Live Free or Die – Amigo Secreto

Preciso confessar para vocês uma pequena vitória, que acabei de notar. Já estamos em dezembro, e, até agora, não fui convocado para nenhum amigo secreto. Isso é uma novidade para mim, porque, todo ano, alguém que eu não vi desde o ano anterior, me chama para um convescote desses. Além de ser um evento fastidioso, tem o presente. Eu sempre dou presente bom, e sempre ganho um vaso, ou um perfume. E eu raramente uso perfume, porque atrapalha na degustação de whisky. E aí a turma diz que eu sou difícil de agradar. Eu sou a pessoa mais fácil do mundo. É só dar qualquer coisa alcoólica. Esse negócio de muito whisky não existe. É sempre bom ter mais um. Ou algo de cozinha. Uma faca, por exemplo. Sempre tem utilidade para mais uma faca lá em casa, nem que seja esfaquear o miserável que me deu um vaso no ano anterior. Mas a verdade é que eu fiquei um pouquinho preocupado com essa ausência de amigo secreto. De certa forma, é libertador. Mas, por outro lado, pode significar que não tenho mais amigos. Ou que cheguei naquela idade em que todos nossos relacionamentos sociais arrefecem, e a gente não […]

Presbyterian – Nome de batismo

Coca-cola, Apple, Virgin. Há um monte de marcas com nomes curiosos. O refrigerante, por exemplo, tem uma explicação bem concreta. A receita original da Coca-Cola, inventada em 1885 pelo farmacêutico John Pemberton, de Atlanta, levava, literalmente, cocaína. Obviamente não o pó, mas um extrato da folha de coca, semelhante ao chá usado para o mal de altitude no Peru. A “cola” vinha da noz de kola, que contém cafeína. A Apple, por outro lado, é um caso mais misterioso. Há infinitas teorias que tentam explicar a obsessão de Steve Jobs por maçãs. Uma delas é quase a síntese da navalha de Ockham – ele simplesmente curtia o gosto. Outras são mais sofisticadas. O nome Apple vem antes de Atari na lista telefônica, e Jobs trabalhara para a Atari. Ou seria uma homenagem ao matemático Alan Turing, um dos pais da computação e que morrera ao comer uma maçã com cianeto. Ou, talvez, seja uma conjugação de tudo isso. Como normalmente é no mundo real. As coisas tem mais e uma explicação. Mas, até hoje, muita gente se pergunta sobre a origem da Apple e da maçãzinha mordida em seu logo. Quando você menciona o Presbyterian – o coquetel, claro – […]

Affinity Cocktail – Semelhança

Você já reparou como às vezes dois filmes praticamente idênticos estreiam quase ao mesmo tempo? Às vezes, isso é maravilhoso, porque os dois são ótimos. Tipo Failsafe e Doctor Strangelove. Outras vezes, um é melhor que o outro, como Braveheart – que é um clássico – e Rob Roy. Que não é realmente ruim. Mas podia focar menos no Liam Neeson satisfazendo sua esposa na grama, e mais na história da Escócia. E em outras situações, todos são ruins mesmo. Muito provavelmente porque a ideia era péssima já no começo, e a turma entrou numa espécie de delírio e esforço coletivo para tornar a vida dos cinéfilos um pouco mais miserável. Como com O Inferno de Dante com Volcano. Ou Striptease e Showgirls (desculpa, Verhoeven, você é ótimo!). Ah, e aqueles quatro – sim, gente, quatro – filmes sobre meteoros que ameaçam acertar a Terra. Num deles todo mundo morre, no outro o Bruce Willis explode o asteroide por causa da Liv Tyler e nos outros eu nem lembro o que acontece. Só vem, meteoro. O fenômeno, aliás, tem nome. Twin Movies, ou, Filmes Gêmeos. E não é coincidência, transmissão de pensamento ou uma espécie de reiki aplicado ao cinema. […]

Caledonia Whisky & Co – Abrimos um Bar!

Quando, há mais de cinco anos, começamos com o Cão Engarrafado, não sabíamos direito para onde iríamos. Sabíamos, por exemplo, que provaríamos muitos whiskies. Suspeitávamos que nossa paixão por drinks e cervejas também encontraria uma forma de participar deste espaço virtual. Mas jamais pensamos que chegaríamos ao ponto de, por exemplo, julgar um campeonato de coquetelaria, ou viajar para o outro lado do mundo apenas para provar, em primeira língua, dois novos e maravilhosos whiskies de certa marca de luxo. Alguns caminhos pareciam naturais. Incorporar receitas e abordar os universos tangentes àquele do whisky, por exemplo. Outros exigiram uma certa apneia. Desenvolver cursos e degustações, por exemplo, e sair do ambiente virtual para o palpável. Mas, de todos estes, de longe, o que mais exigiu fôlego, temeridade e quiçá uma boa quantidade de imprudência é este que vos apresento. Um bar totalmente voltado para a cultura do whisky em São Paulo. O Caledonia Whisky & Co. Se pudesse resumir, de uma forma bem simples, sobre a essência do Caledônia, seria esta: Ele é o Cão Engarrafado materializado. É um bar em que o vedete é o whisky – escocês, japonês, americano, irlandês ou de qualquer parte do mundo. Mas que […]

Scofflaw Cocktail – Neologismo

Neologismo. A criatividade humana aplicada à linguagem. O berço de palavras, para suprir necessidades ou lacunas. A prova de que a língua não é pétrea ou falecida, mas fluida e viva – em constante mudança. Se você acha que escrevi algo abobado, então dê uma googlada. Eles são onipresentes. O drone comprado no camelódromo. A foto photoshopada da blogueira. O computadorês, aliás, é campeão – deletar, resetar, escanear e (um preferido meu) boostar. Com dois “ós”, por favor, e sem me trollar, porque com um só, é outra coisa. Mas a coquetelaria não fica muito para trás. Coquetel mesmo, a palavra, já foi um neologismo. Ela deriva do inglês cocktail, que, por sua vez, pode ter vindo da corruptela de uma palavra creole – cockley. Ou de uma história bizarra envolvendo gengibre e o derrière (esse nao é um neologismo) de mamíferos de grande porte. Ninguém sabe ao certo. Outro neologismo na coquetelaria – mas em inglês – foi Scofflaw, que pouco tempo depois virou um drink. A palavra, que significa “zomba-lei” era usado para descrever justamente o público alvo do coquetel. Os homens que desafiavam a lei seca e bebiam. A palavra ganhou um concurso promovido por Delcevare King, […]

Uso de whisky na coquetelaria – Transgressão

Hoje irei direto ao ponto. Sem longas introduções ou comparações, mesmo porque haverá oportunidade para isto no meio deste texto. Há alguns dias lancei um post sobre um coquetel que sou apaixonado. O Rusty Compass. Ele é resultado do cruzamento entre um Blood and Sand e um Rusty Nail, e leva whisky turfado. Uma bela proporção de whisky insanamente turfado, capaz de superar o dulçor trazido pelo Drambuie. Depois de testar quase à exaustão e embriaguez, joguei a metafórica toalha e admiti – o melhor resultado levava Ardbeg. Um single malt de mais de trezentos reais. Era um drink tão delicioso quanto desesperadoramente caro. Resolvi lançá-lo no Cão com essa ressalva. Relativizei um pouco a história, e até mesmo recomendei misturar outro whisky, e reduzir o Drambuie. Já esperava receber alguma repreensão de algum leitor, mas uma delas me pegou desguarnecido. É um pecado misturar whisky, whisky é pra tomar puro, já é cheio de sabor, ainda mais single malt. Me surpreendi. Eu não posso preparar coquetéis com whisky? Deixe-me mudar o objeto para outro destilado. A vodka. Dave Wondrich uma vez disse que a ”A vodka é o peito de frango desossado e sem pele da coquetelaria – tudo tem […]

Paris-Manhattan – Desconexão

Todos nós temos problemas. E falar sobre eles quase sempre traz alívio. A maioria de nós escolhe o companheiro, um amigo próximo ou um parente. Estes são nossos confidentes. Na literatura também. E lá, o papel do confidente é duplo. Além de muitas vezes auxiliar o herói, o confidente é uma forma de revelar os pensamentos e aflições do protagonista, sem criar artificialidade. Existem infinitos exemplos, da mais clássica à mais prosaica literatura. Horácio é o confidente de Hamlet, na conhecida obra de Shakespeare. Razumikhin é o de  Raskolnikov, em Crime e Castigo. Dumbledore é mentor e confidente de Harry Potter, assim como Galdalf para Frodo. E não, o mestre dos magos não é confidente de ninguém, porque ele é o Vingador e uma muleta de roteiro bem safada. Até objetos inanimados podem ser confidentes. E não estou falando do pessoal que fica contando segredos no Faceboook pra polemizar. Me refiro ao Wilson, do Náufrago, por exemplo. Ou a Alice. Não a do país das maravilhas. Mas a protagonista de uma comédia romântica chamada Paris-Manhattan. No filme ela tem uma estranha obsessão por Woody Allen, e conta seus segredos para um poster do diretor em seu quarto. Aliás, o filme é uma […]

Loki Dry Gin e Hiddleston Gimlet – Cocktail Drops

Pai, porque é que pé de mesa é pé que nem o pé da gente? perguntou a Cãzinha. É que são homônimos perfeitos, respondi. E tem uns bem complicados, como fio de manga, que pode ser da sua blusa, ou aquele que fica no seu dente, da fruta – disse, referenciando mentalmente Caramuru. Senti que tinha ido um pouco longe demais. Mas ela deu uma risada e retrucou. É, quando você fala pé, eu acho que é o meu pé. Mesa nem tem pé que nem a gente.  Fiquei orgulhoso e tomei coragem pra responder. Tipo coração também, que pode ser o seu – e apontei para o tórax dela – ou o resultado mais nobre do processo de destilação. Sempre que me falam coração, eu penso na destilação”. O que seguiu foi um silêncio condenatório. É, talvez eu seja monomaníaco. Todo mundo pensa no centro do sistema circulatório. Outra palavra – ou melhor, nome – assim é Loki. Loki tem infinitos significados, da gíria à erudição. E é justamente por essa razão que a destilaria Destilab resolveu batizar seu gim premium, que acaba de ser lançado, com este nome. De acordo com Marcos Pipo, sócio da marca, a ideia era que […]

Cocktail à La Louisiane – Da Rivalidade

  Rivalidade. Este sentimento de inquieta e prolongada animosidade. Certas rivalidades podem ser apenas destruidoras. Outras, porém, se mostram bastante benéficas, e trazem avanços que jamais existiriam, não fosse a insaciável vontade de superar o rival. Um exemplo clássico é a Guerra das Correntes – protagonizada por Nikola Tesla e Thomas Edison. Esta (literalmente) eletrificante rivalidade começou no ano de 1884, quando um jovem Nikola Tesla passa a trabalhar no renomado laboratório de Thomas Edison. Que, caso você não saiba, foi o cara que inventou a corrente elétrica contínua (DC), a lâmpada incandescente e uma porrada de ógrafos e cópios, como o fonógrafo, o vitascópio e o mimeógrafo. Um ano depois apenas, Tesla se demitiu para começar sua própria empresa elétrica. Fundeado por um banqueiro chamado George Westinghouse, o inventor propôs que o sistema padrão para trazer luz à nação norte-americana deveria ser o de corrente alternada (AC), e não contínua, que era o vigente, e cuja patente era detida por Edison. Em 1903 – temeroso de perder os proventos de sua patente – Edison lançou uma campanha publicitária para promover a corrente contínua. Em uma de suas demonstrações, o inventor eletrocutou um elefante chamado Topsy utilizando corrente alternada, para mostrar […]

Tuaq Ice – Realidade Cristalina

Expectativa e realidade. Poucas coisas definem melhor o abismo entre os dois conceitos do que hambúrguer de um certo fast food. Porque na foto, atrás do balcão, ele é aquele negócio suculento, alto, mal passado, com queijo derretido em abundância. Mas, na realidade, ele é um bife pálido e fino, com uma mísera fatia de algum queijo cretino, e uma alface murcha que não cabe bem lá dentro, e faz o pão deslizar. Uma vez perguntei a um amigo fotógrafo como é que ele fazia para aquele hambúrguer todo torto ficar tão bonito na foto. E ele me confidenciou uma coisa. Que aquilo da foto não era um hambúrguer. E nem estou falando do paradoxo gerado pela Traição das Imagens, evidenciado na obra surrealista do cachimbo de Magritte. O que digo é que, nem na realidade daquela foto, aquilo era um hambúrguer. Segundo meu amigo, eles usavam massinha, espuma, ou qualquer coisa que parecesse carne, queijo e pão, só pra foto ficar bonita. Sempre pensei o mesmo sobre gelos cristalinos, naquelas fotos do Instagram. Podia apostar que era uma bola de vidro, ou acrílico. No bar, tudo bem, fazia sentido. Bastava cortar um tijolo gigante de gelo e descartar a […]