Keepers of the Quaich – Knighthood

“Sobre aquilo que não conseguimos falar, devemos manter silêncio“. A frase é a derradeira do Tractus-Logico-Philosophicus, do filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein. “Wovon man nicht sprechen kann, darüber muss man schweigen“. Por muito tempo, sua tradução para o inglês – incontestavelmente mais charmosa do que na língua lusa – foi uma das minhas preferidas. “Whereof one cannot speak, one must be silent“. Como a maioria dos aforismos, entretanto, possuía apenas uma rasa ideia de seu significado. Minha impressão é que se referia ao limite da linguagem. Uma ideia se torna uma proposição apenas quando pode ser liquidada em palavras – que devem ser compreensíveis também para seu receptor. Senão, não passa de um pensamento abstrato, incomunicável. Resumindo o papo-cabeça, eu achava que a frase dizia que o pensamento é baseado na linguagem, e a linguagem é que define a ação. Mas, na verdade, não é bem isso. Quer dizer, é isso também, mas não só. Pra você, que me deu seu voto de confiança e chegou a esse terceiro parágrafo sem cair no sono ou desistir deste meu devaneio, eu explico. Wittgenstein dizia que mesmo quando emissor e receptor dominam a linguagem, o conceito das palavras é diferente para cada pessoa, […]

Union Pure Malt Vintage 75 Anos – Cadeira Dobrável

Paredes de azulejo que comprimem um balcão com acepipes em uma estufa. Mesas de metal, dispostas de forma meio aleatória, adornadas pelo saleiro e o pimenteiro em seu centro. No cardápio, iguarias como torresmo, coxinha e o internacional bolovo – que na Escócia, é Scotch Egg. Prateleira com Cynar e Campari. E para dar vida à instituição, com o cotovelo sobre o balcão, o chato. Aquele cliente que você não sabe se está sóbrio ou bêbado, mas que te abraça de uma forma constrangedora e as vezes te cutuca na altura do estômago, só para reforçar algum devaneio. Este é o boteco. O boteco é uma instituição bem antiga. É herdeiro da bodega, que veio da taverna. Na idade média, a turma já se divertia no botequim. Mas há um elemento – presente no cenário boêmio – que surgiu ainda antes deste maravilhoso espaço de convívio. A cadeira dobrável. Acontece que em 2022, arqueologistas encontraram na Bavária – só podia ser lá – os restos do que seria uma cadeira dobrável anciã. A peça datava de 600 antes de cristo, e foi considerada uma raridade. Mas, não era única. Ao redor da Europa, mais de 29 cadeiras dobráveis foram encontradas […]

Entrevista com George Harper – Master Blender da Johnnie Walker

Trinta e quatro graus, às onze da manhã. De blazer na parte externa do hotel Tivoli, em São Paulo, observava, imóvel, o corre-corre à minha frente. Era o primeiro dia da mundial do World Class, a mais famosa competição de bartenders do mundo – que, este ano, ocorria em São Paulo. Esses gringos devem achar que a gente assa à sombra no verão – pensei, enquanto tentava fazer o mínimo de movimento possível, a fim de manter minha temperatura corporal abaixo da superfície de Mercúrio. Sentia o suor percorrendo minhas têmporas e se precipitando sob meu maxilar. Gente, tá tão calor aqui ou eu que tô tendo um treco? Decidi tentar pensar em assuntos amenos, para refrescar. Um higball. Mas aí lembrei de um Highball de Johnnie Blonde, e terminei na razão de minha visita. Entrevistar o Blender da Johnnie Walker, George Harper. E aí, comecei novamente a transpirar. Harper é o blender responsável pela criação de algumas das mais recentes inovações da marca do andarilho. Dentre elas, o Johnnie Blonde e o White Walker. É uma responsabilidade enorme criar whiskies com tamanha escala de produção. Mas nos primeiros minutos de entrevista, já fiquei mais sossegado. Harper é um cara […]

1792 Small Batch Bourbon – Receita Secreta

A sofisticação é feita de pequenos detalhes. Ao fazer bacalhau, você deve primeiro grelhar as postas, por dois a três minutos para cada lado, em fogo médio, tirá-las do fogo e manter aquecidas. Imediatamente, na mesma frigideira, adicionar manteiga, alho e, por último, suco de limão, e mexer. As postas não voltam à panela, mas é este molho cítrico, cuidadosamente espalhado pela superfície levemente tostada da peça, que complementará seu sabor de uma forma surpreendente. Já quando o assunto for decorar uma sala de jantar, você deve lembrar que precisa de três a cinco diferentes pontos de luz. Um bem acima, outro focado – ou sobre – a mesa e o último de um dos lados, para trazer certa dramaticidade. Cadeiras acolchoadas também são importantes – afinal, ninguém quer ficar com o traseiro doendo ao comer o melhor bacalhau da vida. A dica é pensar se você ficaria confortável nelas, se fossem seu assento num vôo de longa duração. Os parágrafos anteriores podem parecer aleatórios. E na verdade, até são, um pouco. Mas seu conteúdo foi retirado, incrivelmente, de duas matérias publicadas recentemente no site 1792 Style – pertencente ao 1792 Small Batch Bourbon. É que a marca – que […]

Tamnavulin Sherry Cask – Canudinho

1937. Joseph Friedman, nascido em Ohio, observava sua filha Judith tentar tomar um milk shake no Varsity Sweet Shop, em São Francisco. Tentar, porque a mesa era alta, e Judith, baixinha, e na década de trinta, todos os canudos eram retos. Judith tentava subir na mesa, ajoelhando-se na cadeira. Mas, mesmo assim, não alcançava o zênite da bebida. Friedman – um perspicaz inventor – então, fez algo curioso. Pegou um parafuso, sabe-se lá de onde, colocou dentro do canudo, e o enrolou com fio dental, até ficar bem apertado. Depois, tirou o fio dental e removeu o parafuso. O resultado, além de um parafuso grudento, foi um canudo com pequenas ondulações, que podia ser dobrado sem interromper o fluxo. Judith finalmente podia aproveitar aquele nutritivo alimento, base de toda dieta infantil, sem dificuldades por sua estatura. Em 1939, Friedman fundou a “Flexible Straw Company” (a Cia. dos Canudos Flexíveis) e patenteou sua invenção. Apesar do enorme sucesso – e retorno financeiro – Joseph não é um inventor muito célebre. Atualmente, há canudos flexíveis por toda parte – até onde não são bem-vindos – mas poucos sabem de sua participação na história. Friedman é, de certa forma, como o Tamnavulin. Uma […]

Lamas The Dog’s Bollocks II – Folie a Deux

Folie à Deux é um termo francês, que se originou na psiquiatria. Fazendo biquinho e fechando o último “e”, a expressão ganha todo um charme. Folie a dê.  É de uma extravagância rara para qualquer condição psicológica. O significado também tem uma certa excentricidade, mesmo sem a sedutora língua gaulesa. O “Delírio a dois”, ou mais, precisamente, transtorno delirante induzido ou perturbação delirante partilhada, é uma condição médica onde duas pessoas que se relacionam passam a partilhar da mesma insanidade. Ficam doidos juntos. Há vários casos interessantes de Folie à Deux. Muitos deles envolvem assassinatos e outras atitudes grotescas. Outros são mais prosaicos, como o caso de Margareth e Michael. O casal acreditava que a casa em que viviam era vigiada incessantemente por pessoas aleatórias, que muitas vezes faziam maldades dignas dos gnomos de contos de fadas. Tipo sumir com o controle da TV, deixar o banheiro sujo ou colocar a chave do carro na cozinha, só pra vê-los revirando a casa toda. Quem é casado, como este Cão, sabe bem quem são esses terceiros misteriosos. O que é curioso da condição é que existe um sistema de retroalimentação. Uma pessoa induz a outra àquela insanidade, e ambas começam a […]

Glenlivet Caribbean Reserve – O Amor

A Céline Dion tem uma música que diz que o amor pode mover montanhas. Com todo respeito, eu acho que a Céline errou. O amor é muito superestimado. Sem a menor sombra de dúvidas, o álcool supera qualquer forma de afeto como força-motriz da humanidade. Pegue, por exemplo, a história das ilhas caribenhas e do Reino Unido. Em 1655 a Grã-Bretanha capturou Jamaica, e começou um caso de amor (talvez ele mova montanhas) com o rum. A bebida já era produzida naquela ilha, que possuía abundância de cana-de-açúcar. A Marinha Real britânica não hesitou em substituir o aristocrático brandy francês pelo refrescante e tropical rum. Os marinheiros eram diariamente abençoados com doses de destilado, muitas vezes combinadas com limão. Os marinheiros viam no rum não apenas um antídoto contra o escorbuto, mas também uma fonte de alegria em suas vidas a bordo de navios desprovidos de luz, com comida escassa e o constante medo de criaturas marinhas lendárias. O rum tornou-se tão famoso que passou a ser usado como moeda de troca pelos corsários britânicos. Esses, um tanto menos comedidos do que os militares da respeitosa rainha, geralmente consumiam quantidades copiosas de bebida. Não era raro o caso de um […]

Basil Hayden Bourbon – Da Vontade

Luxo discreto. O conceito está bem na moda, especialmente pro causa de Succession – mais uma série que eu não vi, porque esperei acabar. E quando acabou, fiquei com preguiça, por ser muito grande. Mas, existindo no planeta Terra, pude apreciar as tendências por ela lançadas. Ou melhor, evidenciadas. É que o tal luxo discreto sempre existiu. É o conceito de muitas marcas, como Hermés, Zegna e Tom Ford. Ele diz respeito a uma espécie de luxo que não é imediatamente óbvio. Pode ser materializado em peças que parecem triviais, mas que devido a alguma característica qualitativa – material ou mão de obra – as torna especiais e caras. Não há ostentação ou extravagância. E, na maioria das vezes, exige um consumidor maduro, ou aspirante a maduro, para sua apreciação. E não se engane. O conceito não está limitado a moda. Ele pode ser um fone de ouvido para audiófilos, de visual discreto, mas altíssima performance. Ou um relógio exclusivíssimo e super preciso, mas visualmente quase trivial. E a whisky. Algumas marcas transpiram luxo. The Macallan, Dalmore. Outros se esgueiram no território dos entusiastas. É mais ou menos este o caso do Basil Hayden, bourbon whiskey de luxo que chegou, […]

Last Man Standing – Okonomiyaki

Na minha recente viagem ao Japão, me deparei com um prato que muitos de vocês já devem ter familiaridade, mas nunca havia provado. O Okonomiyaki. A iguaria me encantou, especialmente por que é uma das coisas mais aleatórias que eu já vi no mundo da culinária. O dadaísmo gastronômico já vem no nome. “Okonomi” significa “o que você quiser” e “yaki” grelhado. Ou seja, ele é basicamente uma panqueca grelhada com qualquer coisa que você quiser – ou melhor, tiver sobrando na geladeira. O troço é tão aleatório que possui até uma versão que leva lámen junto, e é conhecida por “estilo de Hiroshima”. Os ingredientes mais comuns, entretanto, são ovo, farinha, cebola, repolho, cebolinha e outros vegetais e tubérculos randômicos. Na culinária brasileira, talvez o que mais se aproxime dele é o mexidão – não pelo perfil de sabor, mas pelo melhor espírito mete tudo aí dentro da panela com farinha e vamos ver no que dá. E sempre fica uma delícia. O mundo da coquetelaria, porém, não é tão arbitrário. Ou talvez seja, considerando as centenas de batidas e gim-tônicas com um bioma inteiro de vegetais de garnish. Mas, enfim, raramente coquetéis possuem bases compartilhadas. Há lá clássicos […]

Seis novidades pro dia dos Pais

“Eu não tô bravo com você, só estou um pouco decepcionado” – foi a frase proferida pelo querido Cão pai, quando descobriu a razão do sumiço de algumas doses de seu whisky preferido. “Você deveria estar estudando pra faculdade“. Acenei com a cabeça. Continuou “seja responsável. Quando você tiver a minha idade, vai agradecer“. E completou com “eu só estou tentando te ensinar o caminho certo, não tô mandando nada“. Mal sabia ele que aquelas frases pareciam quase uma profecia. De certa forma, eu estava mesmo estudando. Não para a faculdade de direito, mas, sim, o assunto que me fascinava. Whisky. Assumo, porém, que naquela oportunidade, o ato de beber tinha pouco a ver com devoção acadêmica. E, de outro modo um tanto curioso, também agradeci ao ficar mais velho. Afinal, o primeiro contato com uma boa bebida tinha sido ali – de novo, despropositadamente. Talvez a paternidade seja isso. Aconselhar da melhor forma possível, aparar uma ou outra aresta pontuda, e esperar pelo melhor. E essa é a razão desta materia. Ajudar vocês, filhos e filhas, a escolher o melhor presente para a figura paterna. Separei aqui seis novidades no mercado brasileiro, para garantir a vanguarda da manguaça. Separados […]