Como você deve saber – ou não – o nome deste humilde blog vem de uma frase atribuída ao compositor, poeta, letrista, cantor e apreciador das boas coisas da vida, Vinícius de Moraes: “o whisky é o melhor amigo do homem. É o cachorro engarrafado”. Excelente.
Aliás, o mundo do whisky está cheio de frases de grandes nomes, como Bernard Shaw, Humphrey Bogart e Alexander Fleming – o descobridor da penicilina, não o criador de James Bond. Esse é o Ian Fleming. Ainda que é bem provável que este último também tenha dito algo inteligente sobre a bebida. Uma das minhas frases preferidas é de Churchill: “água não foi feita para ser bebida. Para que seja palatável, é necessário adicionar whisky. Em esforço consciente, aprendi a gostar dela” – o que nos leva finalmente ao tema deste texto de estréia: como degustar whisky. O itálico aqui é importante. Beber, você bebe como quiser – pode chuchar gelo, encher até o topo com agua de coco ou Red Bull – afinal, o whisky é seu, e você é livre.
A chave aqui é a palavra “degustar”. O verbete “Degustar” é normalmente muito utilizado para tornar algo simples incrivelmente complicado. Ou para cobrar um preço ridículo por uma porção ridiculamente pequena de alguma coisa trivial. No mundo das bebidas, entretanto, “degustar” significa, de forma simplificada, uma série de cuidados que alguém deve ter para que possa retirar o máximo das sensações de aroma e sabor – notas aromáticas – que aquela bebida pode proporcionar.
DEGUSTANDO WHISKY EM 5 PASSOS (MAIS OU MENOS) SIMPLES
Passo 1 de 5 – A escolha do copo.
Escolher o copo certo é importante. De longe, a melhor opção é o copo Glencairn. Ele foi especialmente desenvolvido pela Glencairn Crystal Limited para degustação de whisky, após extensa pesquisa com as mais importantes destilarias escocesas. As bordas estreitas e seu diâmetro ajudam a reunir os aromas do whisky, e seu tamanho (aproximadamente 175ml) é perfeito para uma dose da bebida.
Aliás, em 2018 lançamos uma versão gravada do Cão Engarrafado deste distinto copo, produzido pela própria Glencairn. Ele pode ser comprado clicando aqui.
Se você não quer comprar um glencairn, então sua próxima melhor opção é a taça ISO. Seu formato e tamanho foi padronizado pela International Organization of Standardization, e tem características muito semelhantes ao Glencairn, ainda que seja ligeiramente maior.
Não quer comprar nenhum copo? Tudo bem. Seja brasileiro, improvise. Um copo baixo, de preferência com bordas levemente curvas – conhecido como tumbler – ou um copo alto, não são opções terríveis, ainda que não sejam também ótimas. Mas vamos manter a frescura em um nível administrável aqui, ok?
Passo 2 de 5 – Aparência.
Despeje um pouco do whisky no copo. Um pouco é um conceito bastante relativo, mas recomendo que não supere uns 50ml, ou uma dose. Se você estiver usando uma taça ISO ou Glencairn, isso equivale – na maioria dos casos – a encher até atingir o ponto mais largo da taça.
Observe a bebida. Whiskys tendem a ter tonalidades diferentes. Muitos fatores influenciam na cor. Os principais são o tempo de maturação no barril e a espécie de barril em que ele foi maturado. Por exemplo, aqueles que passaram algum tempo em barris que antes envelheciam xerez, tendem a ter uma tonalidade mais avermelhada. Há ressalvas aqui. Muitos whiskies utilizam corante caramelo. Para ler mais sobre isso, clique aqui.
Passo 3 de 5 – Aroma.
Aproxime o copo do nariz. Cuidado: é um destilado. Não precisa dar uma fungada, apenas respire. Consegue sentir os aromas? Tente fazer ligações com aromas conhecidos por você. Aqui não existe certo e errado. O nariz, assim como o whisky, é seu. No começo, tente algo objetivo: floral, frutado, defumado etc. são bons palpites. Se estiver se sentindo sofisticado, mande algo na linha de “aroma de orvalho sobre uma fogueira recém extinta”. Fica bonito, né?
Existem diferentes formas de sentir o aroma do whisky. Algumas pessoas preferem virar o copo e tapar uma narina, e depois alternar, para que cada narina possa trabalhar sozinha. Outros preferem deixar a boca aberta, o que, faz com que os aromas percorram melhor sua cavidade nasal. A brincadeira aqui é encontrar o que funciona melhor para você.
Passo 4 de 5 – Sabor.
Hora de dar um gole. Experimente o whisky. Não vá virar como um cowboy no velho oeste, ou como se fosse um shot de tequila. Vá com calma, campeão. Saboreie. Quais gostos consegue distinguir? Por favor, evite sabores polêmicos, como “cera de ouvido”. Depois de algum treino, você provavelmente conseguirá distinguir alguns sabores mais específicos, como nozes, caramelo, chocolate, laranja, etc.
Ainda que existam termos mais precisos e universais para definir aromas e sabores – como, por exemplo, sulfúrico, ácido, cítrico, adocicado, amargo, amadeirado, turfado, picante, entre outros, você pode se sentir livre para folhear sua biblioteca aromática e encontrar a definição que mais lhe aprouver. É a sua língua e o seu nariz. Não se intimide. E vou falar aqui uma coisa óbvia. Normalmente, os sabores acompanham o aroma, ainda que muitas vezes um complemente o outro. Se você sentiu um aroma frutado, é bem provável que o sabor também seja.
Além disso, alguns sabores e aromas costumam ser mais facilmente perceptíveis do que outros. Um dos meus single malts preferidos, o Glenmorangie Signet, por exemplo, tem um sabor violento de chocolate. Já o Benromach 10 anos tem aroma defumado discreto. Exceto se você tiver um paladar bem treinado, somente conseguirá senti-los ao comparar com outro whisky que é pouquíssimo defumado, como, digamos, o Glenfiddich 12 anos. Aliás, aí está um conselho que deve ser usado com bom senso. Uma das melhores formas de identificar sabores diferentes em whiskys é com base em comparação.
Você também notará que alguns são mais encorpados do que outros. Voltando ao exemplo acima, o Glenfiddich 12 anos é mais encorpado que o Signet. E os Macallan são mais encorpados que os dois.
Existem alguns gráficos que tentam classificar os whiskys com base em suas características sensoriais. O mais comum é um gráfico convencional, que os separa entre defumados ou delicado, encorpado ou leve. Outra forma de representação é o gráfico em forma de teia, desenvolvido pela Macallan, que engloba aromas mais específicos.
Passo 5 de 5 – Agua.
Pronto. Voltamos a Churchill. Adicione um pouco de água, e repita o processo todo. A quantidade de água depende de seu gosto, e também da graduação alcoólica do whisky. O ideal é que a quantidade seja suficiente para deixa-lo um pouco mais palatável, tirando parte do álcool do caminho, mas não bastante a ponto de deixar a bebida aguada ou muito diluída.
Passo 6 de 5 (bônus!) – Compartilhe.
Calma, quando falo “compartilhe”, não é para colocar foto no Instagram e sua tia achar que você é alcoólatra. Reúna seus amigos e compartilhe suas impressões com eles. É possível que ele tenha notado um sabor que passou despercebido para você. Tomar whisky é sempre bom, mas é ainda melhor quando é uma experiência social. Aproveite.
Ótimas dicas. Parabéns. Estou começando agora no mundo dos singles maltes, sem dúvidas são bem diferentes, mais suaves. Tem sabores que não percebia nos blends.
Marcos, isso mesmo. Single malts na verdade são “um samba de uma nota só”. Há um tema, sabores predominantes, em cada um deles. Geralmente são bem mais profundos. Blends são mais equilibrados e tem sabores mais variados, porém, não tão desenvolvidos. Claro que toda regra tem sua exceção!
Comecei a saga: primeiro texto lido e já gostando… parabens, Mauricio.
Parabéns pela matéria, gostei muito
Valeu, Eduardo!!
Li em algum lugar que uma garrafa deve ser bebida em, no máximo, 01 ano.
Confere?
Parabens pelo site!
Filipe, depende de como é armazenado. Dá uma lida aqui: https://ocaoengarrafado.com.br/whisky-estraga-aberto-oxidacao/
Excelentes dicas. Estou nos SINGLE MALT comecei com SINGLETON DUFFTOWN que tinha na prateleira do mercado (R$200,00), agora quero provar o GLENFIDDCHI 12 ANOS.
Infelizmente não temos um mercado tão significativo quanto a whiskies de qualidade nas lojas físicas brasileiras, o recurso é apelar nas lojas virtuais.
Goatei do texto e quero usar suas dicas para comparar alguns whiskies dos Estados Unidos que tenho em casa com o Jim Beam Rye, que acabei de comprar. Alguma ideia para limpar o paladar entre um gole e outro?
Gostei do texto e quero usar suas dicas para comparar alguns whiskies dos Estados Unidos que tenho em casa com o Jim Beam Rye, que acabei de comprar. Alguma ideia para limpar o paladar entre um gole e outro?
Obrigado Fabio! Recomendo um pão italiano ou água com gás 🙂