Compass Box Three Year Old Deluxe

Janeiro é o mês de meu aniversário. Fiz trinta e três, com fígado de sessenta e muitos. E percebi algo. Meus trinta últimos anos não foram, nem de perto, tão importantes quanto meus três primeiros. Vejo isso pela minha filha,  a Cãzinha. A Cãzinha tem três anos, com uma habilidade social que não consegui em vinte. Não sei se é porque ela é uma criatura incrivelmente sociável ou se isso se a minha total inépcia social. Mas ela é capaz de conversar com qualquer pessoa, desafiar, mentir, fazer conversinha de elevador e pedir pão de queijo na lanchonete de uma forma absolutamente encantadora. Tudo isso ela aprendeu em três anos. É claro que há algumas coisas que ainda são complicadas. A Cãzinha tem uma certa dificuldade em entender assuntos abstratos e não é muito convincente para argumentos elaborados. Como, por exemplo, quando ela tenta me convencer que pode comer brigadeiro duas vezes por dia, não consegue e fica agressiva. Mas observando sua evolução, chego a uma conclusão quiçá otimista. Que somos quem somos desde os três. O resto é só sofisticação. Aparar as arestas mais pontudas e aprender uma porrada de coisas que jamais usaremos, como íons, nêutrons, animais endotermos, […]

Drink do Cão – Whiskey Sour

Hoje, a caminho do trabalho, meu carro me disse que precisava de revisão. O módulo do controle eletrônico de amortecimento – ou algo assim – não estava funcionando. Chegando lá, liguei para a oficina enquanto preprava um café na nova máquina. Mas me confundi. A secretária atendeu bem na hora em que eu ajustava a temperatura e escolhia se meu expresso seria longo, normal ou ristretto. Acabei fazendo um chafé escaldante. Marquei a revisão do carro às pressas, e, irritado, fui à cafeteria. Pedi um café e um brigadeiro. A caixa então perguntou qual brigadeiro eu queria. Sei lá, brigadeiro não é tudo igual, retruquei. Não, agora temos uma seleção de mais de dez diferentes, tem, por exemplo, paçoca, chocolate belga, pistache, doce de leite, café. Sabe, não sou um nostálgico da desafetação. Mas naquele dia queria apenas um pouco de simplicidade. Um café espresso, um brigadeiro de brigadeiro e um carro que não sabe falar e que não tira peças com nomes esquisitos da sua metafórica cartola eletrônica. Mas eu sei que esse é um movimento natural das coisas em nossa sociedade. Elas começam simples, mas à medida que o tempo passa, vão se sofisticando. É uma característica que não […]

Protagonista – Aberfeldy 12 anos

Tem uns filmes que sempre paro para assistir, quando os encontro passando na televisão. É como se meu cérebro entrasse em modo avião, e confortavelmente se rendesse àquela sensação de familiaridade. Não há nada que eu possa fazer. Não importa quantas vezes já vi cada um, o mundo externo pode esperar. Alguns deles são Casino Royale, Clube da Luta, Orgulho e Preconceito, A Espera de Um Milagre, Gladiador, Melhor Impossível, Máquina Mortífera, Piratas do Caribe, A Supremacia Bourne, A Origem, Gattaca, Sr. e Sra. Smith e Missão Impossível 4. É estranho, porque não há qualquer traço comum entre eles. Exceto o fato de serem hipnóticos. Mas o mais magnético de todos é Constantine. Constantine é, para mim, o correspondente à Galinha Pintadinha para o Cãozinho. Só que ao invés da Mariana contando até dez, há demônios. E no lugar do borboletão fazendo macarrão para seu irmão, está Lúcifer. Que, diga-se de passagem, merece aqui deferência. Estrelado pelo ator sueco Peter Stormare, o capeta rouba o filme completamente desde a primeira cena em que aparece. Aliás, talvez a graça seja justamente essa. Assistir o Keanu Reeves e esperar que o Cão apareça. Não, eu não. O tinhoso. Algo semelhante ocorre com o Dewar’s […]

Drops – Dádiva Odonata 2016

Talvez você não tenha acompanhado a história. Mas há uns meses atrás este Cão Engarrafado fez algo que jamais imaginaria. Em parceria com a Cervejaria Dádiva, lançou uma cerveja. Mas não qualquer cerveja. Uma Russian Imperial Stout. Uma Russian Imperial Stout maturada em barricas de single malt das highlands escocesas. Batizada de Odonata #5, a cerveja ficou absolutamente incrível. E olha, isso até pode parecer um texto autopromocional meio esquisito e constrangedor, mas não é não. É que o mérito é todo da Dádiva. Mesmo antes do lançamento da minha cerveja, acompanhei de perto a cervejaria. E não havia um rótulo sequer que me decepcionasse. Mergulhei na leveza amarga da Venice Beach. Passei perto de um sugar rush com o coco e a baunilha da Tripel Bock. Quase entrei em insolvência ao tentar comprar todas as garrafas e latas que encontrasse pela frente da Spot e Status Quo. E peregrinei por uma garrafa de Dark Sour. Ah e claro – sofri toda vez que abria alguma das irmãs de minha afilhada – a Odonata #4, maturada em barricas de rum, assinada por Cesar Adames, e a Odonata #6, que passou seus meses em barris de cachaça Quinta das Castanheiras. Não sei […]

Drops – Ardbeg Kelpie

Minha filha estava estudando folclore brasileiro na escola. Ontem, ela veio me contar que seu animal folclórico preferido é o Saci. Faz sentido, pensei, já que ela não para quieta por um segundo sequer, e adora aprontar com tudo e todo mundo. Aí ela me perguntou qual era o meu preferido. E eu, para não dar uma resposta genérica sem graça e também ensiná-la algo novo, resolvi pesquisar. Recorri ao google. E não é que nosso folclore realmente é riquíssimo? Além dos conhecidos boto, curupira, lobisomem, mula e saci, há uma pletora de seres fantásticos que eu jamais poderia imaginar que existissem. Um deles é a Pisadeira. A pisadeira é uma velha que pisa na barriga das pessoas enquanto elas dormem, e causa falta de ar. Especialmente quando as pessoas comeram demais à noite. Olha, quando eu era criança, devo ter dado um belo trabalho pra essa tal Pisadeira. Mas não é apenas o Brasil que possui criaturas folclóricas, claro. Todos os países têm, e a Escócia não é exceção. Por lá, uma das lendas mais conhecidas é o Kelpie. O Kelpie é um espírito que muda de forma, e habita os lagos escoceses. Normalmente, toma forma de um cavalo. […]

Como identificar um whisky falso (de verdade) – O Cão Engarrafado

Comprei um fone de ouvido. Outro, porque aquele meu fantástico encontrou seu destino ao despencar no chão. Durou menos de dois anos e custou mais caro que prosecco no réveillon. Revoltado, resolvi que compraria algo bem mais em conta, ainda que quisesse também um visual bonito. Um website internacional de réplicas resolveu meu problema. Um belíssimo fone preto, estilo aviador. A marca, não fosse uma vogal de diferença, seria uma das melhores para equipamentos eletrônicos da espécie – Buse. Aquele Buse era quase idêntico ao original. Sério, era quase impossível desmascará-lo. Exceto no que importava. O som. Os baixos eram altos demais, e os altos, muito baixos. O volume máximo era o correspondente àquele atingido por minha filha sussurrando. Mas o pior de tudo era um barulho de chocalho quando eu mexia a cabeça. Provavelmente por conta de algum parafuso lá dentro, que havia caído durante sua viagem intercontinental até chegar à minha mão. Era uma pena. No final das contas o fone quase-original não era original no que mais interessava, apesar da estética quase impecável. E como tudo na minha vida acaba desembocando em whisky, rapidamente um pensamento me ocorreu. Era como whisky falsificado. Assim, embalado por minha (nem […]

Autoindulgência – Glenfiddich 26 anos Excellence

Dia desses estava no carro, dirigindo da forma que sempre faço. Como se tivesse roubado o automóvel do tinhoso, e este me perseguisse montado em um míssil tomahawk. Estava na pista expressa de uma marginal sem muito transito, e precisava entrar na local, que estava parada – mas que possuía uma pista de conversão absolutamente livre. Esta pista era pequena, e terminava em um muro. O que fiz teria sido genial, não fosse totalmente ridículo. Continuei na expressa até o último momento, dando pequenos toquinhos no breque, simulando estar perdido e indeciso. Aí, no último momento, reduzi bastante a velocidade e entrei, agradecendo efusivamente ao carro de trás, que havia me salvado de minha simulada imperícia. Furei fila e ninguém ficou bravo. Naquela hora, não me preocupei muito. Eu estava atrasado para minha reunião, e precisava chegar a tempo. Em outra oportunidade, estava em uma faixa de conversão numa grande avenida. Minha fila estava parada, mas aquela contígua à minha andava bem. Tão bem que outro carro resolveu abraçar a oportunidade. Ele seguiu por aquela faixa até o momento de virar à direita, e, rapidamente e sem muito sinal, entrou na minha frente. Eu fiquei furioso. Meu caro motorista, você […]