Esses dias andei revendo algumas das últimas provas do Cão. Sei lá, uma vontade de recordar o que já tinha bebido, misturada com o mais profundo e cristalino tédio de domingo à tarde. E eu notei que, apesar do Cão ser um blog sobre whisky, quase metade dos posts fazem referência a outras bebidas. Ou, ainda mais, são sobre elas. Há uma dezena de provas de cervejas (todas elas, maturadas em barricas), uma de sidra e até mesmo uma de gim. Isso sem contar as receitas de coquetéis e pratos.
E acho que a ideia por aqui é mais ou menos essa. Ou tornou-se essa, ao longo deste par de anos. Orbitar o mundo do whisky, mas não sem sofrer certa influência gravitacional daqueles contíguos, como o da cachaça, cerveja e coquetelaria. Afinal, o whisky faz parte de um sistema muito maior, dele recebe e nele exerce influência.
Com esse espírito, provei na semana passada a Jupiter Talismã Sebastiana, uma Imperial IPA maturada em barricas de carvalho que antes contiveram a cachaça Sebastiana, do Alambique Santa Rufina. E fiquei muito surpreso. Minha impressão é que seria uma cerveja relativamente azeda, com muito dulçor e pouco equilíbrio. Mas ao prová-la, notei que era bem o contrário. A Talismã Sebastiana é uma cerveja muito equilibrada, onde o sabor emprestado da barrica não se sobrepõe ao amargor do lúpulo, e que não possui qualquer traço de acidez.
Na verdade, a história da cerveja e da barrica é um pouco mais detalhada que essa que acabei de contar. Ela começa com um barril de carvalho, que maturou Sebastiana por um ano e meio. Depois, foi esvaziado e preenchido com a Dez Lúpulos, outra belíssima cerveja da Jupiter. E essa Dez Lúpulos foi misturada com um lote de uma Jupiter Imperial IPA, uma edição limitada da cervejaria.
Tanto David Michelsohn, criador da Jupiter, quanto Beto Mattos, master blender e proprietário da Cachaça Sebastiana deixam claro que notam essa força gravitacional entre as bebidas. De acordo com Beto: “unir esses mundos que caminham em paralelo (mas com extrema similaridade), é o mais interessante. Temos atualmente uma explosão dos mercados de cervejas artesanais e de cachaça de alambique no Brasil e no mundo. Essa explosão mostra que o consumidor, principalmente o brasileiro, aceitou que nós podemos sim, ter produtos de extrema qualidade, “Made in Brazil”
David completa “Para a Júpiter é uma oportunidade incrível de desenvolver uma cerveja maturada em barril com quem realmente sabe do assunto. Ele [Beto] entende muito bem o trabalho da madeira na bebida e o resultado fica muito claro no sabor e aroma da cerveja.”
A Jupiter Talismã Sebastiana estará disponível como chope tanto no EAP – Empório Alto dos Pinheiros quanto na Choperia São Paulo, da qual David Michelsohn é sócio. Foram produzidos poucos barris da cerveja, então, caso você se interesse, é melhor correr. Além deles, chegarão ao mercado apenas duas mil garrafas.
Se você é apaixonado por whisky, mas não por isso deixa de admirar uma bela cerveja ou uma excelente cachaça, não deixe de provar a Jupiter Talismã Sebastiana. Com o perdão da piadinha cretina – é algo de outro mundo.
JUPITER TALISMÃ SEBASTIANA
Cervejaria: Jupiter
País: Brasil
Estilo: Imperial IPA
ABV: 9%
Notas de Prova:
Aroma: herbal, adocicado, com um pouco de açucar refinado e banuilha.
Sabor: Encorpada, carbonatação média. Herbal, amargor seco. Final progressivamente mais adocicado, com bastante baunilha. A influência da cachaça fica clara, mas não se sobrepõe ao aroma emprestado pelos lúpulos.
Caro mestre, parabéns pelo dom de interligar assuntos tão diversos. Realmente impressionante! Quase tão impressionante quanto seu conhecimento sobre whisky (álcool em geral).
Que nunca percamos a capacidade de querer conhecer o novo, ainda que já tenhamos nossas preferências definidas.
Grande abraço!
Obrigado, mestre! Espero que os amantes de whisky entendam esses “pretextos”