The Macallan Sherry Oak 18 anos – Oportunidade

Há um aforismo de Seneca que diz que a sorte é onde a oportunidade encontra a preparação. Por ser o pai do estoicismo, e por estar convenientemente separado por dois milênios e poucos de história, posso quase certamente afirmar que Seneca não proferiu a máxima durante uma palestra de coaching. Aliás, coaches que proventura leiam este post, por favor, sejam mais estoicos e resistam à tentação de empregar Seneca em suas apresentações. Mas, enfim, mal comecei e já estou a divagar.

De volta, tenho minhas dúvidas sobre a irrefutabilidade do aforismo. E longe de mim falar de meritocracia, especialmente nessa prova. Mas conheço uma pá de gente, cujos nomes não vem ao caso, que está viva e bem só pela mais cândida sorte. Por outro lado, e confirmando Seneca, o Premio Darwin e o padre do balão estão aí (estou um pouco confuso sobre que tempo verbal usar) pra mostrar que às vezes um pouco de capacitação não faz mal a ninguém.

Preparação.

De uma forma pouco estoica, devo sucumbir à tentação de “apetrechar” a máxima do filósofo e transmutar um pouco seu sentido. Muitas vezes, reconhecer que teve sorte exige preparação e oportunidade. Foi meu caso, por exemplo, quando provei pela primeira vez o The Macallan 18 anos sherry oak. Tinha pouco mais de dezoito anos, e nenhuma preparação. Fora oferecido uma dose pelo pai de um amigo. Bebi sem muita cerimônia, sob um olhar semelhante àquele de um clérigo que condenava um herege, vindo do progenitor de meu coleguinha. Legal, Macallan 18 anos. Não tinha muita ideia do que estivera em meu copo.

Naquela oportunidade, eu não sabia. Mas levaria bons cinco anos para beber aquele whisky pela segunda vez – em uma degustação na antiga destilaria da The Macallan – e mais uma década para prová-lo pela terceira vez. Dessa vez, em terras brasileiras, no lançamento do rótulo por aqui. Depois de quinze anos, a expectativa era grande. Especialmente porque, dessa vez, eu sabia exatamente o que encontraria pela frente, e almejava saber se minha memória sensorial correspondia àquela maravilha. Um dos rótulos mais famosos de uma das mais famosas destilarias da Escócia – e um whisky que – inependente de qualquer esforço estoico – já começava a emocionar só pela tarjeta de preço.

Primeiro, vamos aos fatos. O The Macallan Sherry Oak 18 anos é maturado exclusivamente em barricas de carvalho europeu que antes contiveram vinho jerez espanhol. A idade estampada no rótulo indica que o componente mais jovem passou dezoito anos em ditas barricas. Sem prejuízo, entretanto, de whiskies bem mais maturados na mistura. Foi este perfil – o de carvalho europeu de ex-jerez – que contribuiu imensamente para a fama da The Macallan durante a década de oitenta. Seus rótulos mais reconhecidos e cobiçados utilizam, justamente, tais barricas. Dentre eles está o Sherry Oak 18 anos.

Aqui cabe um aviso e um respiro. Se você for um whisky geek, siga pelos próximos três parágrafos. Entretanto, se você só quiser saber se deve ou não dispender o equivalente ao PIB de uma pequena república européia neste single malt, te vejo daqui três paralelepípedos de palavras.

UMA DIGRESSÃO PARA OS WHISKY GEEKS

A The Macallan utiliza, de uma forma um pouquinho confusa, a palavra “seasoned” em seus rótulos – traduzido para cá como temperado – para explicar as barricas da linha Sherry Oak. “Maturados em barris temperados de vinho jerez”, dizem os rótulos. Essa é uma situação irônica. Uma destilaria que guarda tantos segredos, ao tentar esclarecer algo para o consumidor, causou ainda mais confusão. A confusão foi ainda maior porque a frase foi incluída após um rebranding da marca. O que poderia indicar que havia também uma guinada de processo. Mas nada disso aconteceu. Ao menos, não no mesmo momento do emprego da expressão.

A introdução da expressão “seasoned” serviu apenas para apontar algo que a The Macallan já fazia. E demonstra seu cuidado especial com as suas barricas. A destilaria encomenda de tanoarias espanholas, como a Tevasa, Vasyma e Hudosa, barris de carvalho europeu temperados com um jerez produzido sob medida para a The Macallan. Em outras palavras – o controle sobre o processo passa pela padronização do jerez também. Aquele jerez não é produzido para ser comercializado. Mas, tão somente, para trazer sabor às barricas que mais tarde serão preenchidas com o new-make da The Macallan.

Vasyma: barris de jerez para a The Macallan

O tempo, aqui, também é chave. Há um equilíbrio fino entre a potência do barril e a influência de jerez. O prazo que o barril deve guardar o vinho espanhol deve ser somente suficiente para que este entre em seus poros, e influencie no sabor do whisky. Mas, não grande o suficiente para roubar a potência da madeira. É um tradeoff, numa progressão bem ardilosa. Mais tempo pode, discutivelmente e até certo limite, trazer mais influência do indrink, mas menos da madeira. Seja como for, a própria The Macallan diz que o prazo de cura – que aliás, é um termo bem melhor do que tempero – é de um a dois anos.

PERFIL SENSORIAL E MAIS

O The Macallan Sherry Oak 18 anos traz notas de frutas secas, pimenta do reino, gengibre, canela, cravo e um certo floral bem sutil. O final é longo e seco. Essa é a parte mais interessante. Em comparação com o The Macallan Rare Cask, o Sherry Oak 18 anos é mais elegante, menos doce e mais apimentado. Mas, é também, mais sisudo. Se me permitem mais uma digressão para comparação. Se ambos fossem carros, provavelmente, seriam o mesmo modelo de carro esportivo. Mas o Rare Cask seria vermelho com faixas brancas. O Sherry Oak 18, todo preto.

O The Macallan Sherry Oak 18 anos é uma edição limitada anual da The Macallan. Cada whisky aponta, em seu rótulo, o ano de seu engarrafamento. O whisky provado para este post foi o do ano de 2021, que acaba de desembarcar no Brasil oficialmente. A introdução do ano no rótulo aponta duas coisas: primeiro, que pode haver pequenas variações de lotes, dependendo do ano. Em segundo, que este é um produto que pode apelar bastante para um colecionador.

Alambiques da The Macallan

Agora, preparem-se para talvez a parte que mais se afasta do estoicismo desta prova. O preço. No Brasil, uma garrafa de The Macallan Sherry Oak 18 anos custa, aproximadamente, sete mil reais. Nem Sêneca, com seu cinismo, poderia ficar indifrente a um preço destes. É uma quantidade de dinheiro que ultrapassa a barreira do valor relativo, e passa para a categoria do valor absoluto. Por conta disso, não vejo como poderia responder à dicotomia do “vale a pena”. Não seria justo – isso dependerá exclusivamente do comprador.

Mas – e colocando o pensador de lado – caso você tenha sorte, ou a oportunidade, prove o The Macallan 18 anos. Além de ser um single malt irretocável, é um dos mais clássicos, cobiçados e inspiradores single malts da Escócia. É inevitável reconhecer que, ter um single malt deste calibre à venda em nosso mercado é, irrefutavelmente, uma vitória e uma emoção. Na frente de um The Macallan 18 anos, não há estoicismo que resista.

THE MACALLAN 18 ANOS SHERRY OAK

Tipo: Single Malt com idade (18 anos)

Destilaria: The Macallan

Região: Speyside

ABV: 43%

Notas de prova:

Aroma: uvas passas, especiarias, gengibre.

Sabor: Frutas secas, ameixas secas, uvas passas. Pimenta do reino, cravo, canela. Final longo, apimentado, com gengibre e pimenta.

5 thoughts on “The Macallan Sherry Oak 18 anos – Oportunidade

  1. Muito bacana, mas certamente não é para o meu bico! RS
    Fiquei com uma dúvida, o que fazem com o Jerez produzido para curar as barricas? Descartam?

  2. Excelente texto, tenho o 18 anos Fine Oak dentre outros tantos desta que é minha destilaria preferida junto a higland park e Edradour mas estou ansioso para provar este Sherry maior de idade

    1. Pericles, existe uma tecnica de padronização de barricas. Mas não a ponto dos japoneses utilizarem vinho produzido para eles para tanto.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *