Cinco Destilarias (quase) Novas para prestar atenção em 2024

Um paralelepípedo de polaca do alasca empanado, um queijinho safado e molho tártaro, que nem é tão tártaro assim. Tudo isso, emoldurado por duas metades de um brioche fofinho. Não parece grande coisa, mas causou um enorme rebuliço. É o McFish, lanche que saiu do cardápio do McDonald’s em 2019 – justamente porque vendia pouco. Em 2024 a rede anunciou sua volta, por tempo limitadíssimo. Anúncio recebido com gritos de glória pelos fãs da (discutivel) refeição. Eu incluso. Entendo, perfeitamente, o alvoroço. É que o McFish realmente não é nada demais. Exceto pelo que representa. Ele é visto como o útlimo bastião de algo gastronomicamente aceitável para os foodies, na rede de lanchonetes. Quando saiu, ninguém ligou. Mas depois de um tempo, bateu saudades. E e o que quase não vendia, passou até a ter campanha pra sua volta. Que, aliás, durou pouquíssimo. O mundo do whisky já passou por umas dessa, também. Exemplo é a Port Ellen. A destilaria foi fechada em 1985, numa época que o mercado de whisky passava por maus bocados. A Diageo possuía três destilarias em Islay – Lagavulin, Caol Ila e Port Ellen – e buscava reduzir custos. A escolha foi justamente fechar aquela […]

Sobre o Inovador e o Trivial

Fiquei curioso ao saber da novidade, mas imaginei que levaria mais tempo para vê-la ao vivo. Essas coisas são assim. Você ouve a notícia, mas acha que elas jamais chegarão a você. Tanto é que, quando vi, demorei alguns segundos para registrar. Era sábado, no meio do shopping. Um cara magrinho, com uma máscara que lhe dava ares de cosplay do frango da Sadia. Braços na altura do peito, como se regesse uma orquestra. Era o Apple Vision Pro. Mais surpreendente do que o rapaz, porém, era seu entorno. Algumas pessoas paravam e ficavam olhando, como se estivessem testemunhando uma manifestação do capiroto. Outras, andavam apressadas, olhando pro lado. Provavelmente também imaginando que aquilo fosse uma encarnação do tinhoso. O ser humano mais indiferente, em toda situação, era o próprio usuário. Que agora parecia tocar air guitar. Fiquei pensando se essa não teria sido a reação das pessoas ao ver um carro pela primeira vez – lá, em mil, oitocentos e muitos. Ou uma tela de projeção de cinema. Há um mito, inclusive, que durante uma das primeiras exibições de L’arrivée d’un train en gare de La Ciotat, dos Lumiére, a audiência se abaixou, imaginando que o trem projetado fosse […]

Lone Oak – St Patrick’s Special

Ontem eu tomei três banhos. Foi o mínimo necessário, considerando o calor de trinta e sete graus, com sensação térmica de trezentos e setenta. Ar condicionado se tornou a prioridade número um para todos os lugares que frequento. Convidem-me para sair somente para lugares confinados com Elgin, Daikin, LG ou Fujitsu com mais de dezoito mil BTUs. Se sofrer um acidente em casa, cair da escada, bater a cabeça, deixe-me morrer lentamente, mas no fresco. Morrer no frio tem muito mais dignidade. Em vista das temperaturas absurdas, dizer que hoje é St Patrick’s Day soa até irônico. Lá em Dublin está nublado. Máxima de quatorze graus, mínima de confortáveis sete. Por lá, um whisky puro seguido de uma Guinness à temperatura ambiente parece um excelente programa. Aqui, entretanto, provavelmente a única forma de consumir whisky é em um coquetel. Um coquetel refrescante. E é aí que entra o Lone Oak. Ele foi criado por Jillian Vose do famoso Dead Rabbit, de Nova Iorque. O bar – ou melhor, Irish Pub – que pegou fogo, e voltou. Os ingredientes são todos verdinhos, também. Então, não há necessidade de usar aquele corante alimentício que parece plutônio. Nele vai irish whiskey, chartreuse verde, […]

Havana Club Unión Cohiba Atmosphere – Crocs de Frango

Comfort food e comfort fashion. Um mundo em que a alta gastronomia e a moda são conjuntamente estraçalhadas, como um comedor voraz faria com pequenos pedaços de frango frito em um balde. Extravagância, colesterol, design e desgosto. Tudo junto, materializado, nos pés dos consumidores. Este foi o resultado de uma das colaborações mais inusitadas do mundo: KFC e Crocs. Sim, você leu certo. A marca de calçados conhecida por seus designs confortáveis e, digamos, peculiares, se uniu à gigante do fast food para criar uma coleção de tamanha ousadia que desafia a lógica e a sanidade. Isso em meados de 2020, quando o mudo já passava um dos maiores perrengues das últimas décadas. O resultado foram sandálias com estampas de frango frito, tamancos com aroma de batata frita e jibitz em forma de baldes de frango. Uma demonstração de que a mente criativa por trás dessa união profana não tinha limites. A combinação, entretanto, até faz sentido – apesar da tenebrosa execução. São marcas enraizadas no conforto. Afinal, comer frango frito de crocs só poderia ser mais confortável se feito nu. Além disso, a colaboração transpira liberdade individual. Essa é, aliás, a grande ideia de collabs entre marcas. Trazer valores […]

Left Hand Cocktail – Mashup

Perdoem-me pelo título impreciso. Mas o tema desta matéria não é coquetelaria. Mas Mashups. Se você nao conhece o jargão, mashup é um trabalho criativo – que pode ser uma música ou um filme – criado a partir da combinação de dois ou mais outras músicas ou filmes. O termo é também usado por webdevelopers para definir “uma aplicação que que usa conteúdo de mais de uma origem para criar um novo serviço disponibilizado em uma única interface gráfica“. Mas, para evitar sonolência, deixarei de discorrer sobre a derradeira definição. Mashups podem ser feitos, virtualmente, de qualquer material audiovisual. A única regra é que combinem, de alguma forma. E, mesmo assim, às vezes, nem precisam. A grande sacada é que, no começo, o mashup traz a impressão de ser algo já conhecido. Mas, aos poucos, ao revelar sua natureza híbrida, distorce essa impressão. Caso não tenha entendido ainda, veja a música abaixo – um mashup de Soundgarden com Green Day. Recomendo fortemente que ouçam à medida que avançam neste texto. De certa forma, mashups podem ser usados na culinária e na coquetelaria, também. Não quando alguém faz uma pizza de sushi, por exemplo. Ou um acarajéburguer, ainda que este último […]

Blue Label Elusive Umami – The Prestige

“Você está procurando o segredo. Mas você não vai encontrar porque, é claro, você não está realmente procurando. Você realmente não quer resolver isso” . Essas são as derradeiras linhas de “The Prestige” – e também, uma valiosa lição de marketing. Aliás, as duas coisas – marketing e mágica – tem muita coisa em comum. Mágicos utilizam diferentes técnicas para distrair sua platéia. Eles empregam prestidigitação, distração, ilusões ópticas e auditivas, adereços especialmente construídos, bem como técnicas psicológicas verbais e não verbais, como sugestão, hipnose e preparação. É uma dança elaborada entre o que é mostrado e o que é escondido, entre o que parece ser e o que realmente é. É parecido, de certa forma, com o marketing. Um bom storytelling pode nos induzir a sentir algo, ainda que aquilo não seja a realidade. De certa forma, é isso que ocorre com o Johnnie Walker Blue Label Elusive Umami, blended whisky de luxo que acaba de desembarcar no Brasil por, aproximadamente, 2,5 mil reais. O Johnnie Walker Blue Label Elusive Umami, é uma criação do chef Kobayashi, do restaurante Kei, de tripla estrela Michelin, em Paris, e da master blender Emma Walker. Que curiosamente não é da mesma família […]

The Macallan 25 – Bolo Real

Abro, com o cuidado de quem desarma uma bomba, a fatura de meu cartão de crédito. O fim do ano não ajudou. Faço uma apostinha mental: se for menor que certo valor, fico sem beber hoje. Confiro o número com perplexidade. Clonaram meu cartão – sussurro, severamente, para minha esposa. Não é isso não, é que eu passei o cabelo e a maquiagem da festa de fim de ano nele. Pisco de incredulidade. Mas a turma da maquiagem usou fulerenos endoédricos pra fazer o brilho e justificar esse preço? O que sucedeu foi uma discussão conjugal que culminou numa reflexão óbvia, mas necessária. Cada um tem uma percepção diferente de valor das coisas. Pra mim, é um absurdo pagar o equivalente às reservas de capital de Honduras em uma maquiagem. Mas beber este valor é justificável. E tem gente ainda mais louca. Teve um cara que pagou 7.500 (sete mil e quinhentas libras) por um pedaço de bolo de frutas do casamento da Kate com o Príncipe William. Isso foi em 2014, três anos depois do casamento. Aliás, bolos de frutas e whisky tem vários pontos de tangência. O perfil de sabor é um deles. Outra coisa, é que bolos […]

Como (não) beber whisky – Um post des-educativo

  Antes de tudo, preciso dizer que isto é um não post. Ou melhor, um post deseducativo. Se você veio até aqui a procura de informação, ou de como degustar seu whisky e parecer um especialista, recomendo fortemente que fuja o mais rápido possível. Ou então leia esta matéria aqui. Essa aí sim, é educativa. Comportada e informativa. Esta aqui não. Esta é aquele conselho pernicioso do seu amigo perverso. Passei as últimas semanas relendo um de meus livros preferidos. Cem Anos de Solidão, de Garcia Marquez. Resolvi reler porque queria realmente conhecer os personagens. Da primeira, apenas prestei atenção na história, mas não dei muita importância a quem era quem. Dessa segunda vez não. Dessa vez fiz anotações, montei a árvore genealógica da família e anotava, ao lado do nome, características físicas e de personalidade dos Buendía. Demorei exatos trinta e cinco dias para ler o livro. O mesmo que tinha me levado dez da primeira vez. E fiquei pensando. Eu tinha gostado mais da obra da primeira vez. Quando me ative somente à história. Me pegava torcendo por Macondo e por aquela família. Pensei que fosse por conta da ausência do elemento surpresa – da primeira vez, não […]

Fanciulli Cocktail – Da Ordem

As vezes, não basta talento. É preciso, também, um pouco de sorte. Este foi o caso de Francesco Fanciulli, líder da banda de fuzileiros navais does Estados Unidos, de 1892 até 1897. Inclusive, o breve período de liderança do compositor toscano já sugere que algo imprevisto se deu com sua carreira. Em seu caso “descumprimento de uma ordem oficial, uso de linguagem chula para com um oficial e conduta que prejudica a boa ordem e disciplina“. A verdade é que Fanciulli era um excelente compositor. Mas não tão bom quanto John Philip Souza, seu predecessor. Ainda que sob sua batuta – literalmente – a banda tivesse recebido reconhecimento no meio, inclusive, internacionalmente, quem brilhava ainda era Souza. Tanto é que, em Junho de 1897, Francesco recebeu a ordem de um superior de tocar “El Capitán”, composta por Souza. Fanciulli surtou, e foi colocado sob prisão domiciliar. Foi necessária a intervenção de Theodore Roosevelt – na época secretário da marinha dos Estados Unidos – para que o bom homem voltasse ao trabalho. Apesar disso, em 1897, recebeu a notícia que seu posto não seria renovado. Mas a história – especialmente a etílica – tem uma forma curiosa de corrigir injustiças. Porque, […]

Old Pulteney Huddart – Mitologia

“Não abre essa janela, você está de cabelo molhado, pode entrar um golpe de ar e você ficar resfriado” – todos já ouvimos essa frase de alguém. Provavelmente, no seio de infância, de algum adulto mal-informado. “Cuidado para não engolir o chiclete, porque ele vai ficar grudado pra sempre no seu estômago” é outra. Que é mentira também. O chiclete sai por baixo em alguns dias, totalmente incólume – como o milho. São tantos exemplos que dá pra fazer um texto só deles. Boa parte envolve água, ou a praia. Não pode nadar por uma hora depois de comer qualquer coisa. Depende, se você não comer um boi inteiro e depois bancar o Michael Phelps, não tem muito perigo. Tomar banho quando está chovento forte é arriscado, porque você pode ser eletrocutado por um raio. Não vira o olho esquisito, porque se bater um vento, você fica assim pra sempre – e ainda pega um resfriado, considerando o primeiro mito. A gente acredita em um monte de besteira. São noções passadas de geração a geração, que, em boa parte, servem para não precisar explicar algo complicado. Ou só por estupidez, mesmo. Existem noções assim em todas as áreas de conhecimento, […]