Há milhares de anos, vikings e indígenas na América do Norte observavam o céu mesmerizados. Uma cortina de luz pulsante e sinuosa se apresentava no horizonte. Era como se um grande rio entremeado por montanhas se estendesse pelo céu, brilhando numa paleta de cores que variava do verde claro ao roxo, com vividez impressionante. Inuítes, Chipewyan e Vikings tinham nomes diferentes para aquele fenômeno, que hoje conhecemos como Aurora Boreal.
A explicação também era diferente. Os Nórdicos acreditavam que as luzes vinham das cintilantes armaduras das Valquírias, que cavalgavam no congelante céu do inverno. Atualmente, entretanto, a ciência já desvendou o mistério. São partículas carregadas de vento solar, que colidem com a atmosfera da terra e produzem este maravilhoso efeito. Curiosamente ou não, em minha opinião, a explicação moderna é muito mais bela e poética.
Mas há centenas de mistérios ainda não resolvidos, mesmo sob o excruciante olhar da ciência. O mecanismo de Antikythera, o chupacabras, o manuscrito Voynich e os raios-bola por exemplo. E claro que o mundo do whisky não sairia ileso desta. Ele tem seus próprios mistérios e segredos. Um deles envolve uma marca que acaba de desembarcar no Brasil. Old Pulteney. A indagação sobre a origem de seu perfil salino, mas não defumado, gera controvérsia entre os entusiastas da bebida.
Vamos falar primeiro do whisky tema desta prova – o Old Pulteney 12 anos, que acaba de chegar ao Brasil pela Cia. Hibernia de Bebidas, formada por este Cão que vos fala, e o sr. Alexandre Tito, da Whisky Rio.
Sobre o Pulteney 12, vamos começar por seu perfil sensorial. Ele é um whisky relativamente seco, com notas salinas, mas não defumado. Por conta disso, a nota proveniente dos barris de carvalho americano se ressalta, com bastante baunilha e caramelo salgado. É um whisky encorpado e intenso, com um leve aroma sulfúrico.
A nota de enxofre vem da destilação. Os alambiques de primeira destilação da Pulteney tem uma espécie de bulbo, quase tão grande quanto sua base, para incentivar refluxo, e topo reto. O lyne arm sai da lateral do alambique. Já os de segunda destilação contam com purificadores e condensadores em forma de serpentina, que adicionam oleosidade e este curioso perfil um pouco malcheiroso.
A maturação do Old Pulteney 12 anos ocorre em barris de carvalho americano de ex-bourbon, tanto de primeiro quanto segundo uso. A maturação ocorre na destilaria, em armazéns próximos ao mar – o que, em teoria, lhe empresta o sabor salgado. Ou não. Porque há muitas hipótess que tentam explicar este perfil, mas nenhuma com grande exatidão.
A Pulteney Distillery fica localizada em Wick, uma pequena cidade portuária no norte da Escócia – tão ao norte que, provavelmente, os antepassados tiveram a oportunidade de se mesmerizar com a aurora boreal, em algum momento. A destilaria fica a aproximadamente dois quarteirões grandes da avenida (se assim puder ser chamada) que acompanha o mar. Esta avenida fica na parte de baixo de um aterro – e o resto da cidade, inclusive a Pulteney – em uma posição elevada, acima.
Este descritivo é importante para tentar desvendar o mistério salino. Soma-se a isso outra pista importante. Os Old Pulteney mais maturados, como o 18 anos, são menos iodados do que os mais jovens. É contraintuitivo – se a salinidade vem da maturação, ela deveria aumentar à medida que o whisky envelhece, e não diminuir, como sensorialmente parece. O que sugere que, talvez, o sal – ou qualquer coisa que traga este sabor salino – venha de algum processo anterior. O curioso é que o new-make da Pulteney não é salino.
Mas aqui, a subjetividade também compromete qualquer conclusão. À medida que os whiskies maturam, a influência da barrica aumenta. A combinação de barricas utilizada no Old Pulteney 18 anos é, também, diferente daquela usada em seu irmão mais jovem. Então, talvez, a impressão menos iodada se deva, na verdade, à maior influência da madeira, que se sobrepõe à influência salina nos barris, mesmo que ela ocorra constantemente.
Pelo princípio investigativo da Navalha de Ockham – que determina que a explicação mais simples geralmente é a correta – a origem misteriosa do sal no Old Pulteney 12 anos vêm da maturação. Entretanto, há outras teorias.
De acordo com uma excelente matéria da Whisky Magazine, é possível que o sabor iodado esteja lá de começo, mas esteja imperceptível até que suas arestas mais pontiagudas sejam aparadas pela maturação. A água usada na diluição do whisky, tanto antes do preenchimento dos barris quanto do engarrafamento pode também ser outra explicação. Ainda mais considerando que tais sabores podem ser ressaltados mais tarde, pela maturação.
Ainda que a maturação seja a explicação mais plausível, a questão segue inconclusiva. Só há uma certeza nessa história toda. Que o Old Pulteney 12 anos é um whisky interessantíssimo e delicioso, com personalidade e distinção – e para um entusiasta, quase tão impressionante quanto observar a bela dança da aurora boreal em um certo vilarejo ao norte da Escócia.
OLD PULTENEY 12
Tipo: Single Malt Whisky
Destilaria: Pulteney
Região: Highlands (Wick)
ABV: 40%
Notas de prova:
Aroma: herbal e iodado, com algas marinhas.
Sabor: Adocicado, com baunilha. Herbal, levemente apimentado. Algas marinhas. Final longo e salgado.
Não achei pra vender… como adquirir o produto pela Cia Hibernia de Bebidas?!
Plínio,compre pelo Caledonia. O Hibernia tem um processo de cadastro e acompanhamento de CNPJs que nao permite essas compras.