Johnnie Walker Wine Cask Blend

Gosto é um negócio engraçado. Porque há uma miríade de coisas que eu sempre gostei. Peixe e western, por exemplo. Há outras que quis gostar, assim, voluntariamente. E aí passei a admirá-las por insistência. Como negroni e aquela cebola grelhada incrível com um pouquinho de azeite e sal.

Mas há outras coisas que não consigo gostar, independente de minha pertinácia. Uma delas é jazz. Eu chego às vezes até a ouvir um Miles Davis ou Thelonious Monk enquanto fumo um charuto, só pelo bem do cliché. E nessas situações, ainda que me sinta bem, quase não presto atenção na música. Jazz não me agride, mas não me seduz. E eu queria que fascinasse.

Outra dessas coisas é vinho. Queria muito gostar e conhecer vinho. Mas em parte por conta de minha natureza, em parte por uma questão de ter que escolher frentes de combate, sei muito pouco sobre vinho. Tanto é que minha bússola sensorial é invertida. Uma vez, me serviram um Jerez oloroso. Experimentei com atenção e logo concluí. Tem gosto de Macallan. Ou Aberlour, talvez.

E é curioso isso, porque a esfera dos vinhos não apenas tangencia a do whisky, como nela desempenha um papel importantíssimo. Há centenas de whiskies maturados em barricas previamente usadas por vinho. Não apenas single malts. Há blends que buscam inspiração no mundo dos vinhos. Um desses é o novo Johnnie Walker Wine Cask Blend, que acaba de chegar ao Brasil.

O Johnnie Walker Wine Cask Blend faz parte da série Blender’s Batch da Johnnie Walker, que produz rótulos – no conceito deles – experimentais. Como, por exemplo, o Johnnie Walker Red Rye Cask Finish, já revisto por aqui. No caso do Wine Cask Blend, a experiência fica por conta do uso de whiskies que passaram parte de sua maturação em barricas previamente utilizadas para maturar diferentes tipos de vinho.

Nas palavras da Johnnie Walker, mal traduzidas por este Cão “este blend único é influenciado pela experimentação da maturação em barricas de vinho, um projeto iniciado pelo master blender da Johnnie Walker, Jim Beveridge, há quase uma década. Em 2015, Aimee Gibson, do time de blenders da Johnnie Walker, assumiu parte do projeto e por experiências próprias, desenvolveu um maravilhoso novo whisky para a série Blender’s Batch“.

Aimee e sua criação

A empresa continua “Este blend acessível inclui whiskies maturados em barris de vinho. Ele é produzido com maltes das highlands, como Clynelish, e speyside, como Roseisle. Ele também inclui whiskies de grão bastante cremosos, como os de Cameronbridge. O resultado é um whisky leve e vibrante, com notas de frutas do pomar e do bosque“.

É uma declaração triplamente curiosa. Em primeiro, porque não há nada de experimental em maturar whiskies em barricas de vinho. A Glenmorangie, por exemplo, dedica boa parte de seu portfólio permanente a expressões finalizadas em diferentes tipos de vinho, como sauternes, jerez e porto. A Benromach até possui versões maturadas em Sassicaia e Chateau Sissac, e a Bruichladdich acaba de lançar o divino Port Charlotte MRC:01, defumado e parcialmente maturado em barricas de ex-Mouton Rothschild. Esta é uma prática relativamente comum, ainda que seja, talvez, um pouco mais rara com blended whiskies.

Em segundo lugar, a declaração não aponta de quais vinhos vieram as barricas do Wine Cask Blend, e nem qual a proporção dos whiskies maturados nessas barricas. E isso é estranho, porque Sauternes, Porto, Madeira, Jerez, Merlot, Dolcettos e Moscatel são todos vinhos. E, em sua boa maioria, tão distintos quanto um Laphroaig é de um Glenfiddich. Talvez a Johnnie Walker se refira a tintos. Mas isso é tão vago quanto especulativo.

E, finalmente, por conta de Roseisle. Para este Cão, esta é a primeira vez que a empresa menciona sua enorme destilaria de Speyside. Inaugurada em 2010, a planta é capaz de produzir quase dez milhões de litros por ano – um pouco menos do que a Glenfiddich – e foi projetada para fornecer diferentes tipos de single malt especialmente para a elaboração de blends sob a égide da Diageo.

Roseisle (veja os alambiques no interior da estrutura de vidro)

Sensorialmente, o Johnnie Walker Wine Cask Blend é um whisky leve e agradável. O álcool está relativamente bem integrado – mas talvez menos do que no Red Rye Cask Finish –  e a influência vínica é discreta, ainda que perceptível. Há uma predominância leve do dulçor do mel e da baunilha, vindo do whisky de grão e parte dos componentes de malte sobre o frutado e apimentado das barricas de vinho. Enfim, um whisky muito fácil de ser bebido. Um bebedor desatento seria capaz de percorrer quase um terço da garrafa sem qualquer esforço.

Se você é apaixonado pela Johnnie Walker, procura um whisky com excelente custo benefício, ou gosta de vinhos, experimente o Wine Cask Blend. Alás, experimente mesmo se não for um enófilo e mesmo se não gostar da marca do andarilho. É um whisky que – apesar da singeleza – entrega uma experiência bem agradável e além de honesta. Pensando bem, talvez agora eu me arrisque a dizer que realmente gosto de vinhos. O jazz que me aguarde.

JOHNNIE WALKER BLENDER’S BATCH WINE CASK BLEND

Tipo: Blended Whisky sem idade definida (NAS)

Marca: Johnnie Walker

Região: N/A

ABV: 40%

Notas de prova:

Aroma: Doce e frutado, com creme de baunilha.

Sabor: Mais creme de baunilha, malte, discretamente turfado. Final adocicado e frutado, com baunilha.

Disponibilidade: disponível no Brasil – Preço médio de R$ 110,00.

19 thoughts on “Johnnie Walker Wine Cask Blend

  1. Já tentou Blues, mestre? Faz bem mais sentido que Jazz hahaha
    Curioso que essa semana estava lendo sobre vinhos. Confesso que entendo pouquíssimo, até pela minha preferência por destilados, mas gostaria de ter algo participando do meu bar.
    Gosto bastante de whiskys influenciados por vinhos, mas estou tendo dificuldades para encontrar algum equivalente ao Macallan DC 12y. A maioria possui digamos uma proporção “injusta” de maturação em ex-bourbons em relação aos ex-sherrys, por exemplo. Aceito sugestões hahaha.

    Abraço!

    1. Fala Mestre!

      Puxa, difícil. Acho que mais próximo do DC12, teríamos o Singleton. Mas está bem longe de ser o que você procura. No mercado internacional, recomendaria um Glenfarclas. Mas, por aqui… Glenlivet 15YO? Prepare-se para desembolsar mais!

      E sobre o Blues – sim. Blues é excelente. Consigo ouvir e até gostar na maioria dos casos. Mas acho que é um problema genético. Sou do Rock e da musica classica. Assim como sou do whisky e da cerveja. Por mais que queira gostar de vinhos.

  2. Parabéns pelo site e todas informações que agregam ao nosso pequeno conhecimento sobre essa bebida que é o verdadeiro presente dos “deuses”.
    Por favor me indique uma loja que possua esse Wine Whisky.
    Obrigado

    1. Prezado Marcos, muito obrigado!

      Sobre o Wine Cask – encontramos apenas nas lojas do Pão de Açucar!

      1. Oi amigo obrigado pelas ricas informações sempre ! Sou um acompanhante de de seus relatos e me direciono muito por eles, gostaria que por favor me informasse qual Pão de Açúcar achou essa edição, pois já rodei umas 05 e nada !
        Obrigado pelo seu tempo!

        1. Opa, obrigado Lucas!

          Eu encontrei no Pão de Açúcar da Joaquim Floriano, Itaim, SP. Mas já vi em outros também. Há um tempo tinha no PDA online, para entregar em casa. Mas agora não aparece mais para mim.

  3. Muito boa a materia escrita !

    Encontrei esse exemplar no Pão de Açucar do Ipiranga – Ricardo Jafet por R$ 115,00

    Abs,

  4. Ri muito aqui sozinho!!! Muito bom ouvir que tem mais gente que já tentou e não conseguiu gostar de vinho. E olha que já tentei, porque é muito fácil você ter amigos que gostem de degustar e discutir sobre vinho. Agora de whisky é bem mais difícil, pelo menos aqui na minha cidade…kkk.
    E confesso que também já tentei curtir jazz, mais por exibicionismo, confesso, mas também foi outro fracasso. Sou muito mais do rock, clássico é claro, e de um blues, além de uma boa MPB.
    Muito obrigado por compartilhar conosco as suas experiências com o whisky. Estou aprendendo muito! Parabéns!

    1. Muito obrigado, Cassiano!

      Pois é, meu caro – talvez sejamos vira-latas sofisticados, e essa cultura enófila e audiófila não seja para nós.

    1. Meu caro Fabio, o whisky é seu, e nada mais justo que você beba da forma que mais sentir prazer.

      Porém, para uma degustação analítica (essa, que a gente fica tentando identificar e descrever sabores), diria que é puro. Ou com um pinguinho de agua.

  5. Também não sou o maior fã de vinhos, mas aprendi a apreciar alguns poucos por influência de um amigo, só que quando menos percebi eu já estava nos brandies de uva e comprando Veuve Cliquot pra passar meu Reveillon sozinho escutando Opeth. No resto do ano eu também escuto Opeth, mas tomando Whiskeys e Brandies. Com a entrada do outono meu senso de humor e e vontade de viver melhoraram consideravelmente, então vi esse whiskey na loja oficial da jãozinho andador no ML e atirei o nome no google. Graças ao seu Review e o preço convidativo adquiri duas garrafas.
    Aliás, você não é o único que queria gostar de Jazz e não consegue, mas tenta Fusion. O Opus do Al Di Meola é o melhor que você pode parar pra ouvir agora.
    Muitíssimo grato pelo Review.

    1. Gustavo, devo dizer que gostei da veia literária do relato. E obrigado por compartilhar desdes dois desgostos…rs! E espero que tenha gostado do Joãozinho andador!

  6. Ótimo review. Sempre leio seus reviews antes de comprar uma nova garrafa. Comecei a ler seus reviews na pandemia e iniciei comprando um teacher’s highland cream (o comum), passei pelos Jameson, todos os 12 anos e fui parar nos defumados, agora tenho a Holy trinity 10 anos, com os Ardbed, Talisker e Laphroaig.

    Mas confesso que ultimamente os adocicados me chamaram a atenção, como o Gold Label (tem alguma coisa nos JW que, mesmo sabendo que são inferiores, o sabor nos agrada) e mais recentemente com o Aberfeldy 16, que foi amor desde o primeiro gole.

    Diferente de você, eu gosto muito de vinho, principalmente os mais intensos e eu gostaria de saber que vinhos são esses XERES para comprar no mercado, pois não acho….

    SObre Jazz, estou igual você e os demais que comentaram aqui, não tem jeito de eu gostar.

    Vou tentar esse JW aí, deve ter um sabor próximo aos Aberfeldy 16 com 1/3 do valor.

    1. Muito obrigado, caro Silvano!!

      Sobre jerez – se for ao Caledonia, prove os jerez da Fernando de Castilla que temos por lá. Há algumas marcas a venda no Brasil, mas não são fáceis de achar. Especialmente Oloroso. Olorosos são impossíveis. Das marcas, Maestro Sierra é um otimo custo x beneficio.

  7. Te acompanhei perfeitamente até o “sensorialmente” do penúltimo parágrafos (embora alguns álbuns do Miles Davis e alguns fusion jazz me deem a onda esperada). Te acompanhei sobretudo na ressalva que você colocou em segundo lugar.

    A partir do “sensorialmente” desconcordo. Estou bebendo pela primeira vez (e provavelmente última) esta versão e ao paladar me parece ter sido maturada por muito tempo em barris de Cantina São Roque ou Sultão.

    O aroma de vinho, ao meu sensorial, é forte, mas não é de qualquer estirpe de vinho fino, é de vinho de uva barata.

    Para mim, que não tenho grana para beber bons uísques e sempre fico na faixa de 150 reais pra baixo, foi o poir custo-benefício de uma garrafa: me pareceu um Passport incrementado com aroma artificial de vinho de boteco.

    1. HAHAHAHAHAHAHAHAHA! Cantina São Roque!

      É doce mesmo. Mas o dulçor vem mais da base, não da maturação. Whisky jovem em vinho

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *