Morning Glory Fizz – Da Continuidade

Foto: Tales Hidequi

A última matéria de 2018. Em menos de dois dias, teremos mais trezentos e sessenta e cinco outros para fazer novamente tudo que fizemos de errado nos anteriores. Mas não sem antes aproveitar as últimas horas do ano de uma forma alegremente inconsequente, e desastrosamente otimista. Algo que certamente lhe trará lembranças no dia seguinte. Lembranças, essas, reavivadas pela boca seca, enxaqueca e fotofobia. Feliz veisalgia nova, meu caro leitor.

Assim, talvez a melhor forma de se iniciar um novo ano não seja com falsas promessas. Mas sim reparando a igualmente épica e desastrosa última noite do ano anterior. E é aqui que entra o Morning Glory Fizz. Um café da manhã em forma de coquetel, que leva whisky, absinto (ou pastis), suco de limão, água com gás e, claro, uma clara de ovo, para dar sustento.

Se sua consciência não lhe permite beber um coquetel de café da manhã, ainda que você deseje, deixe-me ajudá-lo a dissipar essa hipocrisia. Durante o século XIX, essa era uma prática muito comum. Os coquetéis traziam mais disposição e vigor aos jovens pela manhã. Muitos drinks que hoje conhecemos nasceram deste hábito, como o Between the Sheets, Pick me Up e o Red Snapper.

Há, inclusive, uma razão científica por trás disso tudo. Como já explicado por aqui, a ressaca pode ser causada por ingestão excessiva de metanol, que vira formaldeído e ácido fórmico dentro de nós. O metanol está presente, em pequena quantidade, em quase todas as bebidas alcoólicas, por ser um produto derivado da fermentação. A melhor forma de expulsar rapidamente o metanol do corpo é – juro que não estou brincando – bebendo mais álcool. Com moderação, claro. A moderação que você não teve na noite anterior.

Que sede que dá!

E foi justamente para isso que o Morning Glory Fizz nasceu. Um remédio para a ressaca. Ele teria sido criado em meados de 1880. Sua primeira aparição foi no livro How to Mix Drinks, de 1884 de um certo Winter. Pouco depois, apareceu em outra publicação, cujo autor é desconhecido, chamada Scientific Barkeeping – o que, suspeito, tenha a ver com o fato do drink ser usado como remédio. Posteriormente, também em obras de Harry Johnson, e, mais recentemente, Dale DeGroff.

Este Cão, porém, descobriu a existência do coquetel apenas há alguns meses – ah, esse incrível e infinito mundo da coquetelaria – e de uma forma gloriosa. Pelas mãos do bartender Spencer Amereno Jr., durante uma degustação de coquetéis com Chivas Regal, organizada pelo Difford’s Guide. Na oportunidade, provamos também o Cameron’s Kick, Trilby #1 e uma interessantíssima leitura do Rob Roy, além de duas expressões recém-lançadas da marca – O Chivas XV e o Ultis. Aquela foi uma noite que merecia um Morning Glory Fizz pela manhã.

Como é de se esperar de um coquetel centenário, há algumas variações da receita do Morning Glory Fizz. A receita abaixo, porém, é uma reprodução daquela divulgada no Difford’s Guide. Com apenas uma diferença na produção. O absinto, ou pastis. A original pede que se bata o absinto junto com os demais ingredientes na coqueteleira. Para o gosto deste Cão, porém, essa alternativa tornará o absinto – ou pastis – forte demais. Algo que também poderá não agradar a maioria dos leitores, com paladar moderno. Assim, a sugestão é que o absinto seja utilizado apenas para untar o copo, e o excesso, descartado – como se faria com um Cocktail a La Louisiane ou Sazerac.

Assim, meus caros, munam-se de uma caneta e abram suas ainda intocadas agendas para este glorioso ano vindouro. E tomem nota. Um coquetel que talvez não seja capaz de apagar todos os seus erros passados. Mas que, certamente, tornará o momento presente muito mais agradável. Uma forma incrível de se iniciar um novo ano. O Morning Glory Fizz.

MORNING GLORY FIZZ

INGREDIENTES

  • 2 doses (60ml) de scotch whisky (Spencer usou Chivas Extra. Use um whisky mais seco, ou vínico. Um whisky muito doce tornará o coquetel desequilibrado, e demandará reduzir o açúcar)
  • 3/4 dose (22,5ml) de suco de limão siciliano
  • 1/2 dose (15ml) de xarope de açúcar
  • 1/2 dose (15ml) de clara de ovo pasteurizada
  • Absinto ou Pastis para untar a taça
  • Água com gás
  • gelo
  • parafernália de sempre para bater
  • copo highball

PREPARO

  1. Adicione um pouco de absinto ou pastis em um copo highball, e vá aos poucos untando suas bordas. Descarte o excesso. Ou beba, afinal, você nem almoçou ainda e já está fazendo um coquetel, deixe de ser hipócrita.
  2. Adicione, em uma coqueteleira, o whisky, o suco de limão, o xarope de açúcar e a clara de ovo. Sem gelo, por enquanto. Bata vigorosamente. Isso é um dry shake e melhorará a textura de seu coquetel. Leia mais sobre isso aqui.
  3. Abra a coqueteleira, adicione gelo e bata novamente. Desça o conteúdo para o copo higball.
  4. Complete com água com gás ou club soda.
  5. Beba e contemple. Um ano que começa com um Morning Glory Fizz tem tudo para ser glorioso.

Se tiver dúvidas sobre o preparo ou preferir algo mais gráfico, confira clicando aqui o vídeo do Clube do Barman, onde Rafael Mariachi, mixologista da Pernod-Ricard, ensina a preparar o drink.

 

 

 

4 thoughts on “Morning Glory Fizz – Da Continuidade

  1. Paladar moderno foi ótimo, mestre hahaha.
    Me chame de old school. Sabe que outro dia preparei um Vodka Sour e fiquei pensando sobre a clara de ovo. Tive a impressão que alguma avó deve ter tido essa ideia haha.
    Abraço!

    1. Poxa, total, casa da minha avó era cheia daquelas balinhas de anis!

      A clara de ovo dá uma bela sustância. E deixa o coquetel com uma aparencia mais bacana. É win-win

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