Drinque do Cão II – Penicillin

 

Lembram-se quando falei sobre o sentido da palavra “serendipidade”? Quando a mencionei pela primeira vez, utilizei um exemplo que deixou muita gente excitada. O Viagra. O Viagra foi, fácil, uma das maiores serendipidades da história.

Além dele, outra serendipidade incontestável foi a penicilina. Ela foi descoberta por acaso, pelo cientista escocês Alexander Fleming, em 1928. A penicilina foi provavelmente a segunda maior contribuição da Escócia para o mundo. Depois do whisky, óbvio.

É que antes da penicilina, se você cortasse a perna e ela, porventura, infeccionasse, havia uma chance razoável de ter que amputá-la. E se você desse esse azar antes de 1846, sua perna teria que ser lentamente e cuidadosamente arrancada sem o uso de qualquer anestesia, enquanto você urrava de dor. Porque, bom, porque não existia anestesia, também.

 

E aí você teria que lutar assim.
E aí você teria que lutar assim.

E tudo bem que tomar antibiótico é chato, porque você fica com dor de estomago, e não pode beber. Mas sei lá, eu acho que eu prefiro passar uns dias sem beber nada do que perder um membro do corpo. E, se você pensar, foi mais ou menos essa a escolha que a penicilina te trouxe.

A penicilina, assim, foi uma revolução para a humanidade.

Para mim, uma revolução muito parecida aconteceu em 2010. Antes disso, eu achava um absoluto pecado utilizar um single malt em um coquetel. Até ter descoberto o Penicillin (o coquetel, não o antibiótico), pelas mãos do mestre Spencer Amereno Junior – hoje no Frank Bar. E que descoberta. O Penicillin é provavelmente o drink preferido deste Cão que vos escreve. Há dias que gostaria de um Boulevardier, outros que talvez sinta vontade de um Manhattan. Mas um coquetel que jamais recusarei em qualquer dia é este. O Penicillin.

O Penicillin foi criado em 2005 e profeticamente batizado por um bartender chamado Sam Ross. É um coquetel surpreendentemente complexo e, ainda que não possua as qualidades curativas do remédio, chega bem perto daquela receita de mel e limão para dor de garganta da sua avó. Principalmente se vovó curtir um bom whisky.

Como se não bastasse ser uma das mais incríveis criações da coquetelaria, a história do Penicillin também envolve uma das marcas de whisky favoritas deste canídeo. A iconoclasta Compass Box Whisky Co. Ainda mais razão para reverenciar esta criação.

Segundo Ross “Tínhamos recebido alguns dos primeiros lotes dos whiskies da Compass Box em Nova Iorque – O Asyla, Peat Monster, e outros dois (…) E eu estava apenas testando, e fiz uma recriação do Gold Rush, um dos nossos maiores sucessos (usando Asyla). Nosso suco de gengibre é adoçado, e funciona como uma calda. Então dividi o dulçor entre os dois, o gengibre e o mel. E deu certo. Aí peguei o peat monster – talvez pudesse brincar um pouco com whisky defumado. Fiz um float. O aroma enfumaçado se manteve lá.

Nenhum coquetel teve ascensão tão rápida quanto o Penicillin. Em pouco mais de dez anos, o coquetel tornou-se tão famoso que mesmo em São Paulo, mais de uma dezena de bares o serve. É um clássico moderno. E não é para menos.

Então, caros leitores,  aí vai a segunda aula de mixologia do Cão. Ensinarei a vocês um dos melhores coquetéis da história. Um remédio para todos os males. Uma verdadeira panaceia. O incrível Penicillin:

PENICILLIN

INGREDIENTES:

¾ dose de suco de limão siciliano

¾ dose de calda de gengibre e mel (veja a parte de preparo)

2 doses de blended whisky ou single malt sem aroma defumado (considerando o perfil de sabor do Asyla, normalmente, uso Johnnie Walker Black Label ou J&B. Se você estiver se sentindo meio sofisticado, pode fazer com Johnnie Walker Gold Label Reserve, mas vai ficar mais doce…)

¼ dose de single malt defumado (este Cão utilizou Ardbeg 10, já que não temos Peat Monster por aqui. O ideal é que seja um single malt defumado e mais seco ou cítrico, como o Ardbeg ou o Laphroaig 10 anos). Se achar que está pouco defumado, seja corajoso e faça com ½ dose.

Gelo.

Penicillin
Ingredientes

 

PREPARO:

A calda de gengibre e mel:

Aqui você tem duas opções. As duas envolvem água, mel e gengibre. Uma delas envolve um processador de alimentos – boa oportunidade para voltar a usar aquele eletrodoméstico inútil na sua casa:

Opção 1 – descascar e picar gengibre em cubinhos. Colocar em uma panela, o gengibre picado, agua e mel, numa proporção de um para um (ou seja, para cada ml de agua, a mesma quantidade de mel). Deixar reduzir um pouco, para o gengibre deixar sabor na mistura. Não é para ficar nem perto de viscoso. Tem que ser meio aguado mesmo. Depois, peneirar, para tirar o gengibre.

Opção 2 – pegar o gengibre inteiro, colocar no processador de alimentos para que vire uma espécie de pasta. Você tem que agora separar o suco da pasta. Quando fiz esta técnica, usei uma gaze, mas uma peneira fininha funcionará até melhor. Separar 1 dose do suco resultante.

Em um outro recipiente, adicionar o mel e a agua, na proporção de 1 para 1. Misturar um pouco, e depois adicionar a dose de suco de gengibre.

O Penicillin:

Em uma coqueteleira ou shaker, colocar três pedras de gelo e misturar o suco de limão siciliano, a calda de gengibre e mel, o whisky sem defumação e o defumado. Bater por quatro segundos, até formar uma espuma.

Coar e servir em copo baixo, com duas pequenas pedras de gelo, ou uma grande.

 

22 thoughts on “Drinque do Cão II – Penicillin

  1. Muito bom! E você ainda pode falar pra esposa que está tomando remédio! Nada além de um remédio! Nesse inverno, essa penicilina vai curar a gripe e a dor de garganta rapidinho!

    1. Pior é que é!! Tem tudo que tem no remédio caseiro pra garganta, e ainda uns fenóis para aumentar a imunidade (dizem que é fitoterápico!)

  2. Quarta e quinta(08-09) de julho estarei em Sampa e mandarei uma penicilina dessas!!!! Valeu pela dica!!

    1. Vai no Frank (é no Maksoud Plaza) e fala pro Spencer que você foi lá por causa do Cão Engarrafado…hehe. Outro lugar que tem é o Isola Bar, no Shopping JK Iguatemi!

      1. Poxa, só vi sua resposta agora, muita coincidência eu estive também no Isola, gosto muito de Gin e mandei um Mr. Uyedas e depois um gin-tonica (Hendrick’s), adorei ambos mas preferi o Frank. Sobre o drink Penicilin, adorei pricipalmente pelo fato de levar o Ardbeg!!! Muito bom!!!

        1. Putz, foi por pouco! Viu lá a coleção de whiskies? Eles tem um Balvenie Classic, que – alegadamente – foi o primeiro whisky do mundo com extra finish. Pena que é só de enfeite, e não abrem. Sempre que vou lá fico fazendo planos de como afanar aquela garrafa. Mas a prateleira é muito alta, acho que iriam perceber eu escalando a parede do bar… hehe.

          O Mauricio Barbosa contou a história do Mr. Uyedas? É bem legal. Do Isola, os que mais gosto são o barrel aged negroni e o Souless Gentleman!

  3. Boa noite cão ! Eu gostaria de fazer uma sugestão, seria mais fácil se nas postagens sobre coquetéis, vc colocasse fotos deles !
    Tipo aquela do Ny souer,por que pow,ele e um dos drunksbmsis bonitos que existem quando servido com uma grande pedra se gelo !
    E vejo pelas fotos dos wiskys que tu manda muito bem em fotografia !
    Abs

    1. Fala Vinicius!! Opa, muito obrigado!

      Estou fazendo isso aí – colocando foto de cada um – qual foi o coquetel que não teve foto? Esse do Penicillin faz um tempinho…rs

  4. Sensacional! Ja tive o prazer de toma-lo direto das maos de Sam Ross. Acho q ngm conseguira replicar igual ao dele.
    No Brasil, a coquetelaria ainda esta sendo desenvolvida, vai levar tempo.

    1. Caramba Rafael! Que fantástico! Queria poder provar o original mesmo. Ele fez com qual whisky? Lembra? Abs!

    1. Mauro, mel é 1 para 1 (um de água pra um de mel). É apenas para o mel não encapsular. E gengibre, bem, vai depender de quanto você vai fazer. Mas para tipo 1 xicara de chá de água e 1 xicara de chá de mel, a gente usa um “pedaço” inteiro, da forma que é vendido no supermercado.

    1. Cadu, pra te falar a verdade, eu tentaria algo mais seco. Tipo um Ballantine’s finest no máximo. Talvez um Johnnie. Mas o Chivas 12 vai funcionar melhor nas opções daí 😉

  5. Dear dog,

    Vc iria de Chivas 12, Famous Grose ou Black Label (mesmo que o defumado em qualquer das opções ficaria a cargo do Double Black)?

    1. Oi Rafaela!

      Dificil a pergunta. Acho que se quisesse uma fumacinha, Black. Para um dia de intensidade, Famous. E leveza, Chivas 12. Mas, dentre os três, não consigo escolher. De verdade, não é jabá. Fico aqui fazendo a matemática na cabeça, sem solução. rs.

  6. Gosto mais de bater todos os ingredientes exceto o malt peated. Acrescento ele por cima do drink no copo. Fica mais perfumado, ou defumado, no início.

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