Sábado, sete da manhã. Meu filho se esgueira pela porta entreaberta do meu quarto, e chega bem pertinho da cama. Mas eu não sabia disso, porque eu estava inconsciente, dormindo. Ele me olha do fundo daquele olho branco, e sussurra bem baixinho “papai, papai“, enquanto cucuta meu braço com a delicadeza de uma pluma. Vagarosamente abro os olhos e dou um pulo de susto que quase me faz quicar no teto e voltar. Cruzes, rapaz, quase tenho uma parada cardiorespiratória achando que você é o capiroto!
“papai, hoje tem festa junina da escola, vamos?“. Proferida a frase, começo a me convencer que aquilo é, de fato, um pesadelo e ele é o capiroto. Ou que eu morri e fui pro inferno. Olho pra baixo, pra ver se meu corpo está inerte na cama. Mas tudo que eu vejo é o travesseiro. É verdade. Não só acordei de madrugada no sábado, como tenho que acompanhar a criança nessa quermesse do diabo. Mas nem sempre foi assim. Quando eu era criança, também amava festa junina.
Mas, pra mim, hoje, festa junina – especialmente da escola – siginifica pegar fila pra comer um hot-dog mais ou menos, carregar uma porção de prendas inúteis que vão abarrotar minha casa, e depois descobrir vinte reais em dinheirinho de mentira no bolso. Que raiva. E nem vem me falar que a festa junina do seu clube é genial porque tem comida daquela parrilla argentina caríssima e show do Falamansa. Isso aí não é a festa junina padrão.
A original tem que dar azia de tanto comer doce de leite e ter um sugar rush do quentão ou vinho quente. Tudo isso embalado pelo som de algum cantor de churrascaria. E não tem muito como fugir. Junho tem dessas. Mas tem coisa boa também. Como, por exemplo, o Mês da Turfa, na destilaria Union.
O “mês da turfa” na destilaria da Union é a época do ano em que destilam cevada maltada turfada, que mais tarde será destinada aos rótulos enfumaçados da destilaria. De acordo com Luciano Borsato, diretor da Union, o aroma de cevada turfada pode, inclusive, ser sentido durante as visitações à Union este período. E é para marcar essa data que a destilaria lançou mais um whisky de sua linha Autograph. O Union Autograph Extraturfado PX Finish
O “mês da turfa” – ou qualquer período, pra falar a verdade – é uma prática comum na Escócia. “Isso porque os aromas da turfa são tão marcantes que, além de espalhar-se pelos ambientes, impregnam os equipamentos, exigindo uma profunda limpeza antes de seguir a rotina de produção”, explica Borsato. É lógico, então, concentrar a destilação em um único período.
O Union Autograph Extraturfado PX Finish foi maturado por 8 anos em barris de carvalho americano de ex-bourbon, e depois finalizado por 18 meses em barris de vinho Pedro Ximenes. Apesar de ser o primeiro whisky brasileiro assim- turfa e PX – a combinação é bem conhecida no exterior. Há, inclusive, rótulos bem conhecidos, como o Laphroaig PX. O que, de forma alguma, tira o mérito da Union de produzir e equilibrar um malte com esse perfil.
Talvez pareça preciosismo, mas cabe aqui uma digressão. PX, ou Pedro Xímenez, Jimenez ou qualquer outra variação com “s”, “z”, “x” ou “j”, é um vinho de sobremesa, produzido com ao menos oitenta e cinco por cento das uvas homônimas. Essas uvas tem, naturalmente, bastante açúcar. Então, chega-se a uma graduação alcoólica alta ainda com açúcar residual, resultando num vinho adocicado e licoroso. É bem diferente do Oloroso, que é seco.
Sensorialmente, o Union Autograph Extraturfado PX Finish é vínico, com notas de frutas vermelhas, e incrivelmente apimentado. O aroma defumado está lá, mas bem amenizado se comparado ao Extraturfado de linha. O que não é nada surpreendente – barris de vinho tendem a reduzir a percepção da turfa, e a finalização do Autograph PX é longa até mesmo para padrões escoceses. Quem dirá, então, no Brasil, onde o clima é menos ameno.
Para aqueles que – como este Cão – adoram whiskies vínicos e defumados, o Union Autograph Extraturfado PX Finish é uma pedida certa. Aliás, bem que podiam ter uma dose na quermesse. Para um desses, não ligava de acordar cedo no sábado e ir na quermesse.
UNION AUTOGRAPH EXTRATURFADO PX FINISH
Tipo: Single Malt
Destilaria: Union – produzido na unidade de Veranópolis
País: Brasil
ABV: 46%
Notas de prova:
Aroma: adocicado, frutas vermelhas. Levemente enfumaçado.
Sabor: Frutado. Uvas passas. Final longo e apimentado, com fumaça e frutas vermelhas.