Lançamento da linha Royal Salute na Coréia do Sul

Sempre fui apaixonado por livros. Gosto de ler quase tudo, ainda que tenha lá meus autores favoritos. Prefiro prosa à poesia, e tenho certa tendência pela ficção. Mas também aprecio um poema ou alguma biografia, desde que escritos com esmero. Assistir um filme ruim, de vez em quando, até tudo bem. São apenas duas horas. Mas a vida é curta demais para subliteratura.

Meu interesse pela leitura despertou ainda como Cãozinho, quando ouvia contos de fadas contados pelo Cão pai. Como qualquer criança, me fascinavam as histórias fantásticas, em países distantes, eivados de mágica e populados por reis, rainhas, alquimistas e criaturas mágicas. Castelos e objetos insólitos complementavam a atmosfera cativante.

E ainda que sempre me colocasse no papel de algum personagem da história, imaginava que contos de fadas pertenciam ao mundo do faz-de-conta. Na atrocidade de nossa realidade, eles não passariam de um gênero literário. Mas, aparentemente, estava enganado. Como num átimo de magia, tive um de meus mais improváveis desejos concedidos. Quer dizer, ao menos para um apaixonado por whiskies, como este Cão.

É que fui convidado pela Pernod-Ricard para viajar até a Coréia do Sul – um país bem distante – para provar, antes de todo mundo, duas novas expressões do portfólio permanente de um whisky digno da realeza. Os Royal Salute. E, além disso, conhecer os alquimistas, digo, criadores daquele luxuosos e exclusivos blended scotch whiskies. E acompanhado. Raphael Vidigal, head of prestige brands da Pernod-Ricard Brasil, seria meu guia e parceiro na lendária viagem.

A jornada aérea inicial levou vinte e cinco horas até aquele distante reino, digo, país. E ao chegar lá, ainda que não houvessem carruagens, fomos recepcionados por um cordial motorista em um confortável sedan coreano. Que, aliás, exibia um curioso design reminiscente de uma espécie de quimera entre dois sedans alemães. E assim, sem dizer nada – mesmo porque a comunicação era impossível por barreiras linguísticas – fomos conduzidos até o luxuoso hotel, no coração de Seoul.

Passei um dia me aclimatando ao fuso horário de doze horas. Na manhã do dia seguinte, mal podia conter meu entusiasmo. Entrevistaria o alquimista por trás dos whiskies da Royal Salute – o master blender Sandy Hyslop. Além disso, teria a oportunidade de conversar com o mago responsável por enfeitiçar as pessoas com todo carisma daquelas criações: Mathieu Deslandes, diretor de marketing da Royal Salute. Exceto por meu nervosismo, não havia vilão. Os dois foram extremamente agradáveis e acessíveis.

Mathieu nos revelou alguns detalhes sobre a criação dos blends, seu posicionamento, estratégia e a razão pela qual haviam decidido diversificar o portfólio após tantos anos. Já Sandy foi técnico e descontraído, e nos contou detalhes da elaboração daquelas incríveis criações. Estas entrevistas serão oportunamente reproduzidas aqui, no Cão Engarrafado.

Tietando

E à noite, aconteceu o grande evento. Um jantar de gala, digo de reis e rainhas, no Museu de Arte de Seoul, que outrora fora um palácio. O evento também contou com discursos de Jean Christophe Coutures, CEO da Chivas Brothers e Sandy Hyslop. Como contos de fadas sempre abusam do número três – três porquinhos, três fadas madrinhas – seria apresentado a três whiskies. A tríade que agora compunha a linha permanente da Royal Salute: o Signature Blend, Malts Blend e Lost Blend.

Me acomodei confortavelmente em minha cadeira, numa posição central de uma enorme mesa de banquete. Atentei-me a Jean Christophe, que explicava a razão daquela maravilhosa noite. “Royal Salute se refere a celebração da realeza britânica (…). E como o mundo da realeza evoluiu, a Royal Salute deve também evoluir com ele. Por isso, criamos uma nova embalagem, desenhada por Kristjana Williams. O que tentamos fazer é trazer mais encantamento, mais criatividade e design à marca, mas ainda mantendo sua substância

O novo Royal Salute 21 Lost Blend, defumado e apimentado, de garrafa preta.

E continuou ” A história da embalagem faz referencia à Torre de Londres, que, há muito tempo teria sido usada como zoológico, onde todos os animais dados para os reis e rainhas ficavam. Mas a ilustração não é séria – ela tem um certo ar de criatividade descontraída, porque, na cultura britânica, deve-se mostrar substância mas, ao mesmo tempo, senso de humor”.

Naquele momento, levado pelas palavras de Jean Christophe, começava a perceber a quase excruciante atenção aos detalhes daquele jantar. Tudo naquela atmosfera absolutamente encantadora – luzes, flores, borboletas de verdade (sim, havia borboletas de verdade) pratos, músicas e aromas – haviam sido milimetricamente pensados para elevar aquela experiência. Nada era gratuito ou havia sido deixado ao acaso. Da marcação dos lugares à mesa, passando pelo gelo gravado, à música de fundo.

O novo Royal Salute 21 Malts Blend, frutado e adocicado, de garrafa esverdeada.

Na sequência do discurso de Jean Christophe, foi a vez de Sandy Hyslop explicar um pouco sobre as verdadeiras estrelas da noite – os whiskies da Royal Salute. De acordo com o alquimista, Royal Salute foi o único blended scotch continuamente disponível com vinte e um anos de idade desde sua criação, em 1953. E aquela seria a primeira vez na história que duas expressões eram adicionadas ao portfólio permanente da marca. Aquela, para ele, era uma responsabilidade tão grande quanto uma honra.

E assim começou a parte mais importante daquele imponente evento. A degustação. A primeira garrafa apresentada por Sandy possuía um ar bastante familiar. Era nosso conhecido Royal Salute 21 anos, que fora rebatizado de Royal Salute Signature Blend – um blended scotch delicado, floral, suave e deliciosamente fácil de ser bebido. Aquele, para Sandy, era o ponto de partida. Seguimos para as duas novas expressões da marca.

O Royal Salute Malts Blend seria o resultado da união de vinte e um maltes diferentes, todos com, no mínimo, vinte e um anos de maturação. Seu sabor, adocicado e frutado, seria mais intenso do que o tradicional Royal Salute, mas, ainda assim, extremamente suave e agradável, como todo blended whisky de ultra-luxo deve ser. Conforme Sandy, a base daquele whisky seria Strathisla e Longmorn, duas das mais queridas destilarias do portfólio da Pernod Ricard. Este, segundo Raphael, desembarcará em terras brasileiras em um futuro próximo.

Sandy, explicando sobre a criação dos Royal Salute.

O Royal Salute Lost Blend, por sua vez, traria inovação à linha Royal Salute. Um blended scotch whisky com perfil sensorial defumado, que leva em sua composição muitos maltes das conhecidas “silent stills” – destilarias desativadas ou demolidas. Como, por exemplo, Imperial e a incrível Caperdonich, que produzia single malts turfados. Apesar do sabor enfumaçado e delicadamente medicinal, o Lost Blend ainda manteve a personalidade delicada e luxuosa dos Royal Salute. E foi o preferido deste canídeo.

Após apresentar o novo trio, Sandy contou um pouco sobre a essência de sua função. “A maior parte do meu trabalho é garantir a continuidade dos blends da Royal Salute, tendo certeza que temos o estoque necessário para manter a qualidade, ano após ano (…). Muitas pessoas pensam que um blender somente trabalha no seu sample room, misturando whiskies e criando novas expressões. Isso até é verdade, mas é apenas uma pequena parte do que faço. Toda semana viajo para Speyside, para nossas destilarias, para provar o new make de cada uma delas. E vinte e um anos depois, meu trabalho começa novamente. Neste ponto, eu e meu time conhecemos cada um dos barris de Royal Salute antes de serem combinados para dar origem aos blends.” – explicou.

Discursos e explicações concluídos, os convidados puderam provar também alguns coquetéis criados com as novas expressões – alguns tão luxuosos quanto os próprios whiskies. Como, por exemplo um que levava a famosa rosa da rainha Elizabeth II – a Centifolia – mais cara até mesmo que ouro.

Blending the blends

Olhei para o relógio. Quase meia-noite. Se passasse daquele horário, não viraria abóbora nem nada disso. Mas era um horário prudente para voltar aos meus aposentos reais – o hotel – e descansar um pouco. Aquela fora, para um entusiasta de whiskies como este Cão, seguramente, uma noite memorável, coroada por três whiskies absolutamente incríveis.

Porém, na volta, um pensamento não deixava minha cabeça. Aquilo, na verdade, não era um conto de fadas. Não havia quimeras, nem reis ou rainhas. Não havia alquimistas ou reinos distantes. E, por fim – e acima de tudo – não havia qualquer feitiço.

Aquilo, na verdade, era o resultado do trabalho duro e incansável de pessoas extraordinárias e apaixonadas por aquilo que fazem. Dezenas de pessoas, cada uma com sua especialidade, seu conhecimento, que juntas criaram algo incrível. Pessoas que dedicaram suas vidas e empenharam um esforço épico para um jantar perfeito.

E para, acima de tudo, criar uma das mais reconhecidas marcas de scotch whisky de ultra-luxo do mundo. Os Royal Salute – para que pessoas comuns, como eu, pudessem ter momentos dignos de contos de fadas.


Arran The Bothy – Sobriedade

Tenho uma relação complicada com uma porção de coisas. Comida, automóveis, plástico bolha (afinal, sucumbo à tentação de estourá-los ou uso para proteger garrafas?). E antibióticos. Porque eu entendo a importância dos antibióticos – afinal, eles nos permitiram escolher entre a dor de estômago ou uma morte lenta, definhante e de dor excruciante. Mas eu detesto tomá-los.

E nem é porque dá gastrite, ou pela disciplina do horário. Mas porque tenho que parar de beber. Por. Dez. Dias. Toda vez que tomo antibiótico e me deparo com uma garrafa de whisky, me sinto como meus confrades quadrúpedes observando aquela televisão de cachorro na padaria. Impotentes, sofregamente observando o frango girar, mas incapazes de se desvencilhar daquela visão.

Com a diferença de que frango é ruim (fonte: Tripadvisor)

Foi justamente o que aconteceu com o The Bothy, recém-importado para o Brasil pela Single Malt Brasil. Recebi minha garrafa no segundo dia de antibióticos um tratamento de dez. Passei oito languidos dias olhando de soslaio a garrafa fechada sobre minha estante. Até que, depois de doze horas do último comprimido, numa bela quarta-feira, finalmente estava livre.

Desci o líquido na taça com antecipação. Era a primeira vez que provava o whisky. Seu aroma me atingiu quase instantaneamente. Tomei um minigole. Com graduação alcoólica generosa – 53,2% – pude sentir caramelo, baunilha e pimenta do reino, junto com uma sensação revigorante de que minha saúde finalmente voltara à sua melhor forma.

Resolvi pesquisar sobre o whisky. Li que a maturação do The Bothy acontece em dois estágios. Primeiro, em barricas de carvalho americano que contiveram bourbon whiskey por um prazo não divulgado. Depois, por dezoito meses em barris menores – conhecidos como quarter casks – também de carvalho americano. Segundo a destilaria, a utilização destas diminutas barricas é uma homenagem ao tempo em que, por questões logísticas, barris de menor volume eram usados para transportar e armazenar whisky na ilha de Arran.

Mas rapidamente me lembrei que há uma razão menos poética. A utilização de quarter casks acelera o processo de maturação. Ou melhor, eleva a influência da madeira no destilado muito mais rapidamente do que se fossem usados barris tradicionais. O resultado é um whisky com alta graduação alcoólica e ótimo equilíbrio entre a madeira e a personalidade de seu new-make-spirit.

Barricas na Arran

Observei a cor e oleosidade do whisky em minha taça. Como costumeiro da Arran, a coloração do The Bothy é totalmente natural – não há a utilização de corante caramelo – e não há filtragem a frio. Isso é importante. Caso fosse empregado este processo, os congêneres mais pesados se decantariam e seriam filtrados, reduzindo a oleosidade e personalidade do destilado recém saído dos alambiques. Abstendo-se de filtrar seu whisky a frio, a Arran acentua a influência de seu new-make no produto final.

Mais um minigole. Meu deus, como aquele whisky era bom. Talvez fosse por conta de meus dez dias de sobriedade. Ou, talvez, porque finalmente me sentisse livre. Não, acho que não. O The Bothy é realmente um whisky excelente. Por esse, eu tomaria mais dez dias de antibiótico.

ARRAN THE BOTHY

Tipo: Single Malt sem idade declarada (NAS)

Destilaria: Arran

Região: Higlands (Islands)

ABV: 53,2%

Notas de prova:

Aroma: frutado, torta limão, creme de baunilha.

Sabor: frutado, cítrico. Torta de limão, malte. Final longo, apimentado e maltado.

Com água: a água ressalta as notas frutadas.

Preço: aproximadamente R$ 396,00 (trezentos e noventa e seis reais) para pagamento via boleto na Single Malt Brasil.

Hot Toddy – Panacéia

Crianças ficam doentes. Isso é inexorável. É preciso criar memória imunológica. Colocar o sistema pra funcionar, ganhar resiliência. E elas são bem talentosas nisso. Vejo pelos meus dois cãezinhos – comer a batatinha que caiu no chão e o cachorro de verdade fuçou, lamber a mão depois de ter apoiado no chão imundo da escola e colocar a boca no corrimão do elevador são coisas triviais para eles. O que explica a frequência que ficam doentes. Especialmente resfriados.

Não adianta. Não é porque eles estão mal agasalhados, ou porque pegaram um golpe de ar de alguma janela aberta. Nem porque tomaram pouco suco de laranja. Isso não tem nada a ver com o resfriado. É porque eles são porcos mesmo. Porque eles tem zero apreço pela higiene pessoal.

Na idade deles, eu era assim também. Meus resfriados tinham frequência quase mensal. E para aliviar os sintomas – ou melhor, para me fazer ter saudades dos sintomas – minha mãe recomendava algo tão infalível quanto detestável – água quente, limão e sal. E quando um raio de bondade a atingia, com um pouquinho de mel. Acho que é por isso que gosto tanto de whiskey sour hoje em dia.

Uma panaceia parecida com esta é o Hot Toddy. O Hot Toddy é basicamente um quentão de whisky. O que, talvez, o faça um excelente substituto para a tradicional bebida servida nas festividades juninas. Há uma pletora de diferentes receitas. Porém, a mais tradicional leva água quente, suco de limão, açúcar mascavo (ou calda de açúcar, ou mel), cravo, e, claro, o whisky de sua preferência. Você pode, entretanto, testar com suas especiarias favoritas e adicionar ingredientes – será que um pouquinho de alcaçuz ou canela não ficam bons?

O poder curativo do Hot Toddy é conhecido há muito tempo. Inclusive, de acordo com matéria veiculada no Vinepair, a mistura era até ministrada em crianças no século dezenove. Um jornal daquela época recomendava que “se sua criança começar a fungar, ter olhos vermelhos ou perder um pouquinho da audição, se sua pele ficar seca e quente, e se o halito estiver febril – você agora terá a oportunidade de agir muito mais rapidamente do que antes (…) dê a ela drinques estimulantes e quentes, sendo o hot toddy o melhor deles

Não sei se o pediatra de meus cãezinhos aprovaria este tratamento. Em vista do avanço da ciência e de todo bom-senso adquirido pela humanidade ao longo deste mais de um século e meio, me parece um tratamento quiçá extremo. Extremo, ilegal e tão ao norte da linha do absurdo que talvez seja melhor ter o número do conselho tutelar no speed dial, só por precaução.

E eu detesto ser a voz da moderação – mas, mesmo para nós, adultos, a cura tem que vir de forma homeopática. Afinal, bebidas alcoólicas podem deixar nosso sistema imunológico, já debilitado, ainda mais frágil. Dito tudo isso, no entanto, um – e apenas um – hot toddy talvez não seja uma má ideia. A água quente ajuda a alivar a congestão nasal. E o álcool tem a capacidade de dilatar vasos sanguíneos, o que pode ajudar as membranas mucosas a combater a infecção.

A história do hot toddy – como de costume para coquetéis tão antigos – é incerta. Uma teoria diz que ele nasceu na India, no século quinze, quando os britânicos descobriram o taddy: uma bebida feita de seiva de palmeira fermentada. Com o tempo, o taddy virou toddy, e foi definido como uma bebida quente e alcoólica. A outra teoria postula que ele teria sido criado por um tal Robert Bentley Todd, médico irlandês, que recomendava que seus pacientes ficassem bêbados para curar seus males – algo que, assumo, faço mais frequentemente do que seria prudente.

Me curei de repente!

Assim, caros leitores, se estiverem com a garganta coçando, o nariz apertado e aquela sensação de moleza, sejam prevenidos. Preparem um belo Hot Toddy e, à moda de nossos ancestrais, sintam-se renovados. Quer dizer, ao menos enquanto estiverem bebendo.

HOT TODDY

INGREDIENTES

  • Água (quente, fervendo)
  • cravos (a gosto, mas não exagere. Quatro está bom)
  • Casca de limão siciliano
  • 1 colher de chá de Açúcar (este Cão adorou a versão com açúcar mascavo, mas teste com seu agente de dulçor favorito. Mel parece uma boa ideia). Se ficar azedo, aumente o açúcar. Isso dependerá também do whisky que será usado.
  • 7,5ml (1/4 dose) de Suco de limão siciliano
  • 60ml (2 doses) de Whisky – aqui, sinta-se absolutamente livre para escolher o whisky que mais gostar. Este Cão preparou com Chivas XV. Mas com Rye whiskey também fica excelente
  • Caneca
  • aparato para mexer

PREPARO

  1. Encha uma caneca com água fervente. Adicione o açúcar e mexa, para dissolver.
  2. Adicione a casca de limão siciliano e o cravo. Mexa um pouco, para acelerar a infusão. Alguns gostam de espetar o cravo na casca. Tenho minhas dúvidas sobre a estética da ideia, mas ela funciona para você não engasgar com um cravo
  3. Adicione o suco de limão e o whisky, e mexa novamente.
  4. Pronto, prepare-se para contemplar uma panaceia para o sistema respiratório.

Lançamento da nova linha Royal Salute – Na Coréia!

A era digital trouxe infinitas facilidades. E também algumas obsolências. Do telefone fixo, por exemplo. E do correio físico, para cartas. Aqui em casa, temos apenas um telefone fixo, que fica de castigo, instalado na área de serviço, e raramente toca. E quando o faz, nunca é coisa boa. Alguém oferecendo combo de internet, ou alguém pedindo doação. Atender o telefone aqui em casa é certeza de ser achacado.

O correio físico vai na mesma linha. Exceto por uma ou outra eventual encomenda, conferir o correio é certeza de desgosto. Multa de trânsito, mala direta de corretora e minha tão admirável quando desesperadora fatura mensal do cartão de crédito. Todas vêm pelo correio e sorrateiramente deslizam por baixo da porta para me acossar.

Mas, em raríssimos casos, recebo algo que compensa todas aquelas dezenas de pequenos amolações seladas. Como, por exemplo, na semana passada. Um pequeno envelope azul, mais ou menos gordinho e absolutamente despretensioso, não fosse um pequeno detalhe. Um brasão dourado em seu centro – Royal Salute.

#morri

Aquele brasão denunciava que aquela não era uma missiva comum. Abri o envelope com antecipação, para encontrar o que talvez fosse o mais incrível convite já recebido por este Cão. A oportunidade de provar alguns novos whiskies da Royal Salute – o que, per si, já seria excelente.

Mas não apenas isso. Provar alguns novos whiskies da Royal Salute na Coreia do Sul! Quatro dias de total imersão em uma das mais elegantes, exclusivas e desejadas marcas de scotch whisky do mundo. E com a oportunidade de conhecer grandes figuras por trás do emblemático blended scotch, como Sandy Hyslop e Barnabé Fillion – master blender e creative designer. Imaginem a trêmula empolgação deste Cão ao ler o convite.

Hyslop, lenda!

Nas palavras – traduzidas com nervosismo por este Cão – da marca de ultra-luxo “A Royal Salute está vibrante com a introdução de um novo visual para seu 21 Anos tradicional. É a transformação mais emocionante deste a criação da marca, em 1953, para celebrar a coroação da Rainha Elizabeth. Em comemoração pela ocasião, introduziremos também dois scotch whiskies novos excepcionais em nossa linha de vinte e um anos. O Malts Blend e o Lost Blend. Seja nosso convidado enquanto revelamos esta coleção extraordinária, digna da realeza moderna

Assim, meus queridos leitores, preparem-se. Durante a semana que vem, de segunda a sexta, Este Cão Engarrafado estará na Coreia do Sul para trazer a vocês, em primeira mão, novidades incríveis sobre a única marca de scotch whisky cuja expressão mais simples tem vinte e um anos de idade. A Royal Salute.

Fiquem ligados. E, se me permitem um conselho não relacionado, tirem o telefone fixo do gancho. Mas não ignorem a caixa de correio. A caixa de correio traz coisas extraordinárias.

Chivas Regal XV – Sofisticação despojada

Esses dias fui almoçar no shopping, e vi uma bolsa feminina de palha na vitrine de uma loja de grife. Olha, eu não presto muita atenção bolsas, mas aquela era uma bem bonita. Ela tinha um ar elegante, mas sem ser pretensioso. Pensei em comprar para a Cã, de aniversário de casamento. Fazia um bom tempo que não dava um presente para ela. Entrei na loja em passos largos, me sentindo resoluto. A Cã iria amar a surpresa.

Passei uns minutos observando a bolsa, braços pra trás, simulando interesse pela peça e aguardando que alguém me atendesse. Uma vendedora, notando minha encenação, se aproximou. Gostou da bolsa? Sim, queria dar pra minha esposa. A vendedora então tirou a bolsa da vitrine e a apoiou num mostruário. Passando a mão delicadamente por sua lateral – da bolsa – disse. Olha só, a palha é tratada com um produto especial para ser durável. E o design é italiano. É um design despojado, mas elegante, perfeito pra levar pra praia. Seja pra Pipa ou pra Mikonos.

Nossa, realmente, é muito bonita, muito especial – retruquei, tentando chegar logo à parte do preço. A vendedora então puxou, com o cuidado de quem desarmava uma bomba, o fiozinho da etiqueta de preço de dentro. E está em promoção. Três mil reais. Silêncio dramático se seguiu. Pensei em perguntar se a palha tinha sido retirada da estrebaria onde a Virgem Maria teria parido o Menino Jesus, mas me controlei. Agradeci e disse que ia pensar mais um pouco – de uma forma quase tão despojada e elegante quanto a própria bolsa.

Deux me livre.

E aí fiquei pensando. Eu entendo que menos é mais, e que às vezes o preço de justifica pelo desenvolvimento, ou pelo design. Mas aquilo ainda era uma bolsa de palha. Somente palha, despretensiosamente entrelaçada para gerar algo extremamente elegante. Não era como, por exemplo, o recente lançamento de uma das mais famosas marcas de blended whisky do mundo. O Chivas Regal XV.

É que o Chivas XV também possui o mesmo despojamento elegante, mas sem custar o mesmo que a bolsa aparentemente feita da palha do duende do Rumpelstichen. Desafetação esta, aliás, bem alardeada pela Chivas. De acordo com a marca, o Chivas XV é “um blend de 15 anos que desafia as convenções de como e quando beber scotch whisky. Criado para ser aproveitado como parte de um momento de celebração de muita energia, o Chivas XV prova que um whisky sério não precisa de um ambiente sério para ser tomado“.

E quando a Chivas Regal diz que é um whisky sério, bem, ela fala com austeridade. A começar pela sua produção. O blend leva em seu coração maltes como Strathisla, Longmorn e Aberlour, e passa por um incomum processo de finalização em em barricas de carvalho europeu que antes contiveram cognac da região da Grande Champagne. Algo raro para single malts, mas ainda mais inusual para blended whiskies. Isso agrega complexidade sensorial ao whisky, trazendo notas vínicas, de caramelo e frutas vermelhas.

Mas nem tudo é sisudez. A própria Chivas encoraja os consumidores a beberem o Chivas XV da forma que quiserem. Inclusive, utilizando-o como ingrediente em coquetéis. “A combinação proporciona o perfil sensorial perfeito para uma ampla variedade de formas de consumo contemporâneas, encorajando os fãs de whisky de aproveitarem seu destilado favorito de uma forma completamente nova – de shots de Chivas XV a coquetéis criados para enfatizar a qualidade e sabor pungente do whisky durante celebrações (…)“, escreve a marca.

Shot, shot, shot!

Mas vamos falar sério. O Chivas XV é um lançamento importantíssimo para a Chivas Regal. Não apenas por ser uma legítima tentativa de rejuvenescer a marca, ou por estampar orgulhosamente sua idade no rótulo quando a tendência mundial é de lançar whiskies sem idade declarada. Mas também por preencher a lacuna de preço que existia entre o Chivas Extra e o maravilhoso Chivas 18 anos.

Sensorialmente, o Chivas XV é delicado e frutado, com álcool discreto e bem integrado. É um blend mais bem acabado e menos agressivo que o Chivas Extra – que, na opinião deste Cão, já é bem interessante. Em comparação com o 18 anos, o Chivas XV é mais frutado e intenso, enquanto o Chivas 18 é mais delicado e sisudo. Em resumo, é um whisky muito bom, e um meio termo interessante entre a irreverência do Extra e a seriedade do Chivas Regal 18.

No Brasil, o Chivas Regal XV foi lançado em meados de junho. E se me permite um conselho – experimente, e experimente rápido. Talvez ele seja apenas cevada maltada, fermentada, destilada, misturada e maturada em barricas. Barricas muito especiais. Barricas capazes de torná-lo muito mais do que apenas cevada maltada e processada. Tipo uma certa bolsa de palha. Pensando bem, não. Aquilo é só uma bolsa de palha. Este, porém, é um belíssimo whisky.

Esse eu entendo.

CHIVAS REGAL XV

Tipo: Blended Whisky com idade definida – 15 anos

Marca: Chivas Regal

Região: N/A

ABV: 40%

Notas de prova:

Aroma: frutado, com frutas em calda e caramelo

Sabor: Delicado, balinha de caramelo, pêssegos em calda, frutas adocicadas. Final médio e com baunilha.

Com água: A água ressalta o frutado, mas torna ele ainda mais delicado.

Disponibilidade: à venda em lojas selecionadas e na Caledonia Store.

Chivas Regal 18 French Oak Finish

Minha relação com a tradicional culinária italiana é uma de amor e, bem, indiferença. Amo tudo que leva frutos do mar e sou apaixonado por risotos. Porém, não ligo muito para pizza. É eu sei, é estranho, porque pizza é tipo Nutella, que, diga-se de passagem, é outra coisa tradicionalmente italiana que eu não tenho o menor carinho.

E quando o assunto são as massas, fico no meio do caminho. Sou indiferente à lasanha. Não gosto muito de molho alfredo e nem quatro queijos. Naturalmente, adoro um marinara e sou alucinado por carbonara. De verdade. E ainda que eu prefira a versão sem creme de leite, não tenho qualquer pós-conceito em relação àquela que leva o ingrediente. Carbonara, para mim, é a perfeição materializada em carboidratos e lipídios.

Com essa gema, então, é quase pornografia.

Por muito tempo, imaginei que o carbonara fosse irretocável. Até que, certa vez, provei uma versão trufada do prato. E aí, meus conceitos de perfeição foram atualizados. Não que eu tenha deixado de gostar do prato original, ou que meu apreço tenha diminuído. Mas senti que havia me apaixonado novamente, como da primeira vez, por aquela maravilha culinária.

O mesmo aconteceu comigo recentemente com o Chivas Regal 18 French Oak Finish, versão exclusiva de Duty-Free do tradicional e maravilhoso Chivas Regal 18. Aliás – não é segredo para ninguém que o Chivas 18 tradicional é um de meus blended whiskies favoritos. Sou apaixonado pelo blend. E me vi redescobrindo esta paixão de uma forma diferente ao provar o Chivas 18 French Oak Finish

De acordo com a marca, o Chivas Regal 18 French Oak Finish “(…) é um blend único, variação do icônico Chivas 18 anos, com suas 85 notas sensoriais diferentes, que é caraterizado por uma finalização muito especial em barris de carvalho francês de primeiro uso.

Ele traz singularidade de barricas produzidas a mão por um time de tanoeiros experientes. Estes barris usam carvalho francês de mais de 150 anos de idade, da região de Limousin, usados para maturar destilados da mais alta qualidade. O time de blenders da Chivas Regal selecionou cuidadosamente somente os melhores destas barricas para finalizar o Chivas Regal 18 anos, e revelar algumas de suas melhores notas características.”

Além da finalização, porém, há outra diferença bastante relevante entre o Chivas 18 French Oak Finish e o padrão. A graduação alcoólica. O Chivas 18 tradicional possui 40%. O French Oak, porém, apresenta um percentual bem mais generoso – 48%. Aí está, na opinião deste Cão, a grande diferença – a finalização traz sim maior pungência de especiarias e frutas. Mas a graduação alcoólica mais alta é o que o torna especial – Ela traz uma intensidade que, talvez, para os paladares mais críticos, faltaria no Chivas 18 de linha.

Ai, é muito delicado pro meu paladar….

O Chivas 18 French Oak faz parte de uma série de lançamentos da marca escocesa exclusivos para Duty Free, que apresentam diferentes finalizações – a chamada coleção “First Fill” – em alusão ao primeiro uso do barril para finalização de um blend, algo bem incomum no mundo do whisky. Além dele, há um American Oak Finish, além de um recém lançado Japanese Oak Finish, finalizado nas concorridas barricas de carvalho japonês, o mizunara.

Se você gosta do Chivas 18 tradicional, e procura um whisky com o mesmo tema mas com mais intensidade, o Chivas 18 French Oak é para você. Aliás, ele é para você mesmo que você tenha reservas com o Chivas 18 tradicional. Ou com Nutella, pizza ou molho branco. O Chivas Regal 18 French Oak Finish é seu prato preferido, com o melhor tempero do mundo.

CHIVAS REGAL 18 FRENCH OAK FINISH (FIRST FILL)

Tipo: Blended Whisky com idade definida – 18 anos

Marca: Chivas Regal

Região: N/A

ABV: 48%

Notas de prova:

Aroma: aroma claramente floral, com baunilha e especiarias.

Sabor: delicado, com frutas em calda, chocolate, e frutas em calda. O final é mais pronunciado e frutado do que do tradicional Chivas Regal 18.

Com água: A agua torna o whisky menos adocicado.

Disponibilidade: Duty Frees de Aeroportos Internacionais

Whiskies para comprar no Duty Free – Julho 2019

Este é um post sazonal, que já teve cinco edições. Depois, leia a primeirasegundaterceiraquarta e quinta aqui, se quiser.

Meu pai uma vez me disse “o espírito pode ser aventureiro, mas o intestino é sempre gregário.” Fora de contexto, tinha apenas uma rasa ideia do que ele queria dizer. Mas, depois de um voo de dez horas para os Estados Unidos, nada confortavelmente encaixado no assento do meio da fileira do meio, pude contemplar, com toda plenitude, a sabedoria emanada por meu progenitor.

Escolher seu assento com base em seu acesso ao banheiro de uma aeronave é quase um teste de personalidade. Há dois tipos de pessoas. Aquelas desinibidas, que se sentam no meio e que não ligam de pedir licença às sonolentas para se aliviar. E aquelas que preferem as pontas e o acesso livre aos lavatórios – e que não tem qualquer apego às suas rótulas ou horas de sono.

Na verdade, há outro tipo. Eu. Que mal consegue dormir e que é tímido demais para acordar alguém somente para atender àquele proverbial chamado da natureza. Prefiro aguentar sentado, com sono e apertado, do que percorrer todo o processo até chegar ao banheiro do avião somente para descobrir que meus confrades viajantes não tem muitos hábitos higiênicos.

Inveja da coragem dessas pessoas (fonte: passangershaming.com)

Assim, sempre que chego ao meu destino, seja ele qual for, me vejo em um enorme dilema. Ir ao banheiro ou ao Duty Free. É uma batalha acirrada, entre a natureza e o entusiasmo. Afinal, o Duty Free possui whiskies exclusivos, muitas vezes raros e excelentes. E escolher entre eles leva tempo – tempo este difícil de negociar com meu sistema digestivo.

Então, pensando no bem estar intestinal de todos aqueles meus leitores que passam o mesmo perrengue que eu, preparei uma lista. Uma lista com as melhores compras de Duty-Free desta temporada. Assim, você economizará preciosos momentos que poderão ser usados para fazer coisa melhor.

Sinto-me na obrigação, entretanto, de fazer uma ressalva. Os whiskies aqui apresentados exigiram alguma dedicação para que fossem reunidos e provados. O duty-free brasileiro não cooperou: apesar de apresentar disponibilidade de certos rótulos no site, a informação não condizia com a realidade. Foi preciso recorrer a familiares e amigos, que viajaram em diferentes datas, e um certo grau de sorte, para consegui-los (em Guarulhos, o Terminal 3 possuía apenas o Chita e Glenlivet. Na outra, apenas o The Macallan. O Terminal 2 carregava o Port Charlotte e o Chivas.)

CHIVAS REGAL 18 ANOS FRENCH OAK FINISH

O que pode ser melhor do que um dos melhores blended whiskies ultra-premium do mercado? Bem, o mesmo blend, mas com graduação alcoólica superior (48%), e finalização em barricas de carvalho europeu. É justamente isto que o Chivas 18 French Oak Finish é.

De acordo com a marca “(…) é um blend único, variação do iconico Chivas 18 anos, com suas 85 notas sensoriais diferentes, que é caraterizado por uma finalização muito especial em barris de carvalho francês de primeiro uso.

Ele traz singularidade de barricas produzidas a mão por um time de tanoeiros experientes. Estes barris usam carvalho francês de mais de 150 anos de idade, da região de Limousin, usados para maturar destilados da mais alta qualidade. O time de blenders da Chivas Regal selecionou cuidadosamente somente os melhores destas barricas para finalizar o Chivas Regal 18 anos, e revelar algumas de suas melhores notas características.”

O preço desta perfeição melhorada? US$ 122,00 (cento e vinte e dois dólares).

THE GLENLIVET MASTER DISTILLER’S RESERVE SMALL BATCH

O Glenlivet Master Distiller’s Reserve Small Batch é o mais sofisticado dos maltes da linha Master Distiller’s Reserve da The Glenlivet, vendida exlcusivamente no travel retail. Além dele, há a versão de entrada, o Master Distiller’s Reserve original, e uma versão intermediária, que parte da maturação ocorre numa solera vat – um enorme tanque de madeira, que nunca é totalmente esvaziado.

A maturação do Glenlivet Master Distiller’s Reserve Small Batch acontece em barricas de carvalho americano de ex-bourbon, carvalho europeu de ex-jerez e – pausa dramática para algo bem inusual – barricas de carvalho virgens. O tipo de carvalho destas últimas não é divulgado, porém, este Cão suspeita que seja europeu. É um single malt sofisticado, mas ao mesmo tempo sensorialmente acessível e adaptável para qualquer situação. E um belíssimo presente – por US$ 150,00 (cento e cinquenta dólares) – se encontrar.

MACALLAN CONCEPT ART 1

Não fosse o whisky tão bom e a embalagem tão bonita, poderia, talvez, dizer que este lançamento da The Macallan está no limite da pretensão.

O Macallan Concept é o primeiro de uma série de whiskies que “combinam a paixão por produzir whisky com a paixão dos visionários – indivíduos confiantes, sofisticados que desafiaram o status quo com perspectivas e ideias inovadoras.” De acordo com a destilaria, o whisky foi inspirado no surrealismo visto por meio das lentes dos seis pilares da The Macallan. O resultado seria um produto que “vai além das fronteiras tradicionais dos processos de seleção de barricas

Surreal, na opinião deste canídeo, é esse papo da The Macallan. Mesmo porque o Concept é maturado em barris de primeiro uso de carvalho europeu de ex-jerez e carvalho americano de ex-bourbon, algo bem comum no mundo dos maltes. Na verdade, ele passou do limite da pretensão. Mas a gente perdoa, porque, como eu disse, o whisky é bom demais, e a garrafa é linda, então até a gente se sente um pouquinho pretensioso bebendo ele. Um brinde!

O preço da obra de arte líquida é US$ 110,00 (cento e dez dólares)

PORT CHARLOTTE CC:01

Defumado, cask strength com 57,8% de graduação alcoolica, finalizado em barris de conhaque. Precisa falar mais alguma coisa? Bem, a Bruichaddich, que produz o whisky, acha que sim.

Como com todo Port Charlotte, o ponto de partida é um destilado elegante e intrigante. Cevada de procedência excepcional, defumada e fortemente turfada é combinada com nossa destilação vagarosa, gota-a-gota, entregando força com elegância. Aqui, este fascinante destilado foi maturado inteiramente em barricas do melhor carvalho francês (quercus robur). Estas barricas previamente continham algumas das melhores Eau de Vie da região oeste de de Cognac.

Obrigado, Bruichladdich, mas eu já estava convencido no primeiro parágrafo. O preço, entretanto, é tão salgado e enfumaçado quanto o whisky US$ 161,00 (cento e sessenta e um dólares)

SUNTORY THE CHITA

Este é um whisky duplamente interessante. Primeiro, por ser japonês. Pela simples razão de sua nacionalidade, o Chita, produzido pela Suntory, já merece atenção. Afinal, nos últimos anos, uma horda ensandecida de entusiastas sublimou os whiskies japoneses das prateleiras das lojas. Além disso, o The Chita é um single grain whisky – algo bem incomum mesmo para padrões escoceses.

De acordo com a marca “(…) a destilaria Chita está situada no litoral calmo e enevoado da peninsula de Chita. Por meio de um processo raro de destilação contínua utilizando dois, tres ou quatro colunas, a destilaria utiliza principalmente milho para produzir três tipos diferentes de grain whisky – delicado, médio e pesado

O preço é tão amigável quanto o whisky – aproximadamente US$ 60,00 (sessenta dólares), sujeito a disponibilidade.

The Macallan Concept No. 1

O mundo do whisky é bem pretensioso. Afinal, há poucas coisas mais pedantes do que dizer que certo líquido possui aromas que evocam memórias bucólicas de campos salpicados de urze. Mas há algo que consegue ultrapassar facilmente a prepotência do whisky. As artes plásticas. Especialmente a arte moderna e contemporânea.

É natural, na verdade. A maior parte da arte não é verbal – exceto por alguma videoarte, da qual nutro uma relação que pendula entre o desprezo e a ignorância. E, por conta disto, traduzir o significado de um signo não-verbal para o mundo enunciado, muitas vezes, é um exercício extenuante. Extenuante e presunçoso. De todos os lados. Dizer que entende o conflito psicológico de Pollock ao contemplar sua obra é tão pretensioso quanto dizer que seu filho faria um quadro igual. Não há rota de emergência – a arte é pretensiosa.

E nessa pedante escala de pretensão – talvez em um dos mais pretensiosos posts deste soberbo blog – há um Megazord da afetação – um whisky que se inspira no mundo da arte. O Macallan Concept No. 1 – Art. Se você não acredita em mim, deixe-me traduzir, com frugalidade, o que está transcrito no verso do estojo que acompanha a garrafa.

Pois é, Danny

O primeiro da série, o Macallan Concept No. 1 foi inspirado no mundo da arte surrealista. Imaginado através das lentes dos Seis Pilares da The Macallan, nossa interpretação do surreal junta a imaginação e o idealismo para criar um mundo de whisky fantástico, sensorial, onde qualquer e tudo é possível. O The Macallan Concept No. 1 é um manifesto de nossa continua busca por excelência – uma que atravessa as barreiras tradicionais de produção e seleção de barricas para maturação

E continua “criado a partir de whiskies maturados primeiro em barricas de ex-jerez e, depois, por tempo igual, em barris de ex-bourbon, o Concept No.1 é um whisky criado para a explorar a maturação de forma mais imginativa. Trazendo características notas de frutas cítricas e gengibre, é um destilado que combina uma paixão inabalável pelo whisky com uma maestria infalível, incentivada por escolhas sofisticadas e destmidas

Surreal, na opinião deste canídeo, é esse papo da The Macallan. Porque, afinal, não há nada de muito inovador no processo de maturação do Concept No. 1. Ela acontece em barris de primeiro uso de carvalho europeu de ex-jerez e carvalho americano de ex-bourbon, algo bem tradicional no mundo dos maltes. As diferenças – conjunturais, na opinião deste cão – é a inversão da ordem (normalmente, a maturação em ex-bourbon ocorre antes) e o emprego de uma técnica que poderia ser considerada uma finalização pela The Macallan, talvez pela primeira vez.

Eu desisto.

Mas há algo a ser considerado. É que apesar de toda pretensão – e como acontece com muitas obras de arte – o The Macallan Concept No. 1 é bem bom. É um whisky equilibrado e oleoso, que traz o dulçor e caramelo do bourbon bem balanceados com o vínico apimentado do carvalho europeu de ex-jerez. Há, talvez, uma certa juventude lá. Mas ela está bem escondida – quase um quadro sobre um quadro.

E, por conta disso, por ser tão bom, a gente nem acha o The Macallan Concept No. 1 tão pretensioso assim. Sua garrafa e estojo – de um verde piscina bem bonito – contribuem para essa impressão. No final das contas, o Macallan Concept No. 1 é como certa obra de um grande artista. Até pode ter ultrapassado o limite da pretensão. Mas é tão bom, mas tão bom, que a gente até se sente um pouquinho pretensioso bebendo ele.

THE MACALLAN CONCEPT NO. 1

Tipo: Single Malt sem idade definida

Destilaria: Macallan

Região: Speyside

ABV: 40%

Notas de prova:

Aroma: caramelo, baunilha. Há um claro aroma vínico, que lembra vinho fortificado. Equilibrado e agradável

Sabor: Caramelo, baunilha e mel, que, aos poucos, revela especiarias, pimenta do reino e taninos. Finalização longa e vínica.

Disponibilidade: lojas internacionais e Duty Free

Arran Lochranza Reserve – Cliché

Clichê. Um vício de linguagem. Uma expressão que, de tão usada, se esvaziou. Tornou-se comum, corriqueira, banal. Normalmente, fujo dela como o diabo foge da cruz ao escrever as matérias deste blog. Mas, dessa vez, vou deixar a caneta correr solta.

É que Woody Allen disse que, às vezes, a melhor forma de explicar algo é por meio de um cliché. E é justamente isso que farei hoje. Porque tem muita água que passarinho não bebe bem cliché por aí. Esses, ordinários mesmo, com aquele sabor meio genérico. Caramelo, baunilha, malte.

Agora, quase tão difícil quanto desviar do lugar comum, é chutar o balde e abraçá-lo. Mas agarrar com unhas e dentes, matar a cobra e mostrar o pau – claro, o mesmo usado para tirar a vida do proverbial réptil, e não outra coisa que você pode ter pensado. Enfim, fazer nas coxas é fácil. Difícil é fazer bem feito, e de olhos fechados.

E é justamente isso que o Arran Lochranza Reserve, expressão que acaba de desembarcar no Brasil é. Um cliché. Mas um cliché extremamente bem feito. Desses, que dá vontade de entornar o caneco. Seja para beber andando nas nuvens, ou com atenção, é um whisky simples, mas simplesmente excelente.

Seu nome é uma homenagem à vila localizada na ilha de Arran, que possui a impressionante população de, aproximadamente, duzentas pessoas. Como você pode ter previsto, é lá que se localiza a destilaria que produz o single malt tema desta prova. No vilarejo há também um conhecido castelo do século dezesseis – homônimo da vila.

Lochranza Castle (fonte: aboutbritain.com)

O Arran Lochranza Reserve anos é a expressão de entrada da Arran, uma das mais jovens destilarias da Escócia – fundada em 1993 e com produção iniciada em 1995. Apesar da pouca idade, porém, ela descascou o abacaxi, e hoje possui um portfólio bastante extenso de whiskies. Há expressões com perfis de sabor bem diferentes. Do defumado Machrie Moor ao vínico Arran 18, passando pelo insano cask strength The Bothy, a Arran provou que sabe fazer whisky com uma mão nas costas – uma verdadeira destilaria polivalente.

Em relação à maturação, a Arran não comeu cru nem quente. O Arran Lochranza Reserve envelhece predominantemente em barricas de carvalho americano que antes contiveram bourbon whiskey. Depois, é brevemente finalizado em barricas de carvalho europeu de ex-jerez. Isso lhe traz um sabor frutado, com caramelo e baunilha, que combina perfeitamente com o caráter maltado de seu new-make spirit. E apesar da pouca idade, o whisky tem o álcool muito bem resolvido, com a madeira relativamente presente.

Barris na Arran

E se você é daquele tipo de entusiasta, saiba que Arran Lochranza Reserve coloca as cartas na mesa. Não é filtrado a frio – o que evita que certos compostos responsáveis por sabores sejam retirados do whisky – e não há a adição de corante caramelo, para padronização de cor. Realmente, com a Arran, não tem conversa fiada.

No Brasil, uma garrafa do Lochranza Reserve custa algo próximo de R$ 210,00 na Single Malt Brasil, sua importadora oficial. Por este preço, é um negócio da China. Quero dizer, da Escócia. Então, meu caro leitor sem encher mais linguiça, te aconselho a não marcar touca ou dormir no ponto. Corra ou – perdão pelo décimo nono clichê deste texto – você pode ficar a ver navios.

ARRAN LOCHRANZA RESERVE

Tipo: Single Malt sem idade declarada (NAS)

Destilaria: Arran

Região: Higlands (Islands)

ABV: 43%

Notas de prova:

Aroma: frutado, com compota de fruta, limão siciliano.

Sabor: frutado e salgado. Final levemente cítrico, com baunilha e malte.

Com água: a água ressalta as notas frutadas.

Preço: aproximadamente R$ 210 (duzentos e dez reais), à venda na Single Malt Brasil.

Elijah Craig Small Batch – Drops

A História está eivada de mitos. De imprecisões, versões, suposições. E a história do bourbon whiskey não foge à regra. Frequentemente relacionada àquela era do oeste selvagem e dos heróicos cowboys que enfrentavam animais selvagens e indígenas hostis, o whiskey americano evoca tradição, personalidade e destemor.

No entanto, a história real está bem longe do mito. E nem mesmo um homem de Deus – reverenciado por ser alegadamente o criador do bourbon whiskey – é exceção. Diz-se que Elijah Craig, um pastor batista, educador e exímio capitalista, fora o primeiro a destilar mosto de milho e armazená-lo em barris tostados, na Virgínia, numa região que mais tarde se tornaria o Kentucky.

Reverendo

Muitos historiadores americanos, porém, discordam. Elijah teria primeiro produzido um embrião de bourbon em 1789. Mas haveria registros de destilação naquela região desde meados do século XVIII. A lenda de Elijah, porém, se tornou mais conhecida e prevaleceu, na cultura popular, sobre qualquer verdade. Provavelmente por conta da notoriedade do reverendo Craig.

Mas, também, em grande parte, isto se deu por conta de um bourbon whiskey produzido pela destilaria Heaven Hill, do Kentucky. O Elijah Craig 12 Years Bourbon, e sua expressão mais jovem, o Elijah Craig Small Batch – que este Cão teve a oportunidade de provar em um evento com Fabio Lobosco no Cateto Pinheiros. E que, como sugere o título, é o tema deste drops.

Da de acordo com a Heaven Hill – produtora do Elijah Craig Small Batch – a história do bourbon foi um acidente. O pastor Elijah produzia moonshine na sua fazenda e armazenava em barris estanques, sem qualquer tratamento. Até que, certo dia, aconteceu um incêndio, e parte de seus barris foram convenientemente tostados.

Mas, para a surpresa geral até das leis da física, continuaram capazes de guardar o precioso líquido destilado e – graças à torra – transferir sabor para a bebida. Como a coisa toda não explodiu em uma enorme bola de fogo, não me pergunte. A história tem seus mistérios.

Aliens!

Ainda segundo a Heaven Hill, o Elijah Craig Small Batch é feito em lotes de 200 barricas ou menos. Ele é uma espécie de demonstração de força da destilaria. Mesmo conhecida por fazer whiskeys menos sofisticados, a Heaven Hill provou ao mercado que conseguiria, também, criar um produto premium.

A mashbill do Elijah Craig Small Batch é de 75% milho, 13% centeio e 12% cevada maltada. Sensorialmente, o whiskey traz nozes, frutas e um adocicado de laranja com baunilha, bem interessante. O álcool é bem integrado e o final longo e adocicado.

Infelizmente, não há importação do Elijah Craig para o Brasil. Porém, há outros produtos da destilaria em nosso país, como o famoso Evan Williams. E talvez, com um pouquinho de sorte, um pouquinho de fé e algumas preces – algo também utilizado pelo reverando Elijah – este incrível bourbon desça em nossas terras.

ELIJAH CRAIG SMALL BATCH BOURBON

Tipo: Bourbon whiskey

Destilaria: Heaven Hill

Região: N/A

ABV: 47%

Notas de prova:

Aroma: caramelo, açúcar mascavo, pimenta, baunilha. Um pouco de couro, talvez?

Sabor: baunilha, açúcar mascavo. Calda de açúcar queimada. Final longo, com especiarias e baunilha

Disponibilidade: Lojas internacionais