrível ao esquisito. Por exemplo, melancias quadradas. Lojas de abraço. Privadas que tocam música. Gente usando orelhas de gato – aliás, uma obsessão incompreensível por felinos, que talvez só seja superada em sua inexplicabilidade pela adorada pornografia com tentáculos. Se vocês duvidam de mim, basta googlar. Ou melhor, não façam isso não. Dados nunca morrem. Daqui duzentos anos, seu legado digital ainda estará manchado por pornografia com tentáculos (não clique aqui, por exemplo). E tem o whisky. Os japoneses também são obcecados por whisky. Tanto é que no começo do século vinte, dois malucos – Masataka Taketsuru e Shinjiro Torii – resolveram que produziriam whisky tão bom como o escocês por lá. E conseguiram. Atualmente, o whisky japonês é uma febre tão grande que a própria Escócia voltou seus olhos – e língua – para o […]

Royal Salute Snow Polo Edition – Sofisticação galopante

Corrida de pombos. Se você me perguntasse qual um dos esportes preferidos da família real inglesa, eu jamais diria corrida de pombos. Mas de acordo com a revista Vogue, a atividade é apreciada pela realeza desde 1886, quando o rei Leopoldo II da Bélgica os presenteou com algumas dessas (nem tão) galantes e velozes aves. O que me intriga é que tal trufe seja considerada um esporte. Afinal, o único que se esforça é o pombo. Mas a família real inglesa também pratica outros esportes, diremos assim, menos sedentários. Como, por exemplo, o Rugby, jogado pelos príncipes William e Harry; e o esqui na neve, favorito de Charles. Porém, talvez, o jogo mais essencialmente real – que mais encapsule a sofisticação dos fidalgos mais queridos do mundo – é o polo equestre. De novo, conforme a Vogue, Philip, Charles, William e Harry praticaram ou praticam o esporte. O Polo Equestre é tão querido que até o pequeno George já possui uma daquelas marretinhas engraçadas. Assim, é natural que uma marca de whiskies inspirada na realeza britânica como a Royal Salute, e que com ela compartilhe valores como sofisticação e elegância, preste homenagem a tão querido passatempo real. Daí que surgiu […]

Arran Machrie Moor – O Cão Defumado

Tendo nascido numa época que predatava o uso indiscriminado da internet, vi minha infância afligida por muitas dúvidas de grande relevância. Uma delas – que me atormentava toda vez que tomava café da manhã – era: quem, afinal, estava representado na caixa da farinha Quaker? E outra indagação ainda mais angustiante, mas da mesma natureza: quem era o simpático velhinho do luminoso do KFC? Se pudesse pesquisar essas coisas online, seria fácil. Saberia que o distinto senhor do frango frito é o Coronel Sanders, importante personagem da história norte-americana. E que o – tampouco jovem – homem da farinha de aveia Quaker é, na realidade, ninguém. Ele fora desenhado de acordo com a fé dos Quaker, para representar os valores de honestidade, integridade, pureza e força. Todo esse conhecimento estaria na ponta de meus dedos, bastasse uma rápida pesquisa pela Internet. Mas não. Tive que esperar a democratização da tecnologia para aplacar minha aflição indagatória. Recentemente me vi mais uma vez curioso sobre a embalagem de algo. Desta vez, um whisky. O Machrie Moor, expressão defumada da destilaria Arran, localizada na ilha homônima. É que o whisky possui um simpático cão ilustrado em seu rótulo. Uma imagem bonita, mas que […]