“O supérfluo é uma coisa extremamente necessária“, escreveu Voltaire. Eu, autor de um blog sobre um dos mais supérfluos artigos do mundo – whisky – tenho que modestamente concordar com o aparente paradoxo de Voltaire. Whisky é uma necessidade desnecessária – como automóveis esportivos, roupas de grife e aquela torneira de cozinha de casa de rico, que tem uma molinha enrolada. Meu deus, como quero uma torneira daquelas!
Há um irremediável desejo no supérfluo. Afinal, é de nossa natureza almejar o que ainda não alcançamos. Ou melhor, almejar uma variação que consideramos melhor daquilo que já temos. Uma torneira normal não é um objeto de desejo. Uma daquelas sofisticadas sim, ainda que sua função seja, essencialmente, a mesma. De Voltaire, passo para Chanel, que disse que “o luxo é a necessidade que surge quando o necessário já foi satisfeito“.
No mundo dos whiskies, isso fica absolutamente claro. A grande maioria das marcas busca transmitir algum valor ligado ao luxo. Sofisticação. Elegância. Esclarecimento. Exclusividade. E poucas fazem isto com tamanha maestria quanto a Royal Salute. A começar pela idade de seu produto de entrada. Como se autodefinem, ao referenciar a idade mínima de vinte e um anos “a Royal Salute começa onde os demais terminam“.
Atualmente, o homem responsável por enfeitiçar as pessoas com toda magia da Royal Salute é Mathieu Deslandes, diretor de marketing da marca. A convite da Royal Salute, este Cão teve a incrível oportunidade de entrevistá-lo durante sua viagem a Coréia do Sul – onde foram lançadas duas novas expressões do portfólio permanente da marca.
E a impressão que tive é que Mathieu Deslandes não é apenas diretor da marca. Mas sua encarnação. Sofisticado, mas ao mesmo tempo bem humorado e gentil, o diretor explicou sobre a motivação por trás da diversificação do portfólio, bem como as especificidades do mercado de luxo. E é esta conversa que você confere aqui, com exclusividade.
Me conte um pouco sobre os novos produtos. Por que diversificar o portfólio?
Na verdade, estamos apelando para o amante do whisky, na Royal Salute. Quando você chega a este nível de qualidade, não é por acaso, mas porque você ama whisky e quer experimentar algo mais.
E, durante os últimos vinte anos, tem havido muito mais opções de whiskies, especialmente liderados por single malts, com propostas muito diversas. Então, parece-me que, se quisermos defender o whisky de luxo, não podemos ser apenas um. Temos de oferecer aos nossos consumidores a oportunidade de experimentar algo diferente, de descobrir.
E eu acho que o que é fascinante sobre o trabalho que fizemos com Sandy Hyslop, o master blender, é o quanto podemos diferenciar o sabor do whisky apenas pela escolha dos barris, e pela escolha do líquido que você usa. Você verá hoje à noite a diversidade que podemos obter, ainda sendo um whisky de 21 anos de idade.
A razão pela qual escolhemos 21 anos é que faz parte do DNA da Royal Salute. Quando a marca foi criada, foi criada como um 21 anos. E 21 é uma referência à Twenty One Gun Salute. Então, não é uma idade por acidente. É uma idade com um forte significado. E é por isso que comemorar essa idade é tão importante para nossa narrativa.
E por que um blended malt (The Malts Blend)? E qual o diferencial do The Lost Blend?
Tudo é um blend para nós. Na Royal Salute acreditamos em blends. Não é que os blended whiskies sejam melhores que os single malts, ou que os single malts sejam melhores que os blends.
Há uma referência que costumamos usar. Single malts são solistas na música. E os blended whiskies são como uma orquestra. Você pode ter um bom intérprete solo ou um mau intérprete solo. Você pode ter uma orquestra boa ou ruim.
Mas nós, como marca, fomos criados como um blend, então permanecemos fiéis a isso. É verdade que o perfil do sabor do single malt é algo que vem se desenvolvendo muito. É algo que é mais forte em termos de personalidade, menos suave. Por isso, foi interessante entrar nesse campo como uma forma de diversificar nosso portfólio para o consumidor (no caso do Malts Blend).
Para o Royal Salute 21 The Lost Blend, há bastante whisky vindo de Caperdonich, uma destilaria que foi desativada, que tem um perfil apurado de sabor, então você encontrará este perfil de sabor mais forte nele.
Royal Salute possuía uma das mais belas embalagens do mundo. Por que mudar? E por que a embalagem é importante? Ela afeta a experiência?
Creio que a embalagem afeta sim a experiência do consumidor. É a primeira coisa que você vê antes de beber. Você vê uma garrafa, você vê uma caixa. Então, é uma maneira de comunicar o que você quer expressar sobre a marca. Mas tem que ser consistente. Tem que ter consistência do que você bebe e o que você vê.
E o segundo aspecto é importante porque, nessa faixa preço, há muitas pessoas dando Royal Salute de presente. E, como sabemos, quando você dá um presente, a embalagem também é importante. Então, o que achamos interessante sobre essa evolução foi usar a embalagem mais como uma narrativa.
Escolhemos trabalhar com Kristjana Williams, a artista por trás das ilustrações, para expressar a história de um zoológico real. O que estava acontecendo na torre de Londres – um lugar onde todos os animais que os reis e rainhas recebiam como presente eram mantidos. É uma história verdadeira, com leões, elefantes. É o que queríamos retratar na ilustração, na nossa narrativa. De uma forma criativa e artística, porque o consumidor de luxo hoje espera essa audácia e criatividade
Storytelling?
Storyelling. Por isso que encontramos uma boa combinação entre o lado de fora da caixa, que é mais conservador, mais sério. Mas porque nós diferentes, usando o interior de uma caixa para usar a narrativa
De todos os lugares do mundo. Por que a Coréia?
A Ásia, globalmente, quando se trata de whisky de prestígio, é um mercado importante. Segundo, porque a Coréia especificamente, se você combinar o que vendemos no mercado doméstico com o que vendemos em duty free – porque muitos clientes coreanos compram em freshops – fazem da Coreia a nacionalidade número 1 das pessoas que compram Royal Salute.
Mas para ser honesto, fizemos eventos de pequena escala, um em Nova York e outro em Londres, porque quando se trata de luxo, não há limites. O luxo é global. Então, precisávamos ter certeza de que estávamos fazendo uma referência nos EUA e outra na Europa.
O que há de diferença no mercado de luxo para o mercado normal? E o que acha sobre o mercado de whiskies de luxo na América do Sul e Brasil?
O que é diferente no luxo é que não há meio-termo. Não há meio-termo na qualidade, nem meio-termo em qualquer coisa que você faça, porque há uma expectativa de que algo seja excepcional quando você compra luxo.
Então, neste mindset, tento comparar com outras marcas de luxo que não são bebidas alcoólicas, ao invés de comparar com outras marcas que são whisky que não são de luxo. O que é importante para nós é ter uma mentalidade de luxo. E a mentalidade do luxo é ser excepcional em tudo que fazemos – o whisky, o pacote, a experiência, a comunicação. Tudo tem que ser excepcional.
Falando sobre o Brasil – em todos os mercados do mundo, há um espaço para pessoas que estão à procura de luxo. O Brasil é um grande mercado para o whisky. As pessoas gostam e conhecem whisky. O importante é que desenvolvamos uma cultura sobre o whisky de luxo. Talvez já esteja lá para champanhe. Provavelmente menos para o whisky.
Mas é nossa responsabilidade nos conectarmos com o influenciador certo, o bartender, restaurante, consumidor, imprensa, revista, seja o que for, para falar sobre Royal Salute, porque provavelmente o problema de Royal Salute não é sua qualidade, mas o fato de não ser conhecido. Portanto, nossa primeira missão em muitos países do mundo é garantir que a Royal Salute seja conhecido. Mas de uma maneira muito diferente você faria com um whisky mais acessível. O que importa não é o número de pessoas que você alcança, mas a qualidade da maneira como você as alcança e a experiência.
Não temos nada a dizer sobre fazer algo a curto prazo. Mas algo mudando o jogo e a longo prazo. E isso requer tempo.
Engraçado, mestre que ainda que supérfluo, caso não exista, na proporção correta, claro, a qualidade de vida cai vertiginosamente.
Excelente entrevista! Muito interessante enxergar tudo isso do ponto de vista do Diretor de Marketing. Perceber a busca da evolução, onde aparentemente o ápice já foi atingido. E eles conseguiram hahaha.
Abraço!
É como disse Rostropovich, quando perguntaram porque ele ainda tocava violoncelo por 6h cada dia: “é que eu acho que estou progredindo”. rs.