Robert Burns Single Malt – de ratos e flores

Se você acompanha o Cão há um tempo, já deve ter ouvido sobre Robert Burns. Ele foi o mais importante poeta escocês de todos os tempos, e um enorme expoente do movimento romântico. A envergadura de suas obras é enorme. Burns tratou de assuntos de enorme distinção. Da iniquidade social do século dezoito a sua paixão por embutidos de caprinos. Em uma de suas mais conhecidas obras, o poeta discorre por mais de três estrofes sobre o sabor inigualável de uma buchada de bode. Em outras duas, se martiriza por ter esmagado com seus pés uma margarida – a florzinha – e uma toca de ratos. O último inclusive, inspirou o escritor Sidney Sheldon ao batizar seu romance “The Best Laid Plans”. É capaz de ter também servido de inspiração para o James Blunt, mas vamos manter um nível administrável aqui. Mas não foi apenas nas artes que Robert Burns inspirou criações incríveis. Na área das bebidas, o poeta é uma influência importantíssima. Foi em sua homenagem que um dos mais importantes coquetéis de scotch whisky foi nomeado – o Bobby Burns. E também em sua referência que a Arran, destilaria localizada na ilha homônima na Escócia, batizou sua linha […]

Dalmore Cigar Malt Reserve – Forma e Função

Esta matéria foi originalmente escrita para o website charutando.com.br . Porém, com o lançamento oficial do Dalmore Cigar Malt Reserve no Brasil, reproduzimos aqui o conteúdo. Ferdinand Porsche uma vez disse “Se analisarmos a função de um objeto, seu formato geralmente se tornará óbvio”. Em outras palavras, a concepção, o desenho de certo objeto, deve ser escrava de seu propósito. Ferdinand Porsche realmente entendia muito sobre o design de automóveis, mas, provavelmente, nunca viu um talher de peixe na vida. Vou começar pelo garfo. O garfo de peixe é simplesmente um garfo comum, sensivelmente menor, mais gordo e com um dente a menos. E não há nada de especial nele além disso. Nada em seu projeto torna a tarefa de levar o animal marinho à boca mais fácil. Por essa razão, o garfo de peixe simplesmente não deveria existir. Mas o pior não é ele. O pior mesmo é a faca de peixe. A faca de peixe é um dos objetos da cutelaria que mais me intriga. Porque, para falar a verdade, ela não é boa para nada. Mas ela é especialmente ruim para se usar no peixe. Aquela reentrância – cujo propósito deveria ser auxiliar na separação das espinhas […]

Arran Lochranza Reserve – Cliché

Clichê. Um vício de linguagem. Uma expressão que, de tão usada, se esvaziou. Tornou-se comum, corriqueira, banal. Normalmente, fujo dela como o diabo foge da cruz ao escrever as matérias deste blog. Mas, dessa vez, vou deixar a caneta correr solta. É que Woody Allen disse que, às vezes, a melhor forma de explicar algo é por meio de um cliché. E é justamente isso que farei hoje. Porque tem muita água que passarinho não bebe bem cliché por aí. Esses, ordinários mesmo, com aquele sabor meio genérico. Caramelo, baunilha, malte. Agora, quase tão difícil quanto desviar do lugar comum, é chutar o balde e abraçá-lo. Mas agarrar com unhas e dentes, matar a cobra e mostrar o pau – claro, o mesmo usado para tirar a vida do proverbial réptil, e não outra coisa que você pode ter pensado. Enfim, fazer nas coxas é fácil. Difícil é fazer bem feito, e de olhos fechados. E é justamente isso que o Arran Lochranza Reserve, expressão que acaba de desembarcar no Brasil é. Um cliché. Mas um cliché extremamente bem feito. Desses, que dá vontade de entornar o caneco. Seja para beber andando nas nuvens, ou com atenção, é um whisky […]

Relevância – Arran Machrie Moor Cask Strength

A cobertura jornalística de alguns veículos é fascinante. Desde que o Caetano Veloso parou o carro no Leblon, me deslumbro com a relevância de algumas notícias. Como, por exemplo, da galinha que sobreviveu a um incêndio no Acre, e foi rebatizada de Fênix. Mas acho que a que mais me enfeitiçou recentemente foi de um rapaz que foi hospitalizado após comer uma pimenta – talvez por conta de meu interesse gastronômico em condimentos. A pimenta pivô do quase trágico acidente é a Carolina Reaper. Ela foi criada pelo californiano Ed Currie, proprietário de uma companhia com um nome bem sugestivo: Pucker Butt Pepper Company – numa tradução esdrúxula, Cia. de Pimentas Bunda Enrugada. Algo que, suspeito, tenha algo a ver com o processo, diremos assim, pós-digestivo da Carolina Reaper. A tal pimenta é considerada desde 2013 a mais forte do mundo pelo Guiness. Algumas delas chegam a dois milhões e duzentas unidades de Scoville (SHU) – escala usada para medir a picância destes belos frutos. Para você ter uma ideia, aquele Tabasco tradicional que você tem em casa mede de 2.500 a 5.000 SHU. E aquela habanero, que você acha super ardida e pinga só uma gotinha, como se temperasse […]

Drops – AnCnoc Blas

Guardamos relação sentimental com uma porção de coisas. Aquele carro que nos acompanhou numa viagem incrível, aquele filme que assistimos com certa companhia especial e aquela música que pautou algum grande desafio. Não é necessariamente algo bom ou ruim. Mas é uma sensação de que aquilo é especial somente para você, por mais prosaico que possa aparentar para todas as outras pessoas. São aquelas coisas que participaram de momentos de epifania, ou que marcaram alguma passagem em nossas vidas. Um dos whiskies que guarda espaço especial em minha memória etílica é o AnCnoc. O AnCnoc foi meu predileto na degustação mais importante que participei em minha primeira viagem à Escócia.  Fiquei tão impressionado que a última coisa que fiz, vinte minutos antes de embarcar de volta para o Brasil, foi correr em uma loja do Duty Free para levar uma garrafa para casa – um AnCnoc 16 anos. Naturalmente, imaginei que com o tempo e depois de provar outros maltes, a sensação se dissiparia. Mas, na verdade, ela se manteve. Depois daquele 18 anos, tive mais umas quatro garrafas diferentes. E gostei de todas elas. Todas guardavam a mesma característica de suavidade, de uma oleosidade quase de manteiga derretida, que me […]

Da Civilização – The Dalmore 12 anos

A civilização é algo precioso. Com ela, pudemos contar com um sem fim de coisas que nossos ancestrais nem imaginavam. Pudemos desfrutar de facilidades que hoje, tomamos como garantidas. Água encanada, esgoto, luz. Delivery de pizza, supermercados e centenas de milhares de barbearias, paleterias mexicanas e hamburguerias. Comida sem glúten e sem lactose mesmo pra quem não precisa, foodtruck de kombucha e todo tipo de solução para todo tipo de problema que não teríamos, se não vivêssemos em sociedade. Mas acho que a maior vantagem de todas é mesmo a tranquilidade. Não a tranquilidade da rotina, porque se existe alguma coisa que não é tranquila nos dias de hoje, é a rotina. A rotina pra quase todo mundo é bem corrida. Tanto que às vezes nem dá tempo de fazer xixi entre uma coisa ou outra, por exemplo. Mas a tranquilidade de saber que você tem maiores chances de terminar o dia vivo. Eu sei que mesmo hoje pode acontecer todo tipo de desfortúnio desagradável que desemboca na morte. Mas pensa bem. A chance de você ser devorado por um urso enquanto dorme é bem pequena. Ou de pisar em uma taturana tão venenosa que liquefará todos seus órgãos internos […]

A Educação faz o Whisky – Dalmore 18

A Educação faz o Homem. Foi o que o escritor britânico William Horman reproduziu em seu livro Vulgaria, de 1519 – um compêndio de citações e provérbios de sua época. No original arcaico “manners maketh man“, o aforismo pode parecer algo cavalheresco e ultrapassado, mas possui um significado tão simples quanto atual. Ele diz que a cortesia, educação e as boas maneiras são essenciais para se conviver em sociedade. E o homem aqui tem sentido amplo. É toda a humanidade. Mas isso tudo é um detalhe. O importante mesmo é que a citação de Horman – que na verdade nem de Horman é – tornou-se a frase de efeito de Colin Firth, em Kingsman. O filme, dirigido por Matthew Vaughn em 2014 é, ao mesmo tempo, uma paródia e uma homenagem a todos os filmes de espião de todos os tempos. Mas, especialmente, James Bond. Assim como nos filmes de 007, a película é forrada de ternos bem cortados, explosões e vilões megalomaníacos. E muitas vezes é até melhor que Bond. O polêmico plano-sequência da igreja, por exemplo, é absolutamente incrível. E Samuel L. Jackson como um cruzamento entre Mark Zuckerberg e Elon Musk coloca qualquer Blofeld no chinelo. Mas, […]

Protagonista – Aberfeldy 12 anos

Tem uns filmes que sempre paro para assistir, quando os encontro passando na televisão. É como se meu cérebro entrasse em modo avião, e confortavelmente se rendesse àquela sensação de familiaridade. Não há nada que eu possa fazer. Não importa quantas vezes já vi cada um, o mundo externo pode esperar. Alguns deles são Casino Royale, Clube da Luta, Orgulho e Preconceito, A Espera de Um Milagre, Gladiador, Melhor Impossível, Máquina Mortífera, Piratas do Caribe, A Supremacia Bourne, A Origem, Gattaca, Sr. e Sra. Smith e Missão Impossível 4. É estranho, porque não há qualquer traço comum entre eles. Exceto o fato de serem hipnóticos. Mas o mais magnético de todos é Constantine. Constantine é, para mim, o correspondente à Galinha Pintadinha para o Cãozinho. Só que ao invés da Mariana contando até dez, há demônios. E no lugar do borboletão fazendo macarrão para seu irmão, está Lúcifer. Que, diga-se de passagem, merece aqui deferência. Estrelado pelo ator sueco Peter Stormare, o capeta rouba o filme completamente desde a primeira cena em que aparece. Aliás, talvez a graça seja justamente essa. Assistir o Keanu Reeves e esperar que o Cão apareça. Não, eu não. O tinhoso. Algo semelhante ocorre com o Dewar’s […]

Especial Escócia – Visita à Oban

Este é o primeiro post de uma série sobre a visita em 2017 deste canídeo à terra sagrada do whisky. A Escócia – em especial, a terra da fumaça. Islay. No primeiro dia, a caminho de Islay, visitamos a destilaria Oban, localizada na cidade de mesmo nome. Literalmente dentro de Oban. A destilaria está no meio da cidade, em um prédio histórico, e muito próxima ao oceano. A destilaria é dividida em uma série de prédios, e há uma rua – uma rua ativa da cidade – que a cruza. O que deixa este Cão levemente apreensivo de que alguma barrica possa, porventura, ser atropelada ao olhar para o lado errado da rua ao atravessar. Nosso guia, porém, sempre solícito, me assegurou que isto jamais acontecera. Um dos maiores diferenciais alardeados pela própria Oban é a fermentação de seu mosto. Ele leva em torno de cento e vinte horas, o que é quase o dobro do que seria um absurdo para outra destilaria. Segundo eles, isso traz a seu destilado uma leveza e oleosidade bastante características. Os washbacks – os tanques de fermentação – da Oban são feitos de madeira de pinho. Algo também bastente incomum atualmente. A maioria das […]

Drops – Royal Brackla 16 anos

  Você sabe o que é um Royal Warrant? Um Royal Warrant é uma espécie de selo de aprovação da família real. Isso, na prática, significa que certa marca – a qual o Royal Warrant é concedido – fornece um serviço ou produto de altíssimo nivel para a corte real. E que, por conta disto, merecem deferência. Ou que a marca – a destilaria, no caso – é profundamente admirada por certa celebridade de sangue azul. A maioria dos países que, em algum momento, adotaram o regime monárquico possuem Royal Warrants. Até mesmo no Brasil isto aconteceu. Ao todo, foi concedido o inacreditável numero de dois. Um para a Granado – sim, aquela que faz os sabonetes – e outra para Henry Poole & Co, alfaiataria britânica que produzia parte das vestimentas de Dom Pedro II. A família real inglesa, porém, não foi tão seletiva. Ao longo de sua história, ela já forneceu milhares de royal warrants. Atualmente, há pouco menos do que novecentos. Companhias em ramos tão diversos quanto a Aston Martin, Nestlé, Twinings e Burberry possuem estes selos. A Brackla foi a primeira destilaria a receber o Royal Warrant. O Royal Warrant da Brackla foi concedido pelo Rei William […]