Do Reconhecimento – Jack Daniel’s Gentleman Jack

Se você não se tornou famoso ainda, não se preocupe. Talvez isso aconteça mesmo só depois de morrer. Foi assim com Van Gogh, Edgar Allan Poe, Kafka, El Greco e Galileo Galilei. A distância – no caso, o tempo – nos permite enxergar com mais clareza a grandeza destas pessoas que, infelizmente, não puderam colher os louros de seus prolíficos trabalhos. E neste enorme rol de injustiçados pela sociedade e vingados pela história, está Bach. Johann Sebastian Bach, conhecido por alguns como um dos maiores compositores de todos os tempos e por outros como o cara que fez a música do comercial daquela operadora, nunca recebeu o devido reconhecimento em vida. Foi só no século dezenove – ou seja, uns cinquenta anos após sua morte – que sua música foi revivida e alcançou a fama. Certa vez Bach teria se candidatado ao posto de diretor de canto e música em Leipzig, mas somente foi aceito após outros dois candidatos – claramente preferidos pelo conselho da cidade – terem rejeitado a indicação. No melhor estilo barroco de “é o que tem para hoje”, o conselho o considerou uma alternativa razoável, dadas as circunstâncias. E nem o mundo do whisk(e)y está a salvo […]

Drops – Goliat Bourbon Aged Imperial Stout

Aí vai um pouco de pornografia etílica para sua terça-feira. Uma cerveja escura, com mais de dez por cento de graduação alcoólica, e maturada em barricas de carvalho americano que antes contiveram bourbon whiskey. Esta é a Goliat Bourbon Aged Imperial Stout, uma denominação bem grande para um produto de uma cervejaria com um nome bem pequeno. To Øl. Caso você esteja se perguntando como pronunciar este O cortado, a gente te conta: é Tu Ul.  A To Øl é uma cervejaria dinamarquesa, fundada em 2010 por dois amigos, Tobias Emil Jensen, Tore Gynther, com um pequeno empurrãozinho de seu professor, Mikkel Borg Bjergsø (sim, se você gosta de cerveja, já deve ter reconhecido o nome do fundador da Mikkeller aqui). Durante estes seis anos, a marca ganhou reconhecimento e fama internacional, e hoje é considerada uma das melhores cervejarias do mundo. O engraçado sobre a To Øl é que ela é, na verdade, algo conhecido como cervejaria cigana. Isso significa que ela não possui fábrica própria, mas aluga o equipamento e as dependências de outras cervejarias durante pausas em suas produções. Antes de falar mais sobre a Goliat, deixe-me traduzir os dizeres nela impressos: O Grande guerreito de Gath. O mítico campeão dos […]

Verdade Relativa – Bulleit Bourbon Frontier Whiskey

O cinema deve muito ao faroeste. Alguns dos melhores filmes da história usaram a temática daquele tempo sem lei. Um tempo em que destemidos e elegantes vaqueiros enfrentavam índios, perseguiam bandidos e encantavam frágeis donzelas indefesas. Um tempo em que a morte pelo gatilho era corriqueira, e que apenas homens resilientes e com valores íntegros sobreviviam. Ou não. Ou não porque, assim como o cinema deve ao faroeste, o faroeste também deve ao cinema. Para começar, ninguém realmente se vestia ou se portava como Clint Eastwood ou John Wayne. Os valentes vaqueiros eram, na verdade, em sua grande maioria, absolutamente iletrados, mais ou menos bêbados, e raramente prezavam por quaisquer valores ou moral. Além disso, a criminalidade era relativamente baixa, e os conflitos com índios, praticamente inexistentes. A imagem que temos hoje daquele tempo foi cunhada no cinema. O maior expoente, responsável por criar o gênero western como o conhecemos hoje, foi John Ford. De acordo com um grande amigo, crítico de cinema e entusiasta do álcool, Ford inventou o faroeste como gênero a ser levado a sério com No Tempo das Diligências (apresentando John Wayne ao mundo, em um entrada inesquecível e triunfal) e, depois, ainda inventou o faroeste […]

Um Desvio à Moda Antiga – Brooklyn Brewery Improved Old Fashioned

Esses dias acordei e, como não encontrasse nada na geladeira que me apetecesse, fui com fome ao supermercado. E isso, como vocês devem saber, é péssimo. Ao invés de cuidadosamente separar os itens para um café da manhã saudável, resolvi fazer um voo solo pelas gôndolas que mais me interessavam naquele momento. A dos salgadinhos. Parei lá, contemplando em silêncio as dezenas de opções para aquele desjejum nutritivo. Dentre inúmeros saquinhos coloridos, um chamou minha atenção. Batatinhas sabor picanha. Sabor. Picanha. E enquanto salivava pensando em um churrasco instantâneo, comecei a pensar o que faria aquilo ter, especificamente, o gosto de picanha. Porque picanha é uma coisa bem específica. O que diferenciaria, por exemplo, um salgadinho sabor picanha de um com gosto de contrafilé? E aí, quando voltei para casa, resolvi pesquisar este fascinante mundo da comida deliciosamente artificial. A internet, prontamente, me apresentou um mundo de produtos estranhos. Batatinhas de sabores tão improváveis quanto borsh (isso é uma sopa), chocolate ao leite, salada césar – porque, se é para ser trash, melhor algo com sabor de comida saudável – e uma opção que quase me levou ao nirvana psicológico-gastronômico: chips com gosto de vieiras com alho e manteiga. Acompanhei, […]

Sobre o Frio – Irish Coffee

Não sei se vocês estão sentindo. Mas aqui está bem frio. E ainda que eu claramente prefira essa congelante brisa invernal – apesar de não estarmos ainda no inverno – ao calor senegalês do verão, há uma série de coisas que eu realmente prefiro fazer quando está mais quente. Como, por exemplo, ir ao banheiro. Eu odeio ir ao banheiro de casaco. Aliás, vou contar uma coisa mais ou menos porca para vocês. Nada relacionado a higiene pessoal é legal no frio. Escovar os dentes exige que se bocheche e, consequentemente, suas mãos sejam congeladas. Acordar de manhã e percorrer a distância até o chuveiro – e aguardar o chuveiro esquentar – só para passar frio novamente ao sair é torturante. No entanto, há uma infinidade de atividades que ficam bem melhores no frio. Cole Porter já descreveu uma delas, ao dizer que “de acordo com os Estudos de Kinsey, todo homem médio que se conhece, prefere praticar seu esporte favorito, quando a temperatura está baixa”. As outras são, por exemplo, dormir, assistir filmes no conforto do lar e, claro, beber whisky. Aliás, o frio é um ótimo pretexto para se consumir a melhor bebida do mundo. Acontece que, às vezes, […]

O Cão Didático – Cereais usados no Whisky

Conhecimento é sempre bom. Mesmo sobre assuntos enfadonhos, como botânica. Esta foi minha conclusão após uma viagem com alguns amigos para o sítio de um deles, lá pelos meus dezoito anos de idade. Como quase todo adolescente recém-chegado à maioridade legal, nosso foco principal era beber. Beber qualquer coisa. Não tínhamos muitos critérios. Só podia ser natural. Afinal, não havíamos tido tempo de criar quaisquer critérios.  Nosso manifesto de viagem contava com umas quatro garrafas da vodka – da mais barata encontrada no supermercado local – bem como uma dúzia de engradados de uma cerveja que poderia ser definida, de forma muito benevolente, como a pior coisa que já bebi depois de gasolina (leia mais sobre isso aqui). Com o problema líquido solucionado, nosso próximo passo seria decidir o que comer. E ainda que a ideia de adquirir um estoque de salgadinhos fosse tentadora, em um lampejo de consciência, resolvemos que teríamos tempo de sobra para cozinhar. Assim, resolvemos preparar uma massa. Uma pequena caixa de spaghetti e alguns tomates dariam uma refeição decente e descomplicada. No primeiro dia, demos cabo de boa parte da cerveja e duas garrafas daquela maravilha cristalina destilada e – bastante animados – começamos a […]

Da excelência e notoriedade – Manhattan

Há poucas coisas e pessoas no mundo que são tão distintas que realmente dispensam apresentações. São aqueles ícones, quase divindades em seus respectivos altares. O tempo, catalisador do oblívio, não os apagou. Pelo contrário, os alçou à categoria de lendas. Algumas delas são Bach, Ferrari, Dostoievski, Coca-Cola, Orson Welles, Cohiba e bacon – sim, caso você não tenha notado a letra minúscula, refiro-me a bacon. Isso. As costas do porco. No mundo da coquetelaria, talvez o coquetel mais emblemático do mundo seja o Manhattan. O Manhattan é a música clássica do mundo dos coquetéis. Atemporal, elegante e profundo. Três adjetivos que lhe garantiram a entrada no rol das mais distintas coisas do mundo, trazendo-lhe à imortalidade. Apesar de sua fama incontestável, não se sabe a origem do Manhattan. A história mais famosa é que ele tenha sido elaborado no Manhattan Club, em Nova Iorque, no ano de 1874, para a comemoração do aniversário de uma – também bastante distinta – senhora. Madame Jennie Jerome, mais conhecida por ser a mãe de Winston Churchill. Acontece que, como ensina David Wondrich, em seu – também icônico – livro Inbibe!, Madame Churchill não poderia estar em Nova Iorque naquele ano. Simplesmente porque estava […]

Sem Medo – Finalistas do Jameson Bartenders Ball

O cinema está cheio de improvisação. Algumas das cenas mais antológicas nasceram de atores, que, numa impressionante demonstração de técnica e audácia, fizeram o improvável. Uma das histórias que mais gosto é a de Laranja Mecânica. A sequência em que Malcolm MacDowell ataca um escritor e sua esposa não estava totalmente planejada. Kubrick teria passado quatro dias filmando e refilmando a mesma cena, mas, como é natural àquele cineasta, ele não estava satisfeito. Exausto e irritado, ele então disse a Malcolm “sinceramente, faça o que você quiser”. E então o ator refez a cena. Uma cena de espancamento. Sem medo, dançando e cantando. Aliás, cantando a única música que conseguia lembrar. A de “dançando na chuva”. E assim, uma das mais memoráveis cenas de um dos mais memoráveis filmes surgiu. Uma vez, o ator Christopher Walken disse “Improvisar é maravilhoso. Mas o problema é que você não consegue improvisar, a não ser que você saiba exatamente o que está fazendo. Esse é o tipo de coisa paradoxal sobre improvisar”. E apesar da frase de Walken, aparentemente, não fazer muito sentido, ela, paradoxalmente faz. A improvisação, ou melhor, a boa improvisação, exige conhecimento, experiência e técnica. E, além de tudo isso, […]

Da Improvisação – Wild Turkey 101 Rye Whiskey

Quando eu era criança, assistia muita televisão. Via todo tipo de programa. Pra falar a verdade, via qualquer coisa que estivesse passando. Mesmo porque eu não tinha muita escolha. Com apenas umas três ou quatro opções de canais, me encontrava constantemente no dilema entre ver jornal, jardinagem ou aquele mesmo filme, reprisado pela centésima vez. Aquele, com uma turminha do barulho, vivendo altas aventuras com Patrick Swayze, Winona Ryder e  Daryl Hannah. Dublado pela VTI-Rio*. Mas havia também aqueles programas que eu realmente gostava. Entre eles, ocupando posição de destaque, estava MacGyver.  Caso você não viva neste mundo, ou tenha nascido após o advento da televisão a cabo, eu explico. MacGyver foi uma série cujo protagonista – Angus MacGyver – era um agente secreto, interpretado por Richard Dean Anderson. Suas missões consistiam, resumidamente, em derrotar inimigos de sua pátria ou prevenir hecatombes. Até aí, MacGyver parecia um agente secreto ordinário da ficção científica, como muitos Bonds e Bornes por aí. Só que Angus era diferente. Por ter sofrido um trauma de infância envolvendo um revólver, ele não utilizava armas. Assim, a solução de seus problemas passava, quase sempre, por preparar alguma gambiarra sinistra, normalmente criada com o auxílio de seu canivete suíço. […]

Especial Jameson Bartenders Ball – Liffey – O Cão Engarrafado

Este é o terceiro e último post sobre os coquetéis provados durante o Jameson Bartenders Ball Bar Crawl, que, a convite da Jameson Irish Whiskey, tivemos o prazer de participar. O primeiro foi o Barrel Cocktail, de Vinícius Gomes e o segundo, Irish Pleasure, de Jean Dall Acqua. O drink dessa semana é o Liffey, elaborado pela bartender Barbara Salles, chefe de bar do Alberta#3. O Liffey é um coquetel cítrico e adocicado. Coincidentemente, é um contraponto perfeito com o coquetel de Dall Acqua (cítrico e com especiarias) ou o de Vinicius (seco e levemente amargo). Há um leve sabor de pimenta, mas que está longe de deixar o coquetel realmente picante. O que é bom. Segundo Bárbara, o coquetel foi elaborado com uma combinação de ingredientes que agradasse o paladar da bartender, mas que fosse também compatível com o gosto da maioria dos brasileiros, que tendem a preferir bebidas doces. Nas palavras de Bárbara “Como a maioria dos brasileiros têm um paladar mais adocicado, pensei em um coquetel que conseguisse satisfazer a todos. O cítrico do limão siciliano ajuda a suavizar o sabor do álcool e escolhi o xarope de maracujá por seguir uma linha mais cítrica, além de bem […]