Cutty Sark – “Reentrada” – 2021

Em 15 de maio de 1963, a NASA lançava sua última missão tripulada do Projeto Mercury. O objetivo da missão era, principalmente, avaliar os efeitos no corpo humano de uma estadia mais prolongada no espaço, bem como realizar alguns experimentos. A missão foi realizada pelo astronauta Gordon Cooper. Durante os vinte e um dias que ficou em órbita, Cooper fez coisas bem legais, tipo soltar um minisatélite no infinito, medir níveis de radiação no espaço e, bom, dormir. Ele foi a primeira pessoa a dormir em órbita. Gordon também foi agraciado com uma vista estonteante a partir de sua espaçonave. Ele fez diversas fotos, e conseguiu ver detalhes impressionantes de nosso planeta, como estradas, rios e pequenos povoados. Descreveu que conseguia até mesmo ver a fumaça saindo das chaminés das casas no Tibet – devido à atmosfera rarefeita – e julgar para que lado o vento soprava sobre a cordilheira. Mas nem tudo foi poesia durante a jornada de Cooper. Durante sua vigésima primeira volta ao redor da Terra, o inversor de energia da nave entrou em curto circuito e apagou todas as leituras de altitude e velocidade – algo que atrapalharia bastante o trabalho de retornar à salvo para […]

Dewar’s 15 anos – Do Instinto

Sabe aquele momento que você tem quase certeza que vai morrer, mas luta vigorosamente pela vida? Aqueles derradeiros cinco segundos – quando a luta pela sobrevivência é mais vigorosa? O momento do tudo ou nada? Bem, descobri aos doze anos e pouco, durante um passeio a cavalo na chácara de um amigo, que não tenho nada disso. Vou contar, brevemente, para vocês. Passeávamos tranquilamente por uma estrada de terra quando meu cavalo, um belo pangaré branco que andava meio de lado, se assustou com algo. Jamais saberei o que foi. Mas, tão somente, que o animal tracionou as quatro pernas e, num pulo, foi direto da marcha ao galope. Assustado, puxei a rédea – inutilmente – e fiz força nos pés, tentando me manter reto na sela. O que sucedeu não levou mais do que cinco segundos. Ouvi um barulho metálico e perdi o equilíbrio. Me virei para trás – o estribo desprendera, e rodopiava e quicava no chão de areia batida como um ginasta olímpico. Olhei reto, à frente, onde a estrada descrevia um cotovelo fechado. O cavalo não fazia a menor menção de reduzir a velocidade, literalmente, galopante. E, naquele momento, naquele exato momento, um par de segundos […]

Blue Label Ghost & Rare Glenury Royal

Sol alto no limpo céu de verão de 1809. Uma multidão tão vasta quanto eclética se reunia sobre a grama de Newmarket Heath. Havia homens, mulheres e crianças de tão distintas classes sociais que aquele mais parecia um experimento babélico da estratificação social inglesa do século dezenove. Fazendeiros locais dividiam espaço com fidalgos e burgueses. Em comum, semblantes que ora demonstravam curiosidade, ora antecipação. Do meio do burburinho – tão comum nestas grandes aglomerações – se podia distinguir uma frase “mil milhas em mil horas, por mil guineas“. Aquela era a aposta de um homem e a razão de tamanha reunião. Seis semanas antes, o Capitão Robert Barclay havia apostado contra seu conhecido, James Wedderburn-Webster, que ele conseguiria correr mil milhas em mil horas por mil guineas. Um desafio que, mesmo para os padrões atuais, seria um tanto arrojado. Não apenas fisicamente, ainda que correr vinte e quatro milhas por dia, ao longo de seis semanas, já esteja no limiar do impossível. Mas financeiramente também. Mil guineas, atualmente, corresponderiam a aproximadamente quatro milhões de libras – ou vinte e quatro milhões de reais. Aquele realmente não era um desafio para um homem qualquer. Mas o Capitão Barclay estava longe de […]

Johnnie Walker Swing – Doce Balanço

Calça jeans. Depois de quase um século e meio, a peça de vestuário que começou como indumentária de cowboys e mineradores no velho oeste passou a ser usada por praticamente todo mundo. Homens, mulheres, crianças. Porém, poucos conhecem sua real origem. A calça jeans foi criada por Jacob Davis, um minerador que participou da febre do ouro nos Estados Unidos, no século dezenove. Sua matéria prima é o denim, material outrora utilizado para revestir as tendas dos trabahadores das minas, inicialmente produzido na cidade de Genova, na Itália. Daí o nome Jeans – Genoa (Genova), com sotaque americano. Jacob comprava o material de um tal de Levi-Strauss, que, mais tarde, se juntou a ele para fundar a conhecia Levi Strauss & Co. Atualmente, a calça jeans está por toda parte, numa infinidade de desenhos diferentes. Mas há uma coisa em seu design que resistiu à passagem do tempo, e permanece desde sua concepção. Um pequeno bolso, dentro de um dos bolsos da frente. Esse bolsinho sempre me intrigou, de forma que, certo dia, resolvi pesquisar para que ele servia. Imaginem o tamanho de minha surpresa quando descobri que aquele pequeno continente teria sido projetado, inicialmente, para o relógio de bolso. […]

Black & White – Lenda Canina

Lacoste, Puma, Linux, Ferrari, Dodge, Nestlé, Jaguar, Lamborghini, Red Bull, MGM e Bacardi. Poderia continuar esta lista por mais cinquenta nomes sem muito esforço. São as marcas que utilizam animais em seus logos, ou em seus materiais publicitários. Mesmo no mundo do whisky, isso é bem comum. White Horse, Glenfiddich, Famous Grouse, Wild Turkey e Murray McDavid são exemplos. Mas poucas dessas empresas possuem embaixadores peludos, empenados ou escamados tão famosos quanto uma certa Black & White, e seus dois terriers. A história por trás do uso dos cãezinhos é interessante. Diz-se que James Buchanan, fundador da Black & White, teria visitado uma exposição de cães e lá tivera a ideia de utilizar um West Highland Terrier e um Scottish Terrier como seus mascotes. As duas raças, obviamente, originárias da Escócia. O nome Black & White, porém, nada tem a ver com os cachorros, e pre-data a época em que eram usados na linguagem visual da marca. O Black & White nasceu na verdade como Buchanan’s Blend, um whisky que caiu no gosto da House of Commons do parlamento inglês. James, então, aproveitando o marketing gratuito, o rebatizou de House of Commons Finest Old Highland whisky, e mudou sua embalagem […]

Ballantine’s 12 anos – Prioridades

Se há um mês do ano que demonstra como nossas prioridades mudam ao longo da vida, este mês é dezembro. Porque quando eu era criança, eu adorava dezembro. Naquela época, tudo em dezembro terminava num presente, em sono ou em má digestão. E minhas maiores preocupações eram o que eu ia pedir de natal pros meus pais, que dia eu entraria em férias da escola e como é que eu conseguiria comer metade de tudo que estaria na mesa da ceia da minha vó, sem passar mal e sem as pessoas me recriminarem. Hoje, porém, as coisas mudaram um pouco. Os presentes não são mais tão frequentes, ainda que eu continue comendo absurdamente e me arrependendo depois. Mas há algo que eu passei a receber com abundância em dezembro. Algo que eu nunca recebera, sequer uma vez quando eu era criança. E essa coisa não é whisky – mesmo que eu também não tenha ganhado nenhuma bebida alcoólica na aurora de minha vida, o que é um ponto positivo bem grande para a vida adulta. São os boletos. Em dezembro, na vida adulta, tudo termina em boleto. Esse ano cheguei até o absurdo de receber o boleto de um clube de […]

White Walker by Johnnie Walker – Whisky Geeking

Sempre fui um pouco nerd. Um pouco não. Acho que bastante. Durante a adolescência, jogava Dungeons & Dragons – e, como vocês sabem, quem joga Dungeons & Dragons não faz muita coisa além de jogar Dungeons & Dragons. Era apaixonado por Senhor dos Anéis e achava um absurdo terem aumentado a participação da Arwen no filme. E também gostava de Lovecraft, a ponto de ter um Ctulhuizinho de miniatura. Mas preciso confessar um negócio. Nunca assisti Game of Thrones. É, eu sei, a série é incrível e está cheia de criaturas assustadoras, como dragões, monstros de gelo e pré adolescentes chatos. Gente bebendo o tempo todo e gente que ainda não sabe nada. E quando você menos espera, eles vão lá e matam todo mundo que tem algum relacionamento com o Sean Bean, inclusive o Sean Bean. Mas vamos parar com isso antes que eu dê algum spoiler. Não é desinteresse. É uma certa inércia. E um costume meio esquisito da minha parte. Prefiro ver séries que já acabaram. Quando a última temporada de Breaking Bad foi anunciada, por exemplo, corri como um louco para ver todas as anteriores. Aliás, talvez, agora, comece minha maratona de Game of Thrones. Mesmo porque […]

Ballantine’s Finest – Procrastinação

Se você é um novo leitor do Cão Engarrafado, ou chegou aqui pela primeira vez por meio de alguma ferramenta de busca, talvez não saiba. Então, vou contar novamente. Sou advogado. Trabalhei por uma boa década no mundo corporativo. Minha especialidade era mercado de capitais. Uma área que proporciona oportunidades incríveis para seus profissionais. Como, por exemplo, assistir o  crepúsculo e aurora pela janela de sua sala, enquanto revê duzentas páginas de um prospecto de uma emissão primária de ações de alguma companhia de maçãs. Quase tudo em mercado de capitais demorava bastante, mas deveria ser feito muito rapidamente. O que levava a intermináveis jornadas de trabalho, noites em claro e todo tipo de delivery. Mas duas das atividades mais infernais e intermináveis eram conhecidas como Back-up e Circle-up. Para evitar que você, querido leitor, morra de tédio, explicarei apenas brevemente. Back-up e Circle-up eram normalmente realizados simultaneamente, por um único advogado, e consistiam em circular, manualmente, todas as informações que deveriam mais tarde ser confirmadas, e numerá-las. De um a mil novecentos e alguma coisa, num documento de quase trezentas páginas. Duas vezes, uma pra cada. Quando abandonei o mercado de capitais, voltei a contemplar o prazer de uma noite […]

Globalização – Buchanan’s 18 anos

“Se você quiser mudar o tango, melhor aprender a lutar boxe, ou alguma arte marcial“. A frase é de Astor Piazzolla, um dos criadores do Tango Nuevo – uma espécie de coquetel de tango com elementos de outros gêneros, como jazz e música clássica.  No começo, o Tango Nuevo – que inclusive desconstruía também a forma de dançar tango – sofreu enorme rejeição pelos argentinos, mas foi muito bem recebido no resto do mundo. Costumo não escolher lados por aqui. Mas dessa vez, tenho que assumir meu partidarismo por Piazzolla. Com a fusão de elementos internacionais ao tango, ele não apenas revolucionou o gênero, como o elevou à fama internacional. O que fez com que mesmo compositores mais tradicionais, como Gardel e Varela, também fossem reconhecidos fora da pátria de nossos hermanos. Poderia dizer, sem muito exagero, que Astor Piazzolla transformou o tango em um gênero musical globalizado. Mas às vezes, globalizado até demais. Como, por exemplo, Años de Soledad. Ou Years of Solitude, como preferir. A música foi gravada em 1974 e contou com a participação do saxofonista americano Gerry Mulligan. Mas não me refiro a essa versão original, mas à rebatizada de Années de Solitude. Que é cantada. […]

Sobrevivência – Chivas Regal 12 anos

Admiro pessoas determinadas a sobreviver. Esses, que atravessam quaisquer revezes, graças à sua inabalável resiliência. E nem estou falando de profissionais, como o Bear Grylls. Porque claro, tudo que você espera do Bear Grylls é mesmo que ele coma uma lesma nojenta, durma dentro de um camelo morto, beba xixi e todas essas coisas asquerosas, afinal essa é a profissão dele. Ninguém assiste o programa dele pra vê-lo tomando um vin de table ao lado da Tour Eiffel, né? Me refiro aos amadores mesmo. Aqueles que de seus débeis e muitas vezes mutilados corpos conseguiram extrair uma força sobre-humana apenas para passar mais alguns anos nesse nosso medíocre mundo. Como, por exemplo, a Juliane Koepcke. A Juliane Koepcke foi a única sobrevivente do vôo 508 da LANSA. O avião dela foi atingido por um raio e se desintegrou no meio do ar. A Juliane, presa em sua cadeira, foi lançada de uma altura de três mil metros sobre a floresta peruana. Incrivelmente, Juliane sobreviveu à queda, mas com uma das clavículas quebradas e gravemente ferida. Praticamente rastejando, e alimentando-se de um saquinho de balinhas – a única comida que tinha – Juliane encontrou um riacho. Seu braço estava infeccionado e […]