The Macallan Night On Earth – Tempestividade

Tento acessar o painel de controle do Cão Engarrafado, mas não me lembro a senha. Chuto uma, qualquer. Não foi. Tento outra, também sem sucesso. Na terceira, o navegador leva mais tempo para me dar uma negativa, e enche meu coração de esperança. Precisamos confirmar que você é humano – escolha todas as fotos que têm escadas. Entro em pânico. Sei lá se é um negócio de atenção, ou de pura tensão. Mas o desafio já me deixa desconcertado. Calma. Isso aí na foto é um navio. Tem escada dentro do navio não? Mesma coisa com aqueles semáforos com cronômetro. Prefiro a ignorância ao conhecimento. Saber quanto tempo eu tenho para cruzar a próxima rua me faz acelerar, não ser mais prudente. É por isso que os seres humanos não podem saber quando exatamente irão morrer – seriam divididos entre os que aceleram e os que permanecem inertes. Pensando aqui, semáforos inteligentes são uma ótima parábola existencialista. E tem o pior de todos, o token do banco. Quarenta e cinco segundos para escrever quatro dígitos não é o suficiente. Não sob a flagrante ameaça de ter o acesso à minha conta bloqueado. Sem pressão, faço cinquenta cliques em um minuto. Sem nem olhar para […]

Macallan Classic Cut – Elegância Violenta

Esta matéria foi originalmente publicada em 04 de Setembro de 2018. Em vista de sua chegada ao Brasil, a matéria foi atualizada em 23 de maio de 2024, com a nova edição. Fígado, favas e um bom chianti. Ou um grande amarone, se você preferir a versão literária à película. Literatura clássica, em especial a Divina Comédia de Dante. As Variações Goldberg de Johann Sebastian Bach. A belíssima cidade italiana de Florença. Parecem gostos de uma pessoa de sofisticação e cultura extraordinárias. E, na verdade, são mesmo. Incrivelmente, estes também são os interesses de um dos mais famosos vilões da ficção. O psiquiatra Hannibal Lecter, que aparece em obras como Dragão Vermelho e O Silêncio dos Inocentes. Lecter seria um cavalheiro quase perfeito, não fosse um pequeno detalhe. Ou melhor, um único gosto, que não tem nenhuma sofisticação. Hannibal gosta de comer gente. Gastronomicamente falando. Aliás, o sucesso de seu personagem, na opinião deste canídeo, está justamente aí. No equilíbrio entre a erudição e a mais gráfica e selvagem violência. Entre a polidez e a agressividade. Hannibal é Jekyll e Hyde, com o bônus do canibalismo. Em um mesmo personagem estão características aparentemente antagônicas, mas que se complementam lindamente. Se […]

The Macallan 25 – Bolo Real

Abro, com o cuidado de quem desarma uma bomba, a fatura de meu cartão de crédito. O fim do ano não ajudou. Faço uma apostinha mental: se for menor que certo valor, fico sem beber hoje. Confiro o número com perplexidade. Clonaram meu cartão – sussurro, severamente, para minha esposa. Não é isso não, é que eu passei o cabelo e a maquiagem da festa de fim de ano nele. Pisco de incredulidade. Mas a turma da maquiagem usou fulerenos endoédricos pra fazer o brilho e justificar esse preço? O que sucedeu foi uma discussão conjugal que culminou numa reflexão óbvia, mas necessária. Cada um tem uma percepção diferente de valor das coisas. Pra mim, é um absurdo pagar o equivalente às reservas de capital de Honduras em uma maquiagem. Mas beber este valor é justificável. E tem gente ainda mais louca. Teve um cara que pagou 7.500 (sete mil e quinhentas libras) por um pedaço de bolo de frutas do casamento da Kate com o Príncipe William. Isso foi em 2014, três anos depois do casamento. Aliás, bolos de frutas e whisky tem vários pontos de tangência. O perfil de sabor é um deles. Outra coisa, é que bolos […]

Old Pulteney Huddart – Mitologia

“Não abre essa janela, você está de cabelo molhado, pode entrar um golpe de ar e você ficar resfriado” – todos já ouvimos essa frase de alguém. Provavelmente, no seio de infância, de algum adulto mal-informado. “Cuidado para não engolir o chiclete, porque ele vai ficar grudado pra sempre no seu estômago” é outra. Que é mentira também. O chiclete sai por baixo em alguns dias, totalmente incólume – como o milho. São tantos exemplos que dá pra fazer um texto só deles. Boa parte envolve água, ou a praia. Não pode nadar por uma hora depois de comer qualquer coisa. Depende, se você não comer um boi inteiro e depois bancar o Michael Phelps, não tem muito perigo. Tomar banho quando está chovento forte é arriscado, porque você pode ser eletrocutado por um raio. Não vira o olho esquisito, porque se bater um vento, você fica assim pra sempre – e ainda pega um resfriado, considerando o primeiro mito. A gente acredita em um monte de besteira. São noções passadas de geração a geração, que, em boa parte, servem para não precisar explicar algo complicado. Ou só por estupidez, mesmo. Existem noções assim em todas as áreas de conhecimento, […]

Glenfiddich Grand Cru 23 – Ano Novo

Ah, chegou o ano novo. E com ele, aquelas tradicionais simpatias. Pular sete ondinhas, comer lentilha, assoprar canela, comer romã e guardar as sementinhas junto com a folha de louro na carteira. Colocar dinheiro no sapato e usar branco. Por mais inofensivo que possa parecer, devo, porém, declarar que não vou fazer nada disso. Do jeito que sou azarado, provavelmente espirraria com a canela, tropeçaria e cairia no mar. Arrotaria lentilha de susto, sujaria a roupa e o sapato. O dinheiro na sola ficaria ensopado, assim como minha carteira. Que depois de um tempo começaria a mofar, devido à folha de louro e sementes de romã úmidas, guardadas lá dentro. E meu ano seria péssimo. Por isso, decidi que não vou fazer simpatia nenhuma. Aliás, para não correr riscos, resolvi passar o ano novo bem longe do mar. Num hotel da cidade, vendo algum filme. E sem champagne também, porque a chance de eu acertar meu olho com a rolha é razoável. Ao invés disso, escolhi um single malt maturado em barricas que antes contiveram champagne. Ou quase isso. O Glenfiddich Grand Cru 23 anos. O Glenfiddich Grand Cru 23 chegou ao Brasil sem grandes explosões de rolhas, no final […]

Royal Salute 30 – The Keys to the Kingdom

Na matéria desta semana, vou recorrer, mais uma vez a Wittgenstein. “O homem é um animal ritualístico“. Ou de uma forma mais poética, a Clifford Geertz. O homem é um animal suspenso em uma teia de significados que ele mesmo teceu (…). A cultura é esta teia“. Somos mesmo, bichos que gostam de uma cerimônia. Do mais simples aperto de mão à mais opulenta coroação. Ritos são parte de nossa comunicação diária, e definem nossa cultura e comportamento. Em Edimburgo, acontece, anualmente, uma cerimônia que encapsula a essência da observação de Wittgenstein e Geertz. A Cerimônia das Chaves. É um ritual, em que o Lorde Reitor cede as chaves simbólicas da cidade ao monarca, que as devolve, apontando que ninguém melhor do que aquele cedente como guardião daquelas. É só isso. A Cerimônia das Chaves geralmente acontece em julho, e marca o início do período de férias da monarquia britânica na capital escocesa. Em outras palavras, é basicamente quando o proprietário do AirBnB que o rei vai ficar entrega as chaves da casa pra ele. Só que a casa é a Escócia inteira. É este breve rito que a Royal Salute, marca de blended whiskies de luxo escocesa, presta homenagem […]

Tamnavulin Sherry Cask – Canudinho

1937. Joseph Friedman, nascido em Ohio, observava sua filha Judith tentar tomar um milk shake no Varsity Sweet Shop, em São Francisco. Tentar, porque a mesa era alta, e Judith, baixinha, e na década de trinta, todos os canudos eram retos. Judith tentava subir na mesa, ajoelhando-se na cadeira. Mas, mesmo assim, não alcançava o zênite da bebida. Friedman – um perspicaz inventor – então, fez algo curioso. Pegou um parafuso, sabe-se lá de onde, colocou dentro do canudo, e o enrolou com fio dental, até ficar bem apertado. Depois, tirou o fio dental e removeu o parafuso. O resultado, além de um parafuso grudento, foi um canudo com pequenas ondulações, que podia ser dobrado sem interromper o fluxo. Judith finalmente podia aproveitar aquele nutritivo alimento, base de toda dieta infantil, sem dificuldades por sua estatura. Em 1939, Friedman fundou a “Flexible Straw Company” (a Cia. dos Canudos Flexíveis) e patenteou sua invenção. Apesar do enorme sucesso – e retorno financeiro – Joseph não é um inventor muito célebre. Atualmente, há canudos flexíveis por toda parte – até onde não são bem-vindos – mas poucos sabem de sua participação na história. Friedman é, de certa forma, como o Tamnavulin. Uma […]

Glenlivet Caribbean Reserve – O Amor

A Céline Dion tem uma música que diz que o amor pode mover montanhas. Com todo respeito, eu acho que a Céline errou. O amor é muito superestimado. Sem a menor sombra de dúvidas, o álcool supera qualquer forma de afeto como força-motriz da humanidade. Pegue, por exemplo, a história das ilhas caribenhas e do Reino Unido. Em 1655 a Grã-Bretanha capturou Jamaica, e começou um caso de amor (talvez ele mova montanhas) com o rum. A bebida já era produzida naquela ilha, que possuía abundância de cana-de-açúcar. A Marinha Real britânica não hesitou em substituir o aristocrático brandy francês pelo refrescante e tropical rum. Os marinheiros eram diariamente abençoados com doses de destilado, muitas vezes combinadas com limão. Os marinheiros viam no rum não apenas um antídoto contra o escorbuto, mas também uma fonte de alegria em suas vidas a bordo de navios desprovidos de luz, com comida escassa e o constante medo de criaturas marinhas lendárias. O rum tornou-se tão famoso que passou a ser usado como moeda de troca pelos corsários britânicos. Esses, um tanto menos comedidos do que os militares da respeitosa rainha, geralmente consumiam quantidades copiosas de bebida. Não era raro o caso de um […]

Seis novidades pro dia dos Pais

“Eu não tô bravo com você, só estou um pouco decepcionado” – foi a frase proferida pelo querido Cão pai, quando descobriu a razão do sumiço de algumas doses de seu whisky preferido. “Você deveria estar estudando pra faculdade“. Acenei com a cabeça. Continuou “seja responsável. Quando você tiver a minha idade, vai agradecer“. E completou com “eu só estou tentando te ensinar o caminho certo, não tô mandando nada“. Mal sabia ele que aquelas frases pareciam quase uma profecia. De certa forma, eu estava mesmo estudando. Não para a faculdade de direito, mas, sim, o assunto que me fascinava. Whisky. Assumo, porém, que naquela oportunidade, o ato de beber tinha pouco a ver com devoção acadêmica. E, de outro modo um tanto curioso, também agradeci ao ficar mais velho. Afinal, o primeiro contato com uma boa bebida tinha sido ali – de novo, despropositadamente. Talvez a paternidade seja isso. Aconselhar da melhor forma possível, aparar uma ou outra aresta pontuda, e esperar pelo melhor. E essa é a razão desta materia. Ajudar vocês, filhos e filhas, a escolher o melhor presente para a figura paterna. Separei aqui seis novidades no mercado brasileiro, para garantir a vanguarda da manguaça. Separados […]

Macallan Harmony Intense Arabica

Dois anônimos apaixonados por café sentam-se no balcão de uma cafeteria. O combustível da humanidade é o café – disse o primeiro, olhando para a frente. Eu sei. Não se toma café para acordar, mas se acorda para tomar café, respondeu o outro. Com um sorriso no rosto, concluiu o primeiro: o nível tecnológico da sociedade seria muito inferior àquele que é hoje, não existisse café. Ao que ambos brindaram com suas xícaras, e com as duas mãos, levaram o líquido quente e marrom à boca. A história acima é totalmente fictícia. Mas, certamente, ocorre todo dia com milhares de admiradores de café. No panteão das bebidas, o café está quase par a par com o whisky, em nível de veneração. Prova disso são as centenas de citações e frases espirituosas sobre café. Ainda que, suspeito, a cafeína ajude nessa parte. É possível escrever uma matéria inteira utilizando apenas lugares comuns sobre café. Café é, também, um combustível para a arte. O cantor Henry Rollings disse, certa vez, que o melhor acompanhamento para uma xícara de café é outra xícara de café. Este Cão e a The Macallan, porém, discordam. A melhor combinação é com o novo The Macallan Harmony […]