Vou contar uma coisa para vocês. Uma coisa que talvez muitos leitores já tenham concluído. Ter filho é uma delícia. O nascimento da Cãzinha foi, sem nenhuma sombra de dúvida, a melhor coisa que já aconteceu comigo. Uma distante segunda coisa foi o dia que tomei Lagavulin pela primeira vez. Ah, e quando me casei com a Cã. Quando me casei com a Cã, claro.
Do tempo que estou com a Cãzinha, noventa por cento é como voar de robe de chambres entre as nuvens, olhando as poéticas luzes da cidade abaixo de mim. Tipo aquela viagem do Grande Lebowski. A sensação é de completude absoluta.
Mas existem os outros dez por cento. Dez por cento em que eu preferia estar sendo esfolado por uma esmeriladeira. Nesses dez por cento, estão os momentos em que ela se alivia na banheira, come a pipoca bicada pelo pombo que estava na sarjeta, lambe a mesa imunda da lanchonete ou enfia a chupeta na boca da amiguinha doente, para depois sorvê-la como se degustasse uma iguaria. E quando ela assiste a Galinha Pintadinha.
Olha, eu não tenho nada contra a Galinha Pintadinha. Pra falar a verdade, o desenho é mais ou menos bem feito e as músicas são tradicionais – o que é cultura, e cultura é sempre bom. Mas a coisa começa a ficar insuportável lá pela ducentésima vez que você vê o Pai Francisco dançando todo requebrado. Sério. Tem dias que eu escolheria ter meus tímpanos e olhos perfurados, só para não ver e ouvir o Pai Francisco dançar todo requebrado mais uma vez. Mas é inevitável, porque a Cãzinha ama a Galinha.
Semana passada estava no supermercado com a Cãzinha, que se comportava muito bem. Muito bem, até ver um suquinho da Galinha Pintadinha. Minha filha, um doce de criança, transformou-se no capiroto em menos de um centésimo de segundo. Gritava, apontando desesperadamente para aquele tetra pack multicolorido, estampado com uma galinha azul sorridente. O Suquinho da Galinha. Na cabeça de minha filha, uma homenagem improvável, que ela precisava possuir. Mais. Do. Que. Qualquer. Coisa.
Mas essa não foi a primeira vez que uma homenagem semelhante me fez comprar um produto. Pode ser que tenha ocorrido antes, quando eu era criança. Mas a primeira vez que me lembro, foi quando comprei um Jack Daniel’s Sinatra Select. E eu nem sou tão fã do Sinatra. Mas a lenda do homem aliada a uma mania quase doentia que tenho por edições especiais tornou a compra de uma garrafa daquelas um caso de inexigibilidade de conduta diversa.
Reza a lenda que a bebida de preferência Frank Sinatra era o tennessee whiskey Jack Daniel’s. Ele o tomava em copo baixo, com pouco ou sem gelo. Na verdade, ele tomava de qualquer jeito, em qualquer copo. E a lenda tornou-se tão popular que a própria Jack Daniel’s resolveu homenagear seu mais notório ébrio com uma edição especial de seu whiskey.
O Jack Daniel’s Sinatra Select é uma mistura entre o tradicional Jack Daniels Old No. 7 e o destilado maturado em barricas virgens de carvalho americano, batizadas como “Sinatra Barrels”, cuja característica é possuir reentrâncias em seu interior, aumentando a área de contato entre o destilado e o barril, acelerando a maturação. De acordo com a Jack Daniel’s, essa característica também coloca em evidência uma camada das ripas que formam o barril conhecidas por eles como “deep red layer” ou camada vermelha profunda. Segundo a empresa, é dessa camada que advém a maior parte do sabor e aroma transferido ao whisky.
E ainda que, na verdade, essa tal camada vermelha seja apenas a camada divisória – a fronteira – entre a parte tostada do barril e a madeira não queimada, a verdade é que a diferença de sabor entre o Jack Daniel’s Sinatra Select e o Old No. 7 é evidente. Comparado ao seu clássico irmão, Jack Daniel’s Sinatra possui um sabor muito mais intenso e profundo de caramelo, baunilha e laranja. Por conta disso, a presença do álcool é bem menos perceptível, ainda queo Sinatra seja engarrafado a uma graduação alcoólica mais alta do que seu irmão, de 45%, contra 40 % do Old No. 7.
Assim como o Old No. 7, o destilado do Jack Daniel’s Sinatra Select atravessa um filtro de carvão vegetal de bordo (maple tree) de três metros de profundidade, antes de ser maturado. Como explicado anteriormente por aqui, este processo tem como objetivo filtrar impurezas, reduzindo o sabor de grão característico de whiskeys americanos.
A Jack Daniel’s é, atualmente, a maior produtora de whiskey dos Estados Unidos. Toda sua produção é realizada na cidade de Lynchburg, no condado de Moore, estado do Tennessee. E por uma das maiores ironias do mundo etílico, há uma lei seca em vigor naquele condado, que proíbe expressamente a venda de bebida alcoólicas. Assim, quem trabalha na Jack Daniel’s não pode beber o whisky que ajuda a produzir. Isso é mais torturante do que ser diabético e ter uma loja de chocolates!
Voltando ao Jack Daniel’s Sinatra, o preço é seu único problema. No Brasil, uma garrafa não sai por muito menos de R$ 500,00 (quinhentos reais). Isso o torna o whiskey americano mais caro oficialmente à venda em nosso país. Aliás, duas vezes mais caro do que o segundo colocado, o excelente Woodford Reserve, também pertencente à Brown Forman.
Mas isso tudo não importa. Porque comprar o Jack Daniel’s Sinatra Select raramente será uma decisão cem por cento racional. Esse é um whiskey para entusiastas. Fãs de Sinatra ou apaixonados por Jack Daniel’s. Afinal, não somos muito diferentes de crianças com personagens animados. É só nossa Galinha que muda. E o suquinho. Ah, o suquinho. Esse fica bem melhor.
Tipo: Tennessee Whiskey
Marca: Jack Daniel’s
Região: N/A
ABV: 45%
Notas de prova:
Aroma: Caramelo, com leve baunilha.
Sabor: Claramente cítrico, com laranja, bala de caramelo e baunilha. Apesar da graduação alcoólica, a impressão do álcool é discreta.
Com Água: Adicionar agua ressalta o sabor da baunilha e reduz um pouco o sabor de caramelo. Este é um whiskey que fica melhor puro.
Preço: em torno de R$ 500,00 (quinhentos reais)
A matéria abaixo não tem a ver com o post, mas não achei outro lugar para mandar a mensagem. Abs.
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150917_centenaria_uisque_lab
Esse cão aqui então vai viver uns 40 anos (considerando a longevidade média de um canídeo)…
Por favor, faça um post sobre o the glenlivet 12 anos…single malt.
Obg
Carlos, já tem! Dá uma olhada aqui:
http://ocaoengarrafado.com.br/glenlivet-12-anos/
Bela matéria! Só uma observação: os abençoados degustadores da fábrica são os únicos autorizados a beber whiskey em Lynchburg. E também é proibido vender qualquer outra bebida que não seja Jack. Não tem nem cerveja lá à venda
Eu simplismente sou apaixonado pelo whisky Jack Daniel’s… E recentemente, ganhei de presente da minha esposa o Sinatra Select… Muito contrariado por mim, acabei abrindo a garrafa, a qual pretendia que ficasse em minha coleção… Mas como resistir ??? E como já era de se esperar… Fiquei ainda mais fã dos whiskys da marca.
E acabei comprando outra garrafa…
Cão, parabéns pelo site… Sempre venho ler.. Ah! passo pelo mesmo que vc com minha filha.. rsrsrs
Opa, fala Junior! Cara, você precisa provar o Jack 150th anniversary edition então. Gostei bastante também. É mais seco e alcoolico que o Sinatra, mas tem aquele inconfundível perfil de Jack Daniel’s.
Filho é puxado. Mas a gente é igual. Muda o suquinho… rs
De mais cara, vim no Faustão Sorocaba para comprar um Jack Daniels, e toda vez vejo essa garrafa do Sinatra e me pergunto “Espero ficar rico ou gasto a grana do investimento já?”
Sua descrição foi convincente, de vários sites foi a que mais me levou próximo do sabor!
Obrigado cão.
Opa! Que legal, Fábio! Mas e aí… comprou? rs