Drops – Compass Box The Lost Blend

Compass Box Lost Blend 3 - O Cão Engarrafado

Em 1903 o contista William Sydney Porter – mais conhecido como O. Henry e afamado por dar finais surpreendentes a suas tramas – publicou um livro de contos chamado The Trimmed Lamp. Dentre as historietas lá contidas havia uma intitulada The Lost Blend (o Blend Perdido).

The Lost Blend narrava as obstinadas tentativas de uma dupla de bartenders em criar um blend – na verdade, um coquetel – que seria capaz de imprimir a mais pura coragem até no mais covarde dos homens. Este blend teria sido encontrado em um barril misterioso, mas acabara. E agora, os dois homens tentavam, incessantemente, combinar os mais diferentes elementos etílicos de forma a recriar aquele destilado encantado. Porque, realmente, somente álcool mágico nos torna  mais corajosos.

O conto é quase um curta-metragem de youtube dos dias de hoje. Em suas cinco páginas, ilustra de uma forma bem humorada o cotidiano de um incomum bar em Nova Iorque, no início do século XIX. Mas apesar de O. Henry ter sido um dos maiores contistas de seu tempo – comparável a Mark Twain até – não há nada de extraordinário em The Lost Blend que o destacasse do restante da obra do escritor.

Acontece, porém, que mais de um século depois, aquela narração ganhou novamente um certo destaque. É que a Compass Box Whisky Co., uma boutique dedicada a criar blended whiskies de extrema qualidade, resolveu homenagear o escritor, lançando um blended malt com o mesmo nome do conto.

A história do The Lost Blend – o whisky, não a peça literária – é bem interessante. Em 2001 a recém fundada Compass Box criou seu primeiro blended malt, chamado Eleuthera. O nome teria sido inspirado pela ilha homônima nas Bahamas, onde John Glaser, ex-diretor de marketing da Johnnie Walker e presidente e fundador da Compass Box, concebera a ideia do whisky durante suas férias.

Compass box lost blend - eleuthera
Lugar bonito pra inventar um whisky.

Este Cão teve a oportunidade de experimentar o Eleuthera quando ele já fazia parte do passado. Ele fora descontinuado em 2004 – apenas três anos após seu lançamento – por conta da falta de um de seus ingredientes chave.  Um certo Clynelish de quinze anos de idade. Ao abandonar a produção de seu blended malt primogênito, John Glaser declarou que não teria conseguido encontrar nada que pudesse substituir aquele single malt. Assim, tomou a difícil decisão de extingui-lo.

Desde então, Glaser explorou todos os cantos da Escócia, de leste a oeste, norte a sul, por barricas que contivessem um substituto à altura. Demorou dez anos. Uma década depois ele finalmente o encontrou na forma de um barril de caravalho americano de  Allt-A-Bhainne. Para prestar homenagem ao finado Eleuthera, a Compass Box batizou seu novo (ou melhor, ressuscitado) whisky de The Lost Blend, em expressa referência à historieta de O. Henry. E aproveitando a temática de res derelicta, criou três rótulos diferentes, cada um com uma porção de coisas que teriam deixado de existir – algumas bem lúdicas, como o navio RMS Lusitania e o extinto Dodô (o pássaro, não o jogador).

A Compass Box Whisky Co. tem ganhado fama por sua reputação rebelde e desafiadora.  Tanto é que há alguns anos, a empresa lançou uma campanha de transparência na indústria do whisky, e resolveu divulgar a composição exata de todos os seus produtos. Apesar de protestos de grandes produtores e da Scotch Whisky Association, a Compass Box contornou o problema e até hoje mantém sua campanha ativa. Graças à rebeldia da empresa, aliás, sabemos que o The Lost Blend é composto exatamente de  70.8% Clynelish, 22% Caol Ila e 7.5% do precioso Alt-A-Bhainne. Não há filtragem a frio nem utilização de corante caramelo.

O The Lost Blend é equilibrado e distinto ao mesmo tempo. É um blended malt que agradará tanto aqueles que são apaixonados pelos maltes turfados quanto os que apreciam whiskies adocicados. E mais, é um blended malt que certamente agradará até mesmo aqueles que preferem tomar apenas single malts. Isto é, se você tiver a sorte de encontrar um. Por conta da raridade do Allt-A-Bhainne, o The Lost Blend foi lançado como uma edição limitada, de 12.018 garrafas.Quando estas estiverem esgotadas, ele se juntará a todas aquelas coisas ilustradas em seu rótulo.

Quer dizer, até que outro substituto à altura seja encontrado.

COMPASS BOX THE LOST BLEND

Tipo: Blended Malt sem idade definida

Marca: Compass Box Whisky Co.

Região: N/A

ABV: 46%

Notas de prova:

Aroma: Aroma adocicado e floral, com um pouco de fumaça e carvão.

Sabor: Mel, frutas adocicadas, dama-da-noite (sério!), uvas passas. Final progressivamente mais seco e defumado.

Disponibilidade: apenas lojas internacionais.

 

Por que não devemos ignorar blended whiskies

Blended Whisky - O Cão Engarrafado

Não sei se você acompanhou essa história, mas a Univerisdade de Oxford elegeu a expressão “pós-verdade” como a mais emblemática de 2016. Segundo eles, pós verdades são “circunstancias em que fatos objetivos são menos importantes em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e crenças pessoais”. Ou seja, mentiras.

Mas não quaisquer mentiras. Mentiras que apelam para a pior parte das pessoas: a emocional. É tipo quando alguém espalhou que a carne do McDonald’s é de minhoca. Ou quando Donald Trump disse que o Obama fundou o Estado Islâmico. Ou ainda quando minha filha disse que não tinha comido macarrão na hora do almoço e que me amava, só pra comer de novo na hora do jantar

E ainda que alguns boatos soem mais críveis que outros, sabemos muitos são tão verdadeiros quanto o cabelo do referido presidente eleito. O problema das pós-verdades é que elas estão por toda parte, mas, principalmente, na internet. Porque, na internet, todo mundo tem opinião sobre tudo e nenhum compromisso. Inclusive eu, escrevendo este texto. É como se meu modem equivalesse a um título internacional de especialista na vida.

Livre-docente
Livre-docente

Até assuntos que não deveriam ser nada polêmicos possuem pós-verdades. Como, claro, o whisky. A frase “só tomo single malt” traz, por trás de algo que parece uma escolha inocente, uma pós-verdade bem extrema. O falso conceito de que single malts são whiskies superiores aos blended whiskies. Que estes últimos são dedicados às massas, enquanto que aqueles são a bebida das pessoas esclarecidas.

Informações Burocráticas

Antes de tudo, vamos explorar aqui as diferenças entre blended whiskies e single malts. Estes últimos, são produtos de uma única destilaria, produzidos exclusivamente de cevada maltada, destilados em alambiques de cobre e maturados por, no mínimo três anos, em barricas de carvalho.

Blended whiskies por sua vez, são uma combinação de single malts de destilarias diferentes com whisky de grão. Este, produzido com quaisquer grãos, fermentado e, normalmente, destilado em destiladores contínuos. Whiskies de grão também devem descansar em barris por, no mínimo, um triênio.*

A maioria dos blends visa equilíbrio e suavidade. São produtos desenhados para agradar o maior número de pessoas. Vou fazer um paralelo com outra coisa que adoro aqui. Carros. Um blended whisky de luxo – desses que custam o preço de um single malt – é como um belo sedan executivo. Uma Mercedes-Benz classe E, por exemplo. Confortável, espaçosa e boa para quase tudo.

Single malts são um samba de uma nota só. Seus sabores são menos diversificados, mas, normalmente, muito mais profundos. Há geralmente um espectro de aromas e sabores claramente predominante. São produzidos de forma a ressaltar certas características. No nosso exemplo automobilístico, equivaleriam a um Porsche Carrera. Robusto, extremamente ágil e uma delícia para quem gosta de dirigir. Mas um terror para quem tem dor nas costas, ou só quer chegar do ponto A ao B sem pensar muito.

É, mas eu ainda prefiro o Porsche.

Okey. Você pode preferir o Porsche. Você pode, inclusive, argumentar que o Porsche Carrera é para quem se importa, para os esclarecidos sobre automobilística. E que a classe E é um sofá com rodas. Um belo sofá com rodas.

O problema desse argumento é a parte do esclarecido. Você pode ser esclarecido sobre whiskies e automóveis, mas será mesmo que aplica todo este conhecimento aristotélico em outros campos da sua vida? Bem, vamos falar sobre blends.

Blends não existem apenas no mundo dos whiskies. Eles estão por toda parte. Muitos vinhos – inclusive aquele Chateau Latour de três mil dólares – são blends de diferentes uvas. A maioria dos cafés são blends. Perfumes são blends. Aliás o perfume mais famoso de todos os tempos, Chanel No. 5, mais conhecido pelos homens como a única roupa que Marilyn Monroe usava para dormir, é um blend.

Olha, quando aquele Neanderthal resolveu que aliviaria sua lascívia com aquela Homo Erectus ou Sapiens (me ajudem aqui) duvido que a preocupação de criar uma “blended criança” – quer dizer, a gente – tenha passado pela sua cabeça.

Não passou. Mas eu só tomo single malts.
Não passou. Mas eu só tomo single malts.

Pode ser, porém, que você não use perfume, dirija apenas esportivos e beba apenas single malts, cafés single origin e vinhos single grape. Neste caso, você provavelmente é uma pessoa insuportável, e eu não quero te conhecer.

Mas estamos falando de whisky.

Perfeitamente. Perdão pela tergiversação. Responda então por que você bebe whisky. Se você é como este Cão, você provavelmente o faz porque acha que é a melhor bebida do mundo. Ao menos concordamos em alguma coisa.

Se este for o caso, então imagino que o importante é que a bebida seja gostosa. Que o sabor lhe agrade, lhe faça relaxar ou potencialize momentos alegres com seus amigos, ou mesmo sozinho. Neste caso, então, talvez a classificação não importe muito.

A falácia de que single malts são superiores a blended whiskies tem uma origem muito simples. Blended whiskies costumam ser o ponto de partida para aqueles que apreciam os maltes. É um processo de descoberta e ruptura. Ao descobrir o mundo dos single malts, rompemos com os blended whiskies – é uma quebra necessária e inevitável para que possamos nos arriscar. Até que, certo dia, descrevemos um arco imaginário, e voltamos a apreciá-los pelo que realmente são, sem generalizações.

Aliás, um dos maiores inimigos dos blended whiskies é justamente ela. A generalização, cada vez mais frequente no mundo cibernético das pós-verdades. No entanto, a realidade é bem mais tonalizada. Há single malts excelentes e outros medíocres. Assim como há blended whiskies ótimos, e outros que preferia ter minha língua arrancada por um pit-bull e dilacerada a ter que provar novamente.

Um exemplo de excelência são os blends produzidos pela iconoclasta Compass Box, uma boutique de whisky dedicada a criar apenas produtos de altíssima qualidade, desafiando as regras e tendências de mercado. É curioso que mesmo aqueles que tomam apenas single malts, tendem a excepcionar a Compass Box.

Algo tão prosaico como o desdém por blended whiskies passa também por algo que está bem em voga ultimamente, e está longe de ser trivial. A busca por identidade. A maioria das pessoas bebe blended whisky. Blended whiskies correspondem a aproximadamente 90% de todo consumo mundial de whisky. Então, apreciar e conhecer single malts soa como um diferencial. Algo que lhe define e separa do comum.

E tudo bem, porque ninguém vai matar o outro porque ele está tomando um Chivas ao invés de um Glenfiddich. Mas em muito maior escala, é justamente isto que está no âmago de todo discurso de ódio e intolerância. A busca de uma identidade própria, julgada superior às demais, que acaba levando a polarização e a extremos.

Tipo o dele.
Tipo o dele.

Talvez eu não devesse dar tanta atenção a isto. Afinal, se há liberdade inofensiva no mundo, é a de se beber o que bem quiser. Mas da próxima vez que desprezar um blended whisky em prol de um single malt, lembre-se de um provérbio inglês que se aplica perfeitamente aqui: muito ao leste já é oeste.

 

(*) existem também blended malts e blended grains, como você deve saber. Mas vamos deixá-los fora disto, por enquanto.

Drops – Tobermory 10 Anos

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Você gosta de mergulho? E águias? E por que não rali automotivo? Se respondeu sim para as três perguntas, seu lugar no mundo existe. É que essas coisas que aparentemente têm pouca relação são as principais atrações da ilha de Mull, na Escócia.

Mull é a segunda maior porção de terra das hébridas interiores – um arquipélago a oeste da parte continental da Escócia – com mais de oitocentos e oitenta quilômetros quadrados de, bem, absolutamente nada. Apesar da extensão territorial, a ilha possui apenas três mil habitantes.

Mas além de automóveis off-road, aves de rapina e recifes de coral, Mull também possui uma atração para os amantes de whisky. É a destilaria Tobermory, localizada no vilarejo homônimo, o maior da ilha.

A destilaria Tobermory produz duas linhas diferentes de whisky. A primeira, com o mesmo nome da destilaria, é composta de whiskies pouco turfados, com notas cítricas e de especiarias. A outra, Ledaig, é defumada, com sabor de iodo e fumaça. E a espinha dorsal da primeira – Tobermory – é justamente o whisky da foto. O Tobermory 10 anos.

O Tobermory 10 é cítrico e levemente defumado. Sua defumação, no entanto, não vem da queima da turfa, mas do uso de água que corre por depósitos daquele material. A água é recolhida de uma barragem próxima aos lagos Misnish, e bombeada até a destilaria. O whisky é engarrafado a saudáveis 46,3% após dez anos de maturação em barricas de caravalho americano que antes contiveram bourbon whiskey.

Além do Tobermory 10, a destilaria produz versões de quinze e vinte anos. Já os Ledaigs possuem expressões com dez e dezoito anos de maturação. Há alguns anos houve também uma edição especial, interessantíssima. Um whisky maturado por 42 anos, chamado Dùsgadh. Mas a maturação não é a única coisa que o torna especial – a caixa e o rótulo foram produzidos com o cobre derretido dos antigos alambiques, quando foram substituídos.

Uma garrafa singela
Uma garrafa singela

Para o divertimento deste Cão, não seria necessário nem águias, nem jipes e tampouco pés de pato. Mas tão somente uma garrafa deste pequeno notável. O ótimo Tobermory 10 anos.

TOBERMORY 10 ANOS

Tipo: Single Malt Whisky com idade definida (10 anos)

Destilaria: Tobermory

Região: Ilhas

ABV: 46,3%

Notas de prova:

Aroma: cítrico, com um fundo de açúcar e baunilha.

Sabor: cítrico e seco, levemente defumado e iodado. Final progressivamente mais adocicado, mas com a defumação um pouco mais pronunciada. O álcool é muito suave e mal se nota a graduação alcoólica.

Com água: A água aumenta a impressão adocicada.

Disponibilidade: apenas lojas internacionais.

Doze Glorioso – Famous Grouse 12 anos

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Essa semana, enquanto pesquisava um pouco mais sobre o whisky deste post, curiosamente esbarrei em uma página sobre o Glorious Twelfth. E graças à minha falta de foco e gosto pela procrastinação, resolvi perder alguns minutos lendo sobre ele. O Glorious Twelfth ocorre no dia doze de agosto, e é perfeito para todos aqueles cujo conceito de diversão inclui pagar centenas de libras, pisar em poças de lama e ser picado por insetos inconvenientes. Tudo isso pela oportunidade de matar seu próprio jantar.

É que o Doze Glorioso – como poderia ser cretinamente traduzido para nossa língua lusitana – marca o início da temporada de caça ao Tetraz, um pássaro típico do Reino Unido. Apesar de polêmico, o Glorious Twelfth continua incrivelmente popular. Estima-se que a caça à tetraz movimente mais de cento e cinquenta milhões de libras por ano.

Eu, que tenho preguiça até de ir até a geladeira, não consigo conceber uma ideia pior que essa. Além de caro e sujo, a atividade beira o impossível. O tetraz é uma ave bastante ágil, que consegue mudar de direção de voo quase instantaneamente. Por isso, inclusive, que é uma das mais cobiçadas para caça.

Não, mais uma vez - eu não sou um peru.
Não, mais uma vez – eu não sou um peru.

Apesar de se espalhar por grande parte do Reino Unido, a maior população de tetraz está, justamente, na Escócia. Seu habitat natural é também característica do país – os campos de urze, que lhe servem de alimento. Por conta disso, o tetraz tornou-se o símbolo da Escócia. Assim, foi apenas uma questão de tempo até que ele se tornasse também o símbolo do produto nacional mais conhecido por lá – o whisky.

A tetraz é o símbolo dos blended scotch whiskies da Famous Grouse, já revistos algumas vezes por aqui. Apesar de um portfólio bem extenso – com grain whiskies e blended malts – apenas três expressões da Famous Grouse são encontradas oficialmente no Brasil. O tradicional Famous Grouse Finest, o defumado Black Grouse (agora rebatizado de Smoky Black), e o Famous Grouse 12 anos, a mais exclusiva das três.

A marca Famous Grouse teria sido criada por Matthew Gloag, sobrinho de outro Matthew Gloag, fundador de um empório chamado Matthew Gloag & Son, em 1842. Como você pode ver, criatividade em abundância corria pelas veias daquela família.

Matthew sobrinho, ao assumir o negócio de seu tio, resolveu que batizaria sua linha de blended whiskies em homenagem à ave simbolo de seu país. Não satisfeito, cheio de boas ideias e com um faro de raro bom gosto, teria pedido à sua filha Philippa que desenhasse o famoso galináceo para servir de símbolo.

Atualmente a Famous Grouse faz parte do Edrington Group. Em seu portfólio estão destilarias como The Macallan e Highland Park, além daquela que serve de lar espiritual para a marca do peru – quero dizer, tetraz – a Glenturret. No campo dos blended whiskies, o grupo controla também a marca Cutty Sark.

O peruzão da Glenturret.
O peruzão (ahem) da Glenturret.

Aliás, como já dito anteriormente por aqui, há um ponto interessante sobre o uso dos The Macallan. É que a destilaria utiliza somente os 26% centrais de seu processo de destilação para a fabricação de whisky. Neste percentual, os 17% centrais vão para os single malts. O restante (4,5% de cada ponta) é empregado na produção dos whiskies da linha Famous Grouse. Todo o resto – 75% – é descartado.

O Famous Grouse 12 anos é um whisky relativamente encorpado, bastante equilibrado, levemente puxado para o adocicado e com nenhuma – ou talvez pouquíssima – defumação.  Os principais single malts em sua fórmula são Glenturret, The Macallan e Highland Park. Este Cão também suspeita de que haja Glenrothes, ainda que isto não passe muito de um palpite educado.

No Brasil, uma garrafa de um litro do Famous Grouse 12 custa em torno de R$ 200,00 (duzentos reais). Uma pequena fração do que custaria uma caçada no Glorious Twelfth, e um preço alinhado com os demais blended whiskies de sua categoria à venda em nosso mercado. Para aqueles que procuram um blended whisky encorpado, equilibrado mas com personalidade, o Famous Grouse 12 é um tiro certeiro. Este sim, é o verdadeiro Doze Glorioso.

THE FAMOUS GROUSE 12 ANOS

Tipo: Blended Whisky com idade definida (12 anos)

Marca: Famous Grouse

Região: N/A

ABV: 40%

Notas de prova:

Aroma: mel, açucar mascavo, frutado.

Sabor: frutas secas e caramelo. Relativamente encorpado, com final progressivamente mais seco e com especiarias.

Com Água: Adicionar agua reduz o sabor frutado e ressalta as especiarias.

 Preço: em torno de R$200,00 (duzentos reais)

Disponibilidade: disponível no Brasil

Double Smokey Mondays – Cateto Pinheiros & O Cão Engarrafado

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Não tem nada para fazer na próxima segunda feira? Gosta de whiskies defumados? E de charutos? Se você atende aos três requisitos, provavelmente vai adorar participar desta edição da já tradicional Smokey Mondays, do Cateto Pinheiros .
 
Nesta edição o convidado é este Cão Engarrafado, que falará sobre a melhor coisa do mundo em estado líquido. Whiskies defumados. Serão provados três deles – Black Grouse, Laphroaig Quarter Cask e Ardbeg Ten, acompanhados, claro, de um belo charuto – H Upmann Half Corona.
 
O Cão explicará um pouco sobre os tipos de whisky, história e o processo de fabricação destas maravilhas liquefeitas, além de harmonização com o belo habano.
 
O preço disso tudo? R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), incluindo três doses (uma de cada whisky), o charuto, a apresentação e a alegria de aproveitar uma segunda-feira a noite. O evento será na segunda-feira, dia 06 de fevereiro de 2017, e começa às 19:30. A aula terá início às 20:30, e levará em torno de 1 hora.
Interessou? Quer saber mais? Então clique aqui para ver todas as informações sobre o evento e participe!
 

Whiskies sem Idade declarada (Ou qual a idade do Red Label?)

Idade do whisky - Red Label - O Cão Engarrafado

O Cão Engarrafado está fazendo dois anos. Por isso, nada mais apropriado do que um texto especial sobre idade, para coroar a data.

Luis Buñuel disse em seu livro O Último Suspiro que a idade é algo que não importa, exceto se você for um queijo.

Entendo a disposição e o otimismo da frase de Buñuel. Principalmente para um livro com aquele título. No entanto, não sei se concordo com ele. Nem quanto à parte dos queijos, nem das pessoas. Primeiro porque existem queijos jovens muito bons para o meu gosto. Mas afinal, o que eu realmente sei sobre queijos?

Nada.

E no alto de minhas três décadas e pouco, não sei muito sobre envelhecer também. O prognóstico, porém, não é muito animador. Porque pelo que pude perceber nos últimos anos, a paciência e o poder regenerador do sono somente diminuíram, enquanto que a circunferência abdominal e a ressaca cresceram exponencialmente. Por outro lado, gosto de pensar que tenho me tornado mais experiente.

Role model
Role model

Mas não é apenas com queijos e pessoas que a idade é um ponto controverso. Com whiskies também. Num passado não muito distante, fomos induzidos a acreditar que quanto mais velho, melhor. Apesar disso, muitos whiskies excelentes – e outros nem tanto – não possuem idade declarada em seus rótulos.

A prática é mais comum e antiga do que parece. Exemplos disso são o Chivas Regal Extra, Logan Heritage, Famous Grouse Finest, Macallan Amber, Sienna e Ruby, Glenlivet Founder’s Reserve, Laphroaig Quarter Cask e, é claro, os Johnnie Walker Red, Double Black, Gold Reserve e Blue Label. Aliás, um dos whiskies mais caros já vendidos em leilão – um Macallan M – não tem idade declarada. Mas afinal, quantos anos tem estes whiskies?

Bem, antes de responder esta pergunta, deixe-me explicar de uma forma bem porca o que significa a idade impressa – ou não – na garrafa de sua bebida preferida. Whiskies – a grande maioria deles, sejam eles blends ou single malts – são uma mistura de componentes de diversas idades. A diferença essencial é que em single malts, há whiskies de uma única destilaria*, enquanto que blends são a combinação de whiskies de procedências variadas.

De acordo com as Scottish Whisky Regulations de 2009, a idade informada no rótulo deve corresponder ao tempo de maturação do whisky mais jovem que está em sua composição. Por exemplo, no caso do Royal Salute 38 anos Stone of Destiny, o whisky mais jovem que está lá dentro possui trinta e oito anos, sem prejuízo de haver whiskies ainda mais maturados na mistura!

O produtor, entretanto, tem a liberdade de não informar a idade. Nestes casos, quando a informação não está lá, convencionou-se chamar estes whiskies de “no age statement” (em português “sem declaração de idade”) ou “NAS”.

Demi: NAS
Demi: NAS

Para estes, é virtualmente impossível determinar, com absoluta certeza, quantos anos tem o whisky. Mas podemos afirmar que é mais do que três anos. É que para que um scotch whisky possa ser chamado de scotch whisky, ele deve ser maturado por, no mínimo, um triênio em barricas de carvalho com volume menor ou igual a setecentos litros.

Mas vamos aqui deixar algo claro. Isso não significa, necessariamente, que o whisky sem idade declarada tenha apenas três anos. Aliás, é bem improvável que este seja o caso. É mais provável, no entanto, que haja alguma parcela de um whisky jovem. E que isso levou a destilaria, ou marca, a preferir esconder a idade do produto. Assim, aí está. Qual a idade do Red Label, por exemplo? Bem, no mínimo três anos.

Até aí, lindo. O Red Label é um whisky de entrada, então nada mais natural do que sua mascarada juventude. Só que a história começa a ficar meio surreal quando pensamos naquele Macallan M, arrematado por US$628.000,00. Este também tem, no mínimo, três anos.

Pode parecer loucura, e talvez até seja um pouco. Mas é também liberdade. E liberdade é um pré-requisito essencial para algo muito positivo em um mercado tão competitivo. Criatividade.

A liberdade de não se informar a idade permite que a destilaria – ou marca – crie produtos com mais criatividade. Whiskies jovens possuem características diferentes daqueles mais maturados. Os whiskies turfados e jovens de Islay, por exemplo, têm seu paladar defumado e medicinal bem mais pronunciado do que seus pares mais maturados. Então, se a ideia for criar um whisky com predominância de fumaça, whiskies jovens são a escolha natural. É provavelmente por isso que o Glenfiddich 125 e o The Macallan Rare Cask Black escondem seus tempos de maturação.

Além disso, a idade, per si, é um conceito relativo. Voltando ao exemplo lá de cima. Não adianta eu me enganar, pensando que à medida que envelheço, automaticamente me torno mais experiente. A única e inexorável certeza é que ficarei mais gordo. Minha banha, no entanto, não virá acompanhada de maturidade. A maturidade passa pela experiência. Colecionar anos sentado no sofá mirando o teto pode parecer confortável. Mas é também uma perda de tempo terrível.

Rumo à sabedoria
Rumo à sabedoria

E o mesmo ocorre com whiskies. Barris podem ser utilizados várias vezes, mas cada vez que são reutilizados, perdem um pouco da capacidade de transferir seus sabores para o destilado. Assim, talvez um whisky de trinta anos maturado em uma barrica de terceiro uso – ou melhor, reuso – não seja tão saboroso quanto um doze anos que passou sua breve vida em carvalho de primeiro uso.

Deixa eu tentar explicar usando um paralelo que me ocorreu agora. Saquinhos de chá. Imaginem que um dia chego em casa tarde. As crianças e a esposa dormindo. Eu, porém, estou tão esgotado quanto agitado, e preciso de algo para me acalmar e esperar o sono chegar.

Talvez por insanidade ou mal gosto, tomo a improvável decisão de, ao invés de whisky, beber um chá. Aqueço a água e adiciono um saquinho desses de camomila. O único que encontro. Espero um pouco e depois tomo.

Mas ainda estou um pouco insone, então resolvo que vou tomar outra xícara. Só que aquele era o último saco, então eu simplesmente completo aquele recipiente com água, e espero a infusão. Esta, por sua vez, demora bem mais tempo. Porque o saquinho já quase esgotou seus sabores da primeira vez que o utilizei. Então, para ter um chá tão forte quanto o primeiro, me vejo obrigado a esperar bem mais tempo. E acabo dormindo.

Com barris a coisa acontece mais ou menos assim, também. A influência de um barril de ex-bourbon de carvalho americano de segundo uso é – mais ou menos – setenta por cento inferior àquela de um de primeiro uso. No caso de terceiro uso, ou reuso, o percentual cai para dez. Aí vai um gráfico desenhado sem qualquer esmero no paint, para ilustrar:

idade
É quase assim, só que com escala.

Assim, unindo whiskies de idades diferentes com base em suas características, e não no tempo que passaram nos barris, as destilarias e marcas têm mais liberdade para perseguir o objetivo principal de qualquer produtor de whisky deveria ter antes de se preocuparem com esse papo de idade. Fazer algo que tenha um sabor bom.

Liberdade, porém, é algo complicado. Porque ela pode ser usada para o bem, mas também para objetivos mais, diremos, assim, egoístas. Acontece que os estoques de whisky muito maturado são limitados, e o seu consumo mundial – assim como minha barriga – só tendem a aumentar nos próximos anos.

A solução encontrada pela maioria das marcas e destilarias foi dada no começo deste texto. Misturar whiskies mais jovens com aqueles mais maturados, na tentativa de atender à crescente demanda, e não informar a idade no rótulo da garrafa. Cobrando um preço equivalente àquele do whisky com a idade estampada no rótulo, claro.

A tendência da indústria de lançar whiskies sem idade declarada é clara. Porém, preocupar-se muito com isso parece, a este Cão, um exercício de futilidade. Já provei whiskies sem idade declarada excelentes, bem como alguns com mais de duas décadas que não são nada além de – para usar uma palavra educada – interessantes.

Talvez devêssemos dar menos atenção ao número estampado no rótulo da garrafa, e mais ao seu conteúdo. Experimentar, ler, tentar entender mais. Separar, por nossa conta, o marketing daquilo que nos parece feito com cuidado e propósito. Aliás, como já disse uma vez em outro texto, não só em relação a whiskies, mas a tudo. Assim poderemos amadurecer.

Talvez a idade não importe muito mesmo. O que importa é o que fazemos com ela.

 

(*) eu sei que há single casks e whiskies cujos componentes têm a mesma idade. E eu sei que blended whiskies levam, além de single malts, whisky de grão. Mas vamos deixar as coisas didáticas, okey?

 

Drink do Cão – Bobby Burns

Bobby Burns - O Cão Engarrafado

Se você está procurando um pretexto para beber, chegou ao lugar certo. E na data perfeita. É que hoje é uma das noites mais especiais para os amantes de whisky. A Burn’s Night, criada em homenagem ao mais famoso poeta de toda história escocesa – Robert Burns. Se quiser saber mais sobre a comemoração, o bardo e sua paixão por embutidos de tripas e estômago de bode, leia nosso texto do ano passado sobre a Burn’s Night aqui. Senão, continue aqui comigo.

Robert Burns nasceu em 1759 em Ayshire, e foi um dos precursores do movimento romântico. Ele escreveu sobre temas de grande intensidade – e atuais até hoje – como liberdade, identidade nacional, iniquidade e igualdade de gênero. Mas, além disso, Burns também tratou de assuntos corriqueiros. Bem corriqueiros. Mesmo. Um exemplo é seu poema “To a Mouse” (Para um Rato) que ele teria escrito após se sentir mortalmente arrependido de ter acidentalmente pisado em uma toca de ratos, durante uma de suas caminhadas. Ou “To a Mountain Daisy” (Para uma Margarida da Montanha), concebido por ele após, em outra feita, esmagar uma flor. De onde podemos concluir que Burns devia passar o dia pensando em poesia, e realmente não prestava muita atenção por onde passava.

Bobby. Viajando.
Bobby. Viajando.

O bardo de Ayshire – como também é conhecido – foi também, naturalmente, um dos escoceses mais homenageados da historia. Há, por exemplo, uma infinidade de esculturas erigidas em sua memória no Reino Unido, uma linha de whiskies que leva seu nome (produzida pela Arran) e uma linha de charutos. E, além disso, há um coquetel. Um coquetel clássico, quase tão clássico quanto o próprio homem. O Bobby Burns.

Assim como a maioria dos coquetéis que são tão clássicos quanto poesia romântica, a história do Bobby Burns é incerta. A melhor teoria é que ele tenha nascido das mãos de Harry Craddock, e mais tarde figurado em seu livro “The Savoy Cocktail Book”, publicado em 1930. Craddock o descreve como “um dos melhores coqueteis de whisky”. Mais tarde, o drink foi revisitado por Dale DeGroff, em seu The Essential Cocktail. Os ingredientes permanecem os mesmos para as duas receitas, mas a proporção muda.

O Bobby Burns de Craddock – ao contrário da poesia romântica – é terrivelmente simples. São duas partes de seu whisky preferido, uma parte de vermute doce e 1/4 de dose de Benedictine D. O. M., um licor de eras cuja base é um brandy. Basta misturar com gelo, e descer em uma taça coupé.

Entretanto, ensinarei aqui a versão de DeGroff. Porque, bem, porque é a que eu mais gosto, e o blog é meu. Abram seus notepads e preparem o mis-en-place para mais uma etílica receita, desta vez, refinada pela habilidade de um dos mais importantes bartenders da história.

BOBBY BURNS

INGREDIENTES

  • 2 doses de whisky
  • 3/4 dose de vermute doce (este Cão preferiu usar o Carpano Classico. Mas fique à vontade para experimentar. Note que o Benedictine já é bem adocicado e que um vermute muito doce pode deixar o coquetel muito adocicado)
  • 1/2 dose de Benedictine D.O.M. (você pode substituir o Benedictine por outro licor herbal, mas o resultado será sensivelmente diferente. Drambuie funcionará bem, assim como – caso você seja milionário mas não queira gastar com Benedictine – Chartreuse).
  • gelo
  • mixing glass*
  • colher bailarina*
  • strainer*
  • Taça coupé (é a da foto, lá em cima) ou de martini

PREPARO

adicione todos os ingredientes em um mixing glass com bastante gelo. Misture por uns quatro segundos, desça na taça, coando o gelo com o strainer.

(*) Isso já foi dito aqui uma dezena de vezes. Mas não custa repetir. Use as ferramentas que tiver em casa. Uma jarra pode fazer o papel do mixing glass, uma colher comprida, da bailarina e uma simples peneira funciona como strainer.

Quatro Coquetéis (com whisky) para o Verão

Drinks Verão - O Cão Engarrafado

Estamos naquela época do ano. É janeiro, está calor e faz sol. A combinação perfeita entre a falta de trabalho e a inclinação climática ideal para ir à praia. E o meu Instagram não deixa dúvidas, todos estão bronzeados, felizes e devidamente alcoolizados neste incivilizado calor infernal.

Todos, menos eu. Primeiro porque eu não fico bronzeado – eu fico queimado mesmo, tipo um leitão que ficou muito tempo no forno. E o calor insiste em atrapalhar minha felicidade que passa, em grande parte, pelo conforto térmico. Pelo conforto térmico e pela possibilidade de beber algo mais acalentador. Como whisky. Porque beber whisky é bom em qualquer temperatura, mas é bem – realmente bem – melhor quando está frio.

E aí, longe da praia e transpirando, penso em alternativas para tomar minha bebida preferida sem recorrer ao gelo ou congelador. E a melhor saída, é, sem nenhuma dúvida, a coquetelaria. A coquetelaria é quase uma espécie de bruxaria que consegue tornar completamente palatável até o mais defumado e alcoólico whisky, mesmo na temperatura do inferno dantesco.

Se você é como eu, talvez este post lhe seja de utilidade. Aí vão três drinks já revistos nestas páginas – e um inédito – para lhe refrescar nesta época tão ruborizante. Os links levarão às receitas de cada um.

MINT JULEP

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Talvez o coquetel que leva whiskey mais refrescante de todos. É quase como água com hortelã que você toma naquelas festas chiques, mas com um ingrediente especial. Whiskey. O que o torna muito melhor do que aquela água com hortelã, claro.

O Mint Julep se popularizou em 1875, quando o Kentucky Derby, a mais famosa corrida de cavalos do mundo, foi criada. Em 1938 ele tornou-se o drink oficial do evento. Seu sucesso reside, em grande parte, na facilidade de preparo e na sua suavidade. Preparar um mint julep é quase tão rápido quanto percorrer um quarto de milha com um cavalo campeão, mas muito mais fácil. Para a receita, clique aqui.

PENICILLIN

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O Penicillin, assim como o Mint Julep, também tem um primo não alcoólico. Neste caso, aquele remédio para garganta da sua avó, com mel, limão e gengibre. Ele é, na verdade, um duplo upgrade daquela panaceia, por levar dois tipos de whisky. O primeiro, algum blended scotch whisky. O outro, um whisky defumado – que, na receita original, é o single malt Laphroaig.

Ao contrário do Julep, no entanto, o Penicillin é um coquetel bastante jovem. Ele foi criado pelo bartender Sam Ross em 2005, em Nova Iorque, e alcançou fama mundial em menos de uma década. E não é para menos. O Penicillin é um dos coquetéis preferidos deste Cão, e a prova de que tudo fica melhor com whisky. Veja a receita aqui.

GREEN GIMLET

green gimlet

O Green Gimlet é a variação com whisky de um coquetel bastante conhecido. O Gimlet. A receita original leva gim, e teria sido criada por um almirante da marinha inglesa, Sir Thomas Desmond Gimlette. A intenção seria prevenir o escorbuto, resultante da falta de vitamina C no corpo. Como é de se esperar da criação de alguém que passava a maioria de seu tempo em um navio sob um sol insuportável e calor infernal, o Gimlet é um drink bem refrescante.

A receita que você poderá conferir leva scotch whisky ao invés do gim. Ela foi criada por Michel Dozois. Talvez este nome não lhe soe familiar. Mas, se você é fã de Mad Men, saiba que Michel é o responsável por ter produzido os cubos de gelo que aparecem nos copos de Don Draper. É isso mesmo, a série tem um profissional cem por cento dedicado à produção de gelo.

Veja a receita do Green Gimlet aqui.

LIL’ IRISH

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Se você está disposto a testar coisas novas, este coquetel é para você. Ele foi criado por Fernando Lisboa, bartender e consultor em coquetelaria no tempo livre para este infame blog. De acordo com ele, em um momento de moderada ponderação: Esse é um drink para se tomar em festa. E dá para tomar um balde dele. 

E quem afinal é este Cão para discordar desta peça de sabedoria?

INGREDIENTES

  • 60ml jameson
  • 15ml xarope de alecrim
  • 80ml suco de pera
  • Limao siciliano espremido a francesa

PREPARO

Para o xarope de Alecrim

Aqui você tem duas alternativas. Uma delas é fazer duas fervuras. A primeira será algo muito semelhante a um chá de alecrim. Adicione alguns ramos em uma panela com 1 (um) litro de água e leve ao fogo. Deixe ferver por alguns minutos. Retire os ramos e deixe esfriar um pouco. Adicione então pouco menos do que 1kg de açúcar (note que a proporção para o xarope é de um para um, considerando a evaporação por conta da primeira fervura). Aqueça novamente, até que a calda fique translúcida. Isso é bem antes do ponto de fio. Fique de olho.

A outra alternativa é bater tudo em um liquidificador. Então, adicione os ramos de alecrim e o quilo de açúcar. Depois, adicione um litro de água fervendo e bata até que o alecrim tenha sido completamente triturado. Agora vem a parte difícil – você precisará coar a calda até que os resquícios maiores das folhas do alecrim sumam. Uma peneira talvez dê conta do recado, mas talvez seja necessário usar gaze ou mesmo filtro de café.

Para o coquetel

Em um copo alto – highball – adicione bastante gelo, um ramo de alecrim, o jameson, o xarope e o suco de pera. Mexa suavemente. Pegue 1/4 de um limão e esprema sobre o coquetel. Depois, derrube a fatia dentro do copo.

Drops – Glen Scotia Victoriana

Glen Scotia Victoriana 2- O Cão Engarrafado

A era vitoriana foi bem esquisita. As pessoas possuíam uma pletora de hábitos estranhos. Por exemplo, como não existia televisão, Netflix, internet, smartphones e toda essa parafernália que nos auxilia a evitar o desagradável contato humano diário, os vitorianos tinham que recorrer a formas alternativas de diversão. Um costume bem comum era o de se fantasiar e posar para os outros. Pode parecer tranquilo, mas você gostaria de ver seu sogro vestido de odalisca? Bom, eu não.

Outros hábitos estranhos incluíam fotografar os mortos como se estivessem vivos, correr atrás dos adolescentes até que eles estivessem cansados demais para se masturbar (é sério isso!) e comer cérebro de tartaruga. Credo, que nojo.

Apesar dos costumes curiosos, a era vitoriana teve uma  prolífica produção cultural – com escritores como Oscar Wilde e Charles Dickens – e uma inegável evolução econômica e científica. Foi durante aquele período que inventaram coisas como a lâmpada, o telefone, pneus de borracha e a máquina de escrever. O petróleo e seus derivados também passaram a ser mais amplamente utilizados.

Foi quando nasceu também o chá da tarde!
Foi quando nasceu também o chá da tarde!

Mas a maior contribuição da era vitoriana foi, sem dúvida, o whisky. Não é que o whisky foi inventado naquele período, não, claro que não. Ele foi criado muito antes disto. No entanto, foi em meados do século XIX que ele se popularizou. E o principal responsável por isso é tão pequeno quanto improvável. Phylloxera (Filoxera, em português), um pequeno inseto, que se alimenta de plantas. É que naquela época, a bebida de preferência era o brandy, especialmente o conhaque. Sua matéria prima, como você deve saber, são uvas viníferas.

Acontece que a filoxera, lá por 1860, tornou-se uma praga na França, dizimando quase metade de todos os vinhedos do país. Devastada e sem matéria prima, a produção de conhaque caiu drasticamente no período. E como os ébrios vitorianos não poderiam ficar sem algo para potencializar seu joie de vivre, logo encontraram um substituto. O whisky.

E é dessa história que vem a inspiração do Glen Scotia Victoriana, produzido pela destilaria Glen Scotia. Ele é uma homenagem aos whiskies produzidos na era da rainha Victória, ainda que seu sabor provavelmente seja bem melhor do que destes últimos.

A Glen Scotia é uma das únicas três destilarias sobreviventes de Campbeltown, cidade que fora, por muito tempo, considerada a capital mundial do whisky. A região, que chegou a contar com trinta e quatro destilarias durante a década de cinquenta, hoje possui apenas três delas. Springbank, Glen Scotia e Glengyle. Esta última, ressuscitada apenas no começo deste século.

Destilarias ativas, inativas e demolidas de Campbeltown (fonte: whisky.de)
Destilarias ativas, inativas e demolidas de Campbeltown (fonte: whisky.de)

O Glen Scotia Victoriana é maturado em barricas de carvalho americano que antes contiveram bourbon whiskey, como muitos whiskies. No entanto – e de uma forma relativamente incomum – ele é então finalizado em barris altamente torrados. É um processo semelhante àquele que acontece no Talisker Dark Storm.

O uso das barricas torradas dá ao whisky um incomum sabor defumado. Incomum por ser bastante diferente daquele proveniente dos whiskies turfados. Não há nada de medicinal, e a fumaça se assemelha mais ao aroma de caramelo queimado. O Glen Scotia Victoriana é engarrafado na corajosa graduação alcoólica de 51.5% e não é filtrado a frio.

Infelizmente, nenhuma expressão de Campbeltown – muito menos os Glen Scotia – estão disponíveis em nosso país. Mas talvez isso possa, algum dia mudar. Quem sabe. Afinal, merecemos tanto quanto o povo daquela fascinante era passada.

GLEN SCOTIA VICTORIANA

Tipo: Single Malt sem idade definida

Destilaria: Glen Scotia

Região: Campbeltown

ABV: 51.5%

Notas de prova:

Aroma: levemente cítrico, castanhas, mel, especiarias

Sabor: caramelo queimado, açúcar mascavo, laranja lima, com final relativamente longo e carregados nas especiarias. Álcool em evidência, apesar de equilibrado.

Disponibilidade: apenas lojas internacionais.

Receita do Cão – Whisky Scones

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Esta receita do Cão Engarrafado foi originalmente publicada nos sites M de Mulher e Everest 180 graus. Mas gostamos tanto do resultado que resolvi reproduzi-la também aqui, com aquela tradicional introdução.


Pense rápido, qual é a coisa mais inglesa que você conhece? Muitos pensarão nos Jaguares ou Mini Coopers. Outros, talvez, relembrarão do Mr. Bean. E ainda haverá aqueles que citarão um buldogue. Um buldogue ou talvez a rainha.

Para mim, no entanto, a coisa mais inglesa do mundo sempre foi o chá da tarde. Nada é mais indissociável aos habitantes do Reino Unido do que aquela tradicional refeição vespertina.

O que poucos sabem é que essa tradição, na verdade, é relativamente nova. Ela foi criada lá por mil oitocentos e quarenta, pela – discutivelmente – famosa Duquesa de Bedford.

A duquesa
A duquesa

A duquesa, uma pessoa que obviamente tinha uma certa fixação por comida, sentia fome algumas horas depois de terminar seu almoço. E, por conta disso, achou razoável, ao invés de comer um pouquinho mais no almoço para aguentar até o jantar, introduzir uma refeição completamente nova entre as duas.

O lanchinho inventado pela duquesa era composto de chá e alguns pães, doces e salgados. E, entre eles, estavam os scones, uma espécie de bolinho feito com farinha, açúcar, fermento, sal, manteiga, leite e, algumas vezes, ovos. Com o tempo o chá da tarde foi se sofisticando e tornou-se um hábito dos britânicos. E os scones pegaram carona em sua tradição.

Scones são muito versáteis. Eles podem ser usados como pão, e ficam uma delícia com manteiga. Ou como um doce, com um pouco de geleia. Minha preferida é a de laranja. Com lemon curd também fica fantástico. Você pode inclusive adicionar chocolate ou nozes, ou até uvas passas – perfeito para esta época natalina.

Alías, existem receitas de scones mais puxados para o salgado, e outras para o doce. Mas, na minha singela opinião, todas as receitas carecem de um ingrediente indispensável. Um ingrediente facilmente encontrável no país vizinho daquele que teria inventado o chá da tarde. Whisky. Porque como já disse uma vez por aqui– whisky melhora tudo que se pode comer. Whisky é quase um photoshop gastronômico.

Assim, peguei como ponto de partida a receita que teria sido – mais uma vez, discutivelmente – aperfeiçoada pela rainha Victória em pessoa, e fiz algumas adaptações. Preparem-se para a coisa comestível mais inglesa – com um toque escocês – da história. Com um nome que ainda tem uma aliteração bacana.

WHISKY SCONES

INGREDIENTES

  • 2 xicaras de chá de farinha
  • 1 colher de sopa de açúcar
  • 1 colher de chá de fermento em pó
  • ½ colher de chá de sal
  • 4 colheres de sopa de manteiga
  • 2/3 de xícara de leite integral
  • 1 a 2 doses de blended scotch whisky*

 PREPARO

  • Adicione os ingredientes em pó num bowl (ou pote), e misture bem.
  • Adicione o leite, a manteiga (em pequenos pedaços) e o whisky e misture até que fique homogêneo, como se fosse – na verdade, é – uma massa de pão.
  • Divida a massa em oito pedaços idênticos e enrole, fazendo pequenas esferas
  • Unte uma forma com farinha e coloque as esferas.
  • Com um pincel, pegue um pouco de leite e sele levemente as esferas.
  • Pré-aqueça o forno por 10 minutos
  • Deixe a forma em forno baixo por mais ou menos quinze minutos. Isso, obviamente, dependerá do forno. O ideal é que ele fique apenas dourado por cima.

Pronto! Sirva com geleia de laranja ou manteiga e, claro, uma dose do seu whisk(e)y preferido!

(*) você pode escolher o whisky de sua preferência. Apesar de indicar um blended scotch, sinta-se à vontade para testar. Com um Bourbon whiskey também ficará excelente.